13 de set. de 2005

Viúva de Mitterrand diz que crise brasileira é falsa

A presidente da Fundação France Liberté, Danielle Mitterrand, viúva do ex-presidente francês François Mitterrand, falecido em 1996, defendeu, ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu governo. "A crise (política) é falsa. É uma maneira de a oposição desonrar um homem que pode ser bem- sucedido e que tem apoio popular dos brasileiros", declarou Danielle. Ela esteve em Brasília para assinar, com o ministro-chefe da Secretaria das Relações Institucionais, Jacques Wagner, protocolo complementar ao acordo de cooperação Brasil/França para a elaboração de indicadores que permitirão avaliar as políticas sociais e também os avanços em relação ao cumprimento das oito metas do milênio.

"Creio que o momento é de apoiar vigorosamente o presidente Lula pois o caminho do seu governo é correto", acrescentou ela. "Penso que este governo fez muita coisa na área social e vem sendo bem-sucedido."

Danielle apóia vários projetos da área social no país, como as cooperativas de catadores de papel e lixo em Belo Horizonte, que está produzindo material reciclado, e de produtores de açúcar em Pernambuco, que distribui o produto e seus derivados em diversos países da Europa. Após assinar o protocolo, Danielle Mitterrand, destacou que "o grande valor do Brasil é seu povo e sua natureza" e que o empreendedorismo dos brasileiros tem um valor impossível de ser contabilizado.

Fonte: Agência Estado

21 de jul. de 2005

"DESABAFO"

Dirceu: "Vamos ter muita luta pela frente, mas eu sei lutar"

O colunista Jorge Bastos Moreno no Globo Online, citando como fonte um amigo do deputado José Dirceu (PT/SP), diz que, "para quem está há 40 dias no centro de uma crise política dessas dimensões, o homem está inteiro. E seguro."

O colunista reproduz um "relato do que o deputado anda pensando", a partir do que enotou "no meu caderninho". Comenta, a título de introdução, que o ministro-chefe da Casa Civil não faz "um desabafo amargurado, raivoso ou deprimido". Longe disso, Dirceu "estaria surpreendentemente de bom humor, com disposição para a luta". E cita: "Vamos ter muita luta pela frente. Mas eu sei lutar. Quando se tem o bom propósito na cabeça, a força não nos abandona."

Veja o texto reproduzido do blog, com a ressalva, feita por Bastos Moreno, de que "não são as palavras de José Dirceu mas as palavras atribuídas a José Dirceu por um desses amigos que estiveram com ele".

“Por que o Lula me tirou do governo? É uma pergunta que eu me faço cada vez mais. Não há rigorosamente nada contra mim. Nada. Agora, eu tenho até um atestado de idoneidade, depois do depoimento do Cachoeira na CPI dos Bingos. Eu já tinha esclarecido tudo àquela época. Na CPI estadual também fiquei limpo. Não devo nada.

Eu não tenho medo de nenhuma das investigações em curso, estou com a consciência mais do que tranquila. Eu não tenho medo de ir a CPI alguma, mas não vejo sentido em ser convocado pela CPI dos Correios. O que eu tenho a ver com aquela investigação? O meu nome não foi citado uma única vez, por quem quer que seja. Todos os nomes citados pelo funcionário dos Correios que recebe propina são do PTB. Roberto Jefferson me cita para dizer que eu é que mandei fazer aquela investigação. Ora, não vem ao caso se isso é verdade ou não, mas se eu teria mandado investigar, como posso estar envolvido na corrupção?

Os nomes citados na CPI dos Correios são outros. Não fui citado até agora por nenhum depoente. Por que ir lá?

A CPI do Mensalão é outra coisa. Vou ao Conselho de Ética. Não vejo problema nisso. Sou deputado, tenho o maior apreço pela Casa, como não poderia deixar de ser. Vou lá, tenho obrigação de ir e darei todas as explicações.

Vou dizer o óbvio: não tem mensalão algum, nunca teve e tenho certeza de que nunca haverá. Um esquema corrupto desse seria inadministrável! Isso é loucura, fantasia pura.

As oposições viram nessas denúncias uma oportunidade de carimbar o governo do presidente Lula. Mas para derrotá-lo vão ter que vencer nas urnas. Não tem essa conversa de tirá-lo do poder antes.Se tentarem fazer isso, vão incendiar o país, eles sabem disso, e eu vou estar na linha de frente para impedir isso. Se tentarem fazer isso, se o PSDB tentar, fiquem certos de que eles vão passar dez anos sem voltar ao governo, porque esse país vai ficar um furacão. A democracia levou tempo demais para se consolidar e não vai ser qualquer luta política que vai pôr fim a ela!

