21 de jul. de 2005

"DESABAFO"

Dirceu: "Vamos ter muita luta pela frente, mas eu sei lutar"

O colunista Jorge Bastos Moreno no Globo Online, citando como fonte um amigo do deputado José Dirceu (PT/SP), diz que, "para quem está há 40 dias no centro de uma crise política dessas dimensões, o homem está inteiro. E seguro."

O colunista reproduz um "relato do que o deputado anda pensando", a partir do que enotou "no meu caderninho". Comenta, a título de introdução, que o ministro-chefe da Casa Civil não faz "um desabafo amargurado, raivoso ou deprimido". Longe disso, Dirceu "estaria surpreendentemente de bom humor, com disposição para a luta". E cita: "Vamos ter muita luta pela frente. Mas eu sei lutar. Quando se tem o bom propósito na cabeça, a força não nos abandona."

Veja o texto reproduzido do blog, com a ressalva, feita por Bastos Moreno, de que "não são as palavras de José Dirceu mas as palavras atribuídas a José Dirceu por um desses amigos que estiveram com ele".

“Por que o Lula me tirou do governo? É uma pergunta que eu me faço cada vez mais. Não há rigorosamente nada contra mim. Nada. Agora, eu tenho até um atestado de idoneidade, depois do depoimento do Cachoeira na CPI dos Bingos. Eu já tinha esclarecido tudo àquela época. Na CPI estadual também fiquei limpo. Não devo nada.

Eu não tenho medo de nenhuma das investigações em curso, estou com a consciência mais do que tranquila. Eu não tenho medo de ir a CPI alguma, mas não vejo sentido em ser convocado pela CPI dos Correios. O que eu tenho a ver com aquela investigação? O meu nome não foi citado uma única vez, por quem quer que seja. Todos os nomes citados pelo funcionário dos Correios que recebe propina são do PTB. Roberto Jefferson me cita para dizer que eu é que mandei fazer aquela investigação. Ora, não vem ao caso se isso é verdade ou não, mas se eu teria mandado investigar, como posso estar envolvido na corrupção?

Os nomes citados na CPI dos Correios são outros. Não fui citado até agora por nenhum depoente. Por que ir lá?

A CPI do Mensalão é outra coisa. Vou ao Conselho de Ética. Não vejo problema nisso. Sou deputado, tenho o maior apreço pela Casa, como não poderia deixar de ser. Vou lá, tenho obrigação de ir e darei todas as explicações.

Vou dizer o óbvio: não tem mensalão algum, nunca teve e tenho certeza de que nunca haverá. Um esquema corrupto desse seria inadministrável! Isso é loucura, fantasia pura.

As oposições viram nessas denúncias uma oportunidade de carimbar o governo do presidente Lula. Mas para derrotá-lo vão ter que vencer nas urnas. Não tem essa conversa de tirá-lo do poder antes.Se tentarem fazer isso, vão incendiar o país, eles sabem disso, e eu vou estar na linha de frente para impedir isso. Se tentarem fazer isso, se o PSDB tentar, fiquem certos de que eles vão passar dez anos sem voltar ao governo, porque esse país vai ficar um furacão. A democracia levou tempo demais para se consolidar e não vai ser qualquer luta política que vai pôr fim a ela!

O PT tem de se explicar. Eu tenho falado isso para todos os companheiros. Se eu estivesse no comando do PT, se o Tarso Genro estivesse no comando do PT, essa loucura não tinha acontecido. Jamais teríamos dado tanta autonomia assim, para empréstimos tão altos. Nunca. Mas eu não podia mais me ocupar do PT e, institucionalmente, nem podia, porque estava no governo. Me afastei totalmente do partido.

Tão falando em Operação Uruguai, mas não é nada disso. Os empréstimos, eu soube agora, existem, estão registrados no Banco Central. A Operação Uruguai foi forjada. Como é que se forjam contratos de empréstimos no sistema bancário oficial, monitorado pelo Banco Central? Isso é balela, e tudo vai ficar esclarecido. Podem dizer que os empréstimos foram uma loucura, mas eles existiram, oficialmente. Isso de Operação Uruguai é besteira, vai tudo ficar claro.

Genoíno, coitado, está sofrendo muito, ele nem tem saúde para aguentar o tranco. Temos de dar suporte a ele nessa hora. Ele de fato não se envolveu nisso. O estilo dele é fazer política e não se envolver nessas questões. Foi omisso. Isso eu digo, com pena, mas digo: foi omisso, uma loucura.