O PT tem de se explicar. Eu tenho falado isso para todos os companheiros. Se eu estivesse no comando do PT, se o Tarso Genro estivesse no comando do PT, essa loucura não tinha acontecido. Jamais teríamos dado tanta autonomia assim, para empréstimos tão altos. Nunca. Mas eu não podia mais me ocupar do PT e, institucionalmente, nem podia, porque estava no governo. Me afastei totalmente do partido.

Tão falando em Operação Uruguai, mas não é nada disso. Os empréstimos, eu soube agora, existem, estão registrados no Banco Central. A Operação Uruguai foi forjada. Como é que se forjam contratos de empréstimos no sistema bancário oficial, monitorado pelo Banco Central? Isso é balela, e tudo vai ficar esclarecido. Podem dizer que os empréstimos foram uma loucura, mas eles existiram, oficialmente. Isso de Operação Uruguai é besteira, vai tudo ficar claro.

Genoíno, coitado, está sofrendo muito, ele nem tem saúde para aguentar o tranco. Temos de dar suporte a ele nessa hora. Ele de fato não se envolveu nisso. O estilo dele é fazer política e não se envolver nessas questões. Foi omisso. Isso eu digo, com pena, mas digo: foi omisso, uma loucura.

Agora, não adianta chorar. Eu tenho falado para os companheiros. Quem pegou dinheiro para campanha tem de assumir. Não adianta negar, porque mais tempo menos tempo isso virá à tona e não adianta mentir. O pior é parecer que foi mensalão ou dinheiro de corrupção. Não foi. Os deputados do PT que sacaram o dinheiro no banco fizeram isso para as campanhas do partido. E devem assumir. Nem todos, é verdade. Tem dois ou três que não fizeram. Mas os outros devem assumir. E dizer claramente que o que fizeram todo mundo faz, porque o sistema político-eleitoral brasileiro leva a isso. Erramos, mas todo mundo errou. Ou vai dizer que os outros partidos resistem a uma investigação?

O que tem de mudar é o sistema político-eleitoral. As campanhas ficaram caras, o preço da democracia ficou muito alto, ninguém suporta os custos de uma campanha.

Showmício hoje é como um grande festival de Rock que é caríssimo, mas financiado por ingressos, por merchandising, por direitos de transmissão. Showmício custa igualmente caro mas é de graça, totalmente bancado pelas campanhas. A campanha na televisão é cada vez mais cara. Ninguém suporta e acaba gerando isso que estamos vendo. O PT está sendo o alvo hoje, mas qualquer partido poderia ser o centro das denúncias.

Acho positivo o Delúbio ter assumido isso. Foi errado, mas é melhor dizer a verdade. Não tem estratégia alguma de assumir o crime menor para esconder o maior. A estratégia é a verdade, é dizer a verdade: se erro houve, foi esse o erro. E isso vai ficar transparente nas investigações. Tem um monte de companheiro sofrendo. Gente que foi remunerada pelo partido com esse dinheiro não declarado e, agora, enfrenta o dilema: ou passa por corrupto ou assume que recebeu o dinheiro pelo seu trabalho legítimo, mas ‘por fora’. Não tem jeito. Quem recebeu sem ser pelos trâmites corretos, tem de admitir, retificar na receita, pagar os impostos. É tudo coisa pequena, tudo pagamento pelo trabalho legítimo pelo partido. Mas como o PT não tinha caixa, tinha de pagar dessa maneira. Agora, tem de enfrentar, admitir e retificar na Receita.

Eu estou tranquilo. Sei que vou levar uns dois anos para me recuperar politicamente, mas vou me recuperar. Tenho forças, já aguentei tranco pior. Vou aguentar mais este.

É por isso que estou calado, não adianta falar agora. Mas vou lutar, porque quem é inocente não teme nada. E eu sou totalmente inocente. Nunca me aproveitei de dinheiro público. Nunca me sujei.

Essa história de dizer que se eu depuser vou botar a boca no mundo, falando cobras e lagartos, como o Jefferson, é falsa, porque eu não tenho o que falar, não tenho podridão nenhuma escondida de nenhum companheiro. Mas tenho dos adversários. Tenho uma lista das nomeações que o Jefferson queria que fizéssemos e que não fizemos porque os indicados não tinham reputação ilibada.

A imprensa à época escreveu páginas e páginas dizendo que os aliados estavam insatisfeitos porque nunca demos nenhum ministério com porteira fechada: a diretoria era sempre pluripartidária, para evitar conluio, para que um controlasse o outro. Sempre se queixavam de que nós dávamos a presidência, mas segurávamos algumas diretorias, para controlá-los. Como é que agora viramos corruptos? Isso não faz sentido.

Vamos ter muita luta pela frente. Mas eu sei lutar. Quando se tem o bom propósito na cabeça, a força não nos abandona.

Eu tenho me dedicado aos meus afazeres de deputado. Ando pelas ruas sem nenhum problema. Vou a todos os lugares. Pego aviões em aeroportos lotados. E nada me acontece. Claro, um ou outro se aproxima para conversar, mas sempre gentilmente. Uma vez ouvi alguém dizer que estava decepcionado. Eu dialoguei, conversei, expus meus pontos.

Essa história de quem tem sósia meu levando tomate podre é mentira. Dupla mentira: primeiro, porque acho que o sujeito não é meu sósia; segundo, porque a história só pode ser inventada. Ouço críticas aqui e ali, mas sempre com muito respeito. Essa é uma característica do nosso povo.

Passo os dias me preparando para a luta. Lendo meus livros. Li a biografia do Fidel, escrita pela Cláudia Furiatti. Agora, estou lendo o livro sobre a Coluna Prestes, do Domingos Meirelles. Por essas duas leituras, as pessoas podem ter uma idéia da minha disposição.”


Fonte:Globo Online

18 de jul. de 2005

Allons enfants de la Daslu

Na véspera do 206 aniversário da Queda da Bastilha, os com-culote do andar de cima brasileiro foram à luta para defender a casa comercial Daslu. Treze de julho era também o 199 aniversário do dia em que Charlotte Corday, uma maluca mística, meteu uma faca no peito de Jean-Paul Marat, o jornalista que se intitulava “o amigo do povo”. Atribui-se ao historiador Fritz Stern, da Universidade Columbia, a observação de que os ricaços brasileiros vivem num mundo anterior à Revolução Francesa. Talvez isso explique a defesa da Daslu. É uma Bastilha que finalmente encontrou quem lute por ela: “Aux armes, citoyens”.

Marcharam os marqueses da Fiesp, um punhado de senadores e alguns sibaritas que por cá são denominados “colunáveis”. (Pessoas que, por absoluta falta de qualificação, deixam-se apresentar como profissionais da arte de sair em colunas.) Juntaram-se tucanos e pefelês. Todos horrorizados. O grito da Fiesp deu a dimensão do episódio: “Fatos notórios recentes, vivenciados pela sociedade, revelam situação de anormalidade (?) Não há como se manter alheio ou indiferente a essa realidade”.

Uma vizinha da Daslu, moradora da favela Coliseu, quando viu policiais armados de metralhadora, achou que a coisa ia ficar feia para sua gente. Surpreendeu-se ao perceber que a tropa foi “para o lado dos bacanas”. Contrastes há em muitos lugares. Cinquenta quarteirões separam a pobreza do Harlem hispânico de Nova York do triângulo celestial formado pelas joalheiras Tiffany, Bulgari e Van Cleef, nas esquinas da Quinta Avenida com a rua 57. Os brasileiros são maiores, mas não é no tamanho do contraste que mora o problema. O que falta a Pindorama é o velho e bom capitalismo, no qual o sonegador é um concorrente desleal.

O capitalismo é um sistema no qual a rainha dos hotéis de Nova York, Leona Helmsley, tomou 18 meses de cadeia, mais uma multa de US$ 7 milhões por ter sonegado impostos e dito que pagá-los era coisa de gentinha. No mesmo dia em que se formaram no Brasil os Batalhões Daslu, o ex-gênio da WorldCom, Bernard Ebbers, foi condenado a 25 anos de prisão por ter fraudado o Fisco e os acionistas da empresa em US$ 11 bilhões.

É a falta de capitalismo que gera men$alões, Valérios, Delúbios, caixa dois, empregado sem carteira assinada, mala de bispo da Igreja de Deus e cueca infernal de petista. Pode-se dizer o que se queira do deputado Roberto Jefferson, mas jamais um empresário brasileiro denunciou um décimo das malfeitorias que ele levou ao ventilador. Muito menos a Fiesp.

Os Batalhões Daslu poderiam prestar um serviço ao capitalismo, à marca, ao Fisco, à patuléia e à representatividade das instituições patronais. Pediriam à Polícia Federal e à Receita que providenciassem uma lista com o preço unitário de cem itens do catálogo Dasluziano. Não o preço de venda. O preço de importação, aquele das faturas. Nele, uma gravata de Ermenegildo Zegna vale R$ 3 (o estacionamento custa R$ 30). Há vestidos de R$ 30 e camisas de R$ 15. Essa lista seria a base da maior liquidação de todos os tempos. A loja botaria um lucro de 100% em cima de cada peça e venderia a gravata do Zegna por R$ 8 (admitindo-se R$ 2 de novos impostos). Haveria vestidos Daslu custando menos de R$ 100. Seria o mensalão do bem.