Agora, não adianta chorar. Eu tenho falado para os companheiros. Quem pegou dinheiro para campanha tem de assumir. Não adianta negar, porque mais tempo menos tempo isso virá à tona e não adianta mentir. O pior é parecer que foi mensalão ou dinheiro de corrupção. Não foi. Os deputados do PT que sacaram o dinheiro no banco fizeram isso para as campanhas do partido. E devem assumir. Nem todos, é verdade. Tem dois ou três que não fizeram. Mas os outros devem assumir. E dizer claramente que o que fizeram todo mundo faz, porque o sistema político-eleitoral brasileiro leva a isso. Erramos, mas todo mundo errou. Ou vai dizer que os outros partidos resistem a uma investigação?

O que tem de mudar é o sistema político-eleitoral. As campanhas ficaram caras, o preço da democracia ficou muito alto, ninguém suporta os custos de uma campanha.

Showmício hoje é como um grande festival de Rock que é caríssimo, mas financiado por ingressos, por merchandising, por direitos de transmissão. Showmício custa igualmente caro mas é de graça, totalmente bancado pelas campanhas. A campanha na televisão é cada vez mais cara. Ninguém suporta e acaba gerando isso que estamos vendo. O PT está sendo o alvo hoje, mas qualquer partido poderia ser o centro das denúncias.

Acho positivo o Delúbio ter assumido isso. Foi errado, mas é melhor dizer a verdade. Não tem estratégia alguma de assumir o crime menor para esconder o maior. A estratégia é a verdade, é dizer a verdade: se erro houve, foi esse o erro. E isso vai ficar transparente nas investigações. Tem um monte de companheiro sofrendo. Gente que foi remunerada pelo partido com esse dinheiro não declarado e, agora, enfrenta o dilema: ou passa por corrupto ou assume que recebeu o dinheiro pelo seu trabalho legítimo, mas ‘por fora’. Não tem jeito. Quem recebeu sem ser pelos trâmites corretos, tem de admitir, retificar na receita, pagar os impostos. É tudo coisa pequena, tudo pagamento pelo trabalho legítimo pelo partido. Mas como o PT não tinha caixa, tinha de pagar dessa maneira. Agora, tem de enfrentar, admitir e retificar na Receita.

Eu estou tranquilo. Sei que vou levar uns dois anos para me recuperar politicamente, mas vou me recuperar. Tenho forças, já aguentei tranco pior. Vou aguentar mais este.

É por isso que estou calado, não adianta falar agora. Mas vou lutar, porque quem é inocente não teme nada. E eu sou totalmente inocente. Nunca me aproveitei de dinheiro público. Nunca me sujei.

Essa história de dizer que se eu depuser vou botar a boca no mundo, falando cobras e lagartos, como o Jefferson, é falsa, porque eu não tenho o que falar, não tenho podridão nenhuma escondida de nenhum companheiro. Mas tenho dos adversários. Tenho uma lista das nomeações que o Jefferson queria que fizéssemos e que não fizemos porque os indicados não tinham reputação ilibada.

A imprensa à época escreveu páginas e páginas dizendo que os aliados estavam insatisfeitos porque nunca demos nenhum ministério com porteira fechada: a diretoria era sempre pluripartidária, para evitar conluio, para que um controlasse o outro. Sempre se queixavam de que nós dávamos a presidência, mas segurávamos algumas diretorias, para controlá-los. Como é que agora viramos corruptos? Isso não faz sentido.

Vamos ter muita luta pela frente. Mas eu sei lutar. Quando se tem o bom propósito na cabeça, a força não nos abandona.

Eu tenho me dedicado aos meus afazeres de deputado. Ando pelas ruas sem nenhum problema. Vou a todos os lugares. Pego aviões em aeroportos lotados. E nada me acontece. Claro, um ou outro se aproxima para conversar, mas sempre gentilmente. Uma vez ouvi alguém dizer que estava decepcionado. Eu dialoguei, conversei, expus meus pontos.

Essa história de quem tem sósia meu levando tomate podre é mentira. Dupla mentira: primeiro, porque acho que o sujeito não é meu sósia; segundo, porque a história só pode ser inventada. Ouço críticas aqui e ali, mas sempre com muito respeito. Essa é uma característica do nosso povo.

Passo os dias me preparando para a luta. Lendo meus livros. Li a biografia do Fidel, escrita pela Cláudia Furiatti. Agora, estou lendo o livro sobre a Coluna Prestes, do Domingos Meirelles. Por essas duas leituras, as pessoas podem ter uma idéia da minha disposição.”


Fonte:Globo Online

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