Fantasia? Talvez não. Conta a lenda do Fisco americano que o núcleo da coleção da National Gallery foi doado à nação depois de um entendimento dos fiscais da Viúva com o banqueiro Andrew Mellon, secretário do Tesouro do presidente Herbert Hoover. Dizem até que foi uma “situação de anormalidade” estimulada pelo presidente Franklin Roosevelt. Esse entendia de capitalismo.

escrito por Elio Gaspari em 17 de julho de 2005

13 de jul. de 2005

O Mensalão e a Matemática

por WAGNER DIAS DE MEDEIROS - retirado do blog da Tereza Cruvinel

Um pouco de humor. O Prof. Eduardo Diatahy Bezerra de Menezes, envia-nos, dando curso a "corrente", o texto produzido por estudantes de engenharia, sobre a "Matemática do Mensalão", mexendo (óbvio) com seus colegas da área de "comunicação social", onde a matemática não costuma ser o forte...Estudantes de Engenharia estão divulgando esse texto, que além de bem-humorado, faz algum sentido: Use seu senso detetivesco e acompanhe com eles as investigações sobre o "crime da mala";Segundo Roberto Jefferson, o mensalão do PT era transportado em malas.Primeira questão: você transportaria uma alta quantia de dinheiro em uma mala enorme, com todo o ar de coisa suspeita? Numa discreta valise de executivo, talvez. Uma destas valises mede 40cm de largura por 35cm de comprimento, tendo em torno de 5cm de profundidade. Uma nota de 50 ou 100 reais tem 12cm X 6cm, logo uma valise comportaria com segurança quatorze maços de quinhentas notas o que equivale a sete mil notas.

Ainda, segundo Roberto Jefferson, o mensalão era de trinta mil reais, o que em notas de cem daria um paco de trezentas notas de cem. Levando-se em conta que esse dinheiro não poderia ser depositado em conta corrente, o jeito era levar pra casa e ir gastando. Você já tentou trocar uma nota de cem? Bem, trocar trezentas notas de cem não deve ser fácil , mesmo para um deputado. Então vamos supor que o mensalão fosse pago em notas de cinqüenta. Jefferson disse que a bancada do PP, que é composta de 53 deputados, e a do PL, com 55, recebiam o mensalão de 30 mil reais. O que dá um total de 108 mensalistas, recebendo a quantia de três milhões, duzentos e quarenta mil reais por mês, o que em notas de 50 equivale a 64.880 notas, que seriam então transportadas em nove malas, já que cada mala carrega sete mil notas. As malas iriam então com trezentos e cinqüenta mil reais, ou seja dez deputados e 1/6 de um.

Como não existe alguém 1/6 corrupto, vamos assumir dez malas, para juntar numa mais vazia os pedaços de corruptos que sobram. Ainda segundo Jefferson, o pagamento aos dirigentes de partidos era feito numa sala ao lado da sala do Chefe da Casa Civil, em pleno Palácio de Governo, por Delúbio Soares, que não ocupava cargo nenhum no mesmo Governo. Delúbio levaria todo os meses dez malas para dentro do Palácio, para entregar a dirigentes de partidos. Tudo isso discretamente, sem chamar a atenção de ninguém. Delúbio só tem duas mãos. Também não seria muito simples entrar no Palácio com alguns carregadores ou com um daqueles carrinhos de aeroporto, logo, ele poderia transportar - no máximo- duas malas, o que já seria muito suspeito. Alguém anda por aí com uma mala de executivo em cada uma das mãos, sem que ninguém repare? Delúbio teria de entrar então, discretamente. Com uma mala de cada vez. O que daria dez viagens num mesmo dia. Impossível passar desapercebido.

Um terço de mensalão, só em mala. E de onde viria tanto dinheiro? Segundo Karina Sommagio das empresas de Marcos Valério, um corruptor tão ingênuo que deixa seu Office-boy, que deve ganhar menos de quinhentas pratas ao mês, sacar em dinheiro das contas da empresa um milhão de reais e vir tranquilão, com três valises, ou uma grande mala pelas ruas de Belo Horizonte, uma cidade sem nenhuma violência e com os Office-boys mais honestos do mundo, pois, embora trabalhem para corruptores de deputados, jamais pensaram em sacanear seus patrões e fugir com a grana direto pro Aeroporto da Pampulha, morrendo de rir do babaca do patrão que não pode nem dar queixa à polícia. Senhores, essa história tem mais furos do que queijo suíço e só há uma explicação para a imprensa não ter parado para fazer essa conta: jornalistas não sabem matemática. Por isso, prestaram vestibular para COMUNICAÇÃO SOCIAL. VIVA A ENGENHARÍA!!!

O grande erro da cúpula petista foi ao ter encontrado em Brasília, uma máquina de arrecadação de dinheiro que era usada, há décadas para, desde a pura e simples compra de parlamentares(200 mil para a reeleição de FHC) ao financiamento de campanhas, até, como não poderia deixar de ser, o enriquecimento próprio. Ao que tudo indica, esta cúpula dirigente usou a mesma máquina, para comprar deputados de partidos fisiológicos, a fim de garantir a tal governabilidade e pagar dívidas de campanha. Pelo menos não houve enriquecimento próprio, se é que isso serve de atenuante de culpa. E agora, os mesmos caras que inventaram a maquininha, se arvoram de reserva moral da nação, com o único objetivo de toma-la de volta e todo mundo embarca na onda deles. O PT já esta pagando caro pelo erro dos seus dirigentes. O que PFL, PSDB e Bob Jefferson, que não são em nada são melhores que o PT, muito pelo contrário, querem é a destruição do PT, o que com certeza não interessa à democracia brasileira.

Quando parar o maluco sou eu

Impressionante, mas quem escreveu 'sabe tudo' de golpe. Amigo dos milicos, conhece as engrenagens golpistas e todas as suas artimanhas. Bem segue o texto dele hoje:

Há um fino golpe no ar
ELIO GASPARI

É golpista a articulação de uma renúncia de Lula à reeleição. Embrulhada numa Sacola da Daslu (a Bolsa Família dos tucanos), ela funcionaria assim:
1 — Lula vai à televisão e anuncia que não disputará a reeleição.
2 — O Congresso aprova uma emenda constitucional que acaba com a reeleição e aumenta de quatro para cinco anos o mandato dos próximos presidentes da República.
3 — Desmoralizado, o companheiro vai para casa, o PT definha, e o PSDB volta ao Planalto.

A idéia é golpista porque coloca a Constituição a reboque de um arranjo. As leis da terra dizem que o mandato de Lula vai até o dia 1 de janeiro de 2007, quando será substituído na Presidência pelo cidadão escolhido em 2006. Essas mesmas leis garantem ao companheiro o direito de disputar a reeleição.

O arranjo embute a cassação dos cidadãos encarregados de eleger o presidente da República. Cassa-lhes o direito de julgar Lula. Se ele quiser disputar a reeleição, duas coisas podem acontecer: ganha ou perde. Nos dois resultados, seu destino será decidido pela patuléia soberana que o pôs no Planalto em 2002. Os hierarcas de Brasília não têm mandato para fazer um cambalacho que tira aos eleitores o direito de decidir a questão. Tem gente disposta a mostrar que continua confiando no presidente, assim como tem gente que venderia a cueca para ter o gosto de mandá-lo de volta para São Bernardo.

O interesse pela renúncia de Lula reflete dois tipos de receios. A desistência seria conveniente para preservá-lo. Uma espécie de trégua no andar de cima. Esse é o receio bem-intencionado. Maligno é o medo de que, uma vez candidato, Lula se reeleja. Afinal, se esse medo não existisse, a desistência seria desnecessária, por irrelevante.

Medo de voto é coisa perigosa. Não custa lembrar uma brilhante construção do jornalista Carlos Lacerda em 1950: “O sr. Getúlio Vargas (?) não deve ser candidato à Presidência. Candidato, não deve ser eleito.” Até aí, tudo bem, mas Lacerda continua: “Eleito, não deve tomar posse. Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar.” As desgraças da política nacional na segunda metade do século passado vinham das duas primeiras negativas: “não deve ser candidato (?)”, “não deve ser eleito”. Era o medo da volta de Vargas, que virou medo da chegada de João Goulart e, mais tarde, tornou-se o medo (absolutamente despropositado) da vitória de Lula.

Trata-se de um golpezinho esperto, porque seria ratificado pela vítima. Como na mágica de 1961, quando João Goulart se conformou com o parlamentarismo de mentirinha que salvou a face de uma revolta de generais derrotada nas ruas. É também um golpe bem-educado, pois assenta-se exclusivamente num conchavo parlamentar. Não rosna a força das armas, nem a da rua.

Em 1840, com o Golpe da Maioridade, os mandarins do Império colocaram um garoto de 14 anos no trono do Brasil.Na República, sucederam-se os Golpes da Menoridade, todos destinados a substituir a vontade de um povo considerado incapaz. A idéia é sempre a mesma: em nome de uma conciliação destinada a aplacar as tensões da Guerra Fria (no século XX) ou dos mercados financeiros (no XXI) aceita-se qualquer acordo, desde que a escumalha fique de fora.

Se Lula achar que deve disputar a reeleição, não se pode tirar ao povo brasileiro o direito de decidir onde o companheiro vai morar.

12 de jul. de 2005

Imprensa que eles peidam

o título é uma alusão ao bloco de carnaval 'imprensa que eu gamo'

Num país sério essas coisas não ocorreriam. O Globo Online estampa que as 'Denúncias não sujam a imagem de Lula', pôrra, todo mundo sabe a diferença entre sujar e manchar, graus distintos. É uma imprensa, em sua maioria, covarde. Se esconde atrás do véu da liberdade, mas quando é assunto favorável aos seus editores mudam logo o tom.

Me lembra aquelezinho do 'Merdal' Pereira que tomou uma corrida do Lessa. Também escrevia bobagem pelo simples fato de querer desancar os outros, no caso o presidente do BNDES numa campanha pessoal. Esta imprensa não pode continuar assim, mas vai. Este mesmo Merval escreveu que inchaço de deputados da base governista não ocorreu no governo anterior. Como?! Hã?! O PSDB se elegeu com uns 30 ou 40 e logo depois já passava dos 60/70.

E a Dora, nossa senhora, é horripilante escutá-la nas ondas do rádio. Lê-la eu já havia desistido. E a filha dela, a Helena Chagas, deveríamos sermos vacinados com doenças como essa...

Sinto pelos poucos bons jornalistas, Tereza Cruvinel é um deles, são ilhas deética comportamental nesta excrecência geral.

Por isso que eu falo(escrevo), a gente lê os jornais, internets, tvs e rádios e é tudo pasteurizado. Stálin ficaria orgulhoso... Plim-plim.

8 de jul. de 2005

Momento de descontração

Uma interface em 3D do planeta
Tem algum lugar do planeta que voce gostaria de conhecer? Experimente o link abaixo, é surreal. Dependendo da cidade voce pode ver até os carros, construções em 3D e o caramba a quatro. Imperdível e de graça. O Google está foda...
http://desktop.google.com/download/earth/index.html

7 de jul. de 2005

Câmara se queixa do "Casseta & Planeta"

Pressionada por deputados, a Procuradoria da Câmara vai reclamar junto à Rede Globo pelas alusões feitas no programa "Casseta & Planeta" exibido terça-feira passada.

Os parlamentares reclamaram especialmente do quadro em que foram chamados de "deputados de programa". Nele, uma prostituta fica indignada quando lhe perguntam se é deputada.

O quadro em que são vacinados contra a "febre afurtosa" também provocou constrangimento. Na noite de quarta-feira, um grupo de deputados esteve na Procuradoria da Câmara para assistir à fita do programa. Segundo o procurador Ricardo Izar (PMDB-SP), duas parlamentares choraram. Izar se encontrará segunda-feira com representantes da emissora para tentar um acordo antes de recorrer à Justiça.

O presidente da Câmara, Severino Cavalcanti ( PP ), também se disse indignado: - O programa passou dos limites. Eles têm talento suficiente para fazer graça sem desqualificar a instituição, que garante a liberdade para que façam graça.

O diretor da Central Globo de Comunicação, Luís Erlanger, disse que a rede só se pronuncia sobre ações judiciais depois de serem efetivadas. Os humoristas do Casseta & Planeta não quiseram falar sobre o assunto dizendo não querer "dar importância à concorrência".

NOTA DE ESCLARECIMENTO
"Foi com surpresa que nós, integrantes do Grupo CASSETA & PLANETA, tomamos conhecimento, através da imprensa, da intenção do presidente da Câmara dos Deputados de nos processar por causa de uma piada veiculada em nosso programa de televisão. Em vista disso, gostaríamos de esclarecer alguns pontos:

1. Em nenhum momento tivemos a intenção de ofender deputados ou prostitutas.O objetivo da piada era somente de comparar duas categorias profissionais que aceitam dinheiro para mudar de posição.

2. Não vemos nenhum problema em ceder um espaço para o direito de resposta dos deputados. Pelo contrário, consideramos o quadro muito adequado e condizente com a linha do programa.

3. Caso se decidam pelo direito de resposta, informamos que nossas gravações ocorrem às segundas-feiras, o que obrigará os deputados a "interromper seu descanso."

6 de jul. de 2005

EUA no Paraguai

O governo de Assunção acaba de autorizar o estacionamento de tropas norte-americanas em seu território. Pela primeira vez teremos bases estrangeiras permanentes na América do Sul, na estratégica região da usina de Itaipu.

MAURO SANTAYANA da Agência Carta Maior em 4/7/2005

Com os olhos em Roberto Jefferson, não estamos atentos ao que se passa ali, no Paraguai. O governo de Assunção acaba de autorizar o estacionamento de tropas norte-americanas em seu território. Pela primeira vez teremos bases estrangeiras permanentes na América do Sul, e em região estratégica continental. Nessa tríplice fronteira se encontra a maior represa do mundo, a de Itaipu, de cuja energia todo o território paraguaio e grande parte do território brasileiro dependem. A região é também das mais férteis do mundo e se encontra mais ou menos na eqüidistância dos dois oceanos.

Temos relações historicamente difíceis com o Paraguai, desde a guerra contra López. Os revisionistas procuram culpar o Brasil pelo conflito, mas a isso fomos levados pelo fechamento do Rio Paraguai aos nossos barcos e, em seguida, pela invasão de grande parte do território do Mato Grosso. Não coube ao Brasil a iniciativa da agressão. É certo que o genro do Imperador Pedro II foi particularmente cruel com a população derrotada e, talvez por isso, tenhamos cedido em tudo nas nossas relações com o país vizinho.

Não sabemos se o Paraguai nos comunicou essa decisão perigosa. É provável que não. A submissão paraguaia aos Estados Unidos é tão forte que este colunista, há quarenta anos, ao descer em Assunção, encontrou o aeroporto tomado por tropas formadas, ao lado de colegiais que agitavam bandeirolas norte-americanas. Procurou saber o que ocorria: o funcionário do Departamento de Estado que cuidava dos assuntos do Paraguai estava chegando em visita oficial a Assunção.

Conforme divulgou a revista Newsweek, logo depois de 11 de setembro, o sub-secretário da Defesa, Douglas Feith, sugeriu a Bush a invasão da tríplice Fronteira por tropas aerotransportadas, a fim de capturar membros da Al Qaeda e ocupar permanentemente a região. Alguém achou melhor a invasão do Iraque, mais viável politicamente. Tudo isso nos leva a pensar um pouco no que nos está ocorrendo. É bem provável que Washington tente retirar vantagens da crise interna. Um país dividido, conforme a velha advertência de Lincoln, é presa fácil para os seus adversários.

Como os Estados Unidos não podem viver sem guerras, e estando suas tropas escorraçadas do Iraque, não seria de admirar se viessem a nos agredir sob o pretexto da presença de muçulmanos em Foz do Iguaçu. Tudo isso deve convocar a nossa reflexão, a fim de esclarecer logo as denúncias que atingem o governo e o Partido dos Trabalhadores, a fim de que possamos nos organizar para a eventual defesa da soberania territorial do Brasil. Temos, ali, o exemplo histórico de provocações e de ocupação de nosso espaço soberano.

Os Estados Unidos, hoje, mais do que nunca, estão desrespeitando todas as regras de convívio internacional, a ponto de o mais submisso governante europeu, Sílvio Berlusconi, ver-se obrigado, na última sexta-feira (1º), a pedir explicações oficiais ao embaixador norte-americano pelo fato de a CIA ter seqüestrado um clérigo muçulmano em Milão e o haver transferido clandestinamente para fora do país. A Justiça italiana determinou a prisão dos 13 agentes da CIA envolvidos no episódio.

Se assim agem contra um país da União Européia com o qual têm as relações mais fraternas ao longo da História, que podemos deles esperar quando nos encontramos fragilizados pela crise, e pela entrega de setores estratégicos aos estrangeiros, durante o governo neoliberal de Fernando Henrique, quando disputamos com o Paraguai a vassalagem a Washington?

4 de jul. de 2005

Cinco razões para defenestrar Lula

Em meio à crise, vem-se dizendo à esquerda e à direita que a turma da Casa Grande não teria motivos para defenestrar Lula do Planalto, uma vez que a política econômica lhe satisfaz. Ledo engano. A entrevista de FHC à revista "Exame" é um indício disso.
Em meio à maré de denúncias e debates sobre corrupção no PT, no governo, em estatais e no Congresso, vem-se propalando tanto à direita quanto à esquerda a tese de que a turma da Casa Grande brasileira, em especial a do disco rígido financeiro e rentista, não teria o menor motivo para defenestrar Lula do Planalto, uma vez que a sua política econômica lhe protege e satisfaz o apetite.
Ledo engano. O indício mais claro desse engano é a solerte sugestão do sempre alerta Fernando Henrique Cardoso, em entrevista à revista Exame que ora circula, sugerindo que Lula declare não ser candidato em 2006 como modo de saltar sobre a crise de governo, além de repetir que o PT é um partido anacrônico, estatista, etc. Dou abaixo algumas razões para que a Casa Grande queira defenestrar Lula, seja em 2006, seja antes, se esta oportunidade se oferecer ou se impuser.
1) Há prisões demasiadas de empresários aparecendo na TV, e escritórios de advocacia tendo arquivos abertos. Já se ouvem gritas na também sempre alerta imprensa, em artigos e editoriais, reclamando que a Polícia Federal está demasiado à solta. Ou que o governo faz publicidade e espalhafato com essas prisões e devassas. Ora, um Ministério da Justiça de fato comprometido com a luta contra os crimes de colarinho branco é coisa que tira o sono de muita gente na Casa Grande brasileira. E o povão gosta de ver colarinho branco criminoso algemado ou preso. Ou não?
2) Lula negociou com o MST. E resistiu ao tratoraço dos ruralistas em Brasília, não lhes cedendo tudo aquilo que queriam. Até o momento o governo não reprimiu um único movimento de trabalhadores. Apesar de envolto pela política econômica neoliberal que recebeu de herança, Lula guarda uma identificação de raiz com as classes trabalhadoras e a gente pobre. Não extirpou completamente a esquerda de seu governo nem deixou de fazer políticas sociais de relevo, ainda que comprimidas pela torneira seca do Ministério da Fazenda e dentro da moldura apertada da tecnocracia do Banco Central, através do sacrossanto superávit primário. Mas é o suficiente para que a Casa Grande não goste e veja o governo com desconfiança. Além de lhe ser também uma ameaça ao sono tranqüilo, esse permanente cheiro de pobreza e trabalho no paço é uma ofensa à sua visão de cultura, ao seu gosto e ao seu estilo.
3) A política externa. Hoje se trava uma luta na América Latina de dimensões continentais. A comarca andina está tomada por insurreições populares. Da Bolívia, vieram fotos suficientes para molestar o sono da Casa Grande, sobretudo quando entre os camponeses apareceram os capacetes dos mineiros, com seus cartuchos de dinamite a enfrentar o Exército, como em 1952. Governos à esquerda espalham-se pelo continente. É uma questão de classe: neste quadro de confronto, é fundamental para a Casa Grande retomar o controle direto sobre a política externa de metade da América do Sul, isto é, o Brasil e consolidar a sua política de alianças. Além do mais, a nova inflexão da política externa brasileira inverteu o sentido das negociações da Alca, aproximou-se de países emergentes, consolidou-se como uma das lideranças neste grupo, enfrentou os países onde se concentram os donos do mundo. É demais para a Casa Grande, cujo interesse principal é o de subordinar de todo a política externa à garantia de créditos internacionais.
4) Lula ainda tem por trás de si um partido que pode se reerguer das brasas em que está sendo fritado. Esse partido é um patrimônio da esquerda nacional, continental e mundial. No momento, sua direção está acuada pelas acusações e sua militância, aturdida. Mas se esta militância vencer a confusão e trocar a direção do partido, ou pelo menos forçar a troca da direção em que a direção se move, Lula terá reativado o braço esquerdo de sua administração. Assusta as noites da Casa Grande o pesadelo de ter pela frente um partido que, ao invés de ter de ficar explicando sete dias por semana por que não afasta ou se afastam de sua direção os acusados de corrupção enquanto durem as investigações, passe à ofensiva, rearticulando-se com os movimentos sociais e pressionando para que se acentue o lado social do governo Lula e ponha em declínio o seu lado neoliberal.
5) Lula está grudado em Palocci, na Fazenda e no Banco Central, mas Lula não é Palocci. Palocci comprou e revendeu a política econômica dos tecnocratas da Fazenda e do Banco Central. Para a Casa Grande, é ele o presente fiador público dessa política, como matérias na imprensa vem demonstrando, não Lula. Lula é um acidente de percurso, uma pedra no sapato, ainda que o sapato continue andando na mesma direção. Em algum lugar do passado, Lula se declarou favorável à ampliação do Conselho Monetário Nacional. De vez em quando Lula peita a política da Fazenda. Foi assim no acordo com o MST, foi assim no caso do Fundeb. O sonho dourado da Casa Grande é ter uma disputa em 2006 entre Palocci e Alkmin, ou sucedâneo, como FHC ou Serra. Já pensou? Em que lua de Saturno eu vou me refugiar?
É claro que, para a Casa Grande, ainda há muita coisa a acomodar nesse quadro. Como satisfazer o apetite do PFL? Como ajeitar a disputa interna no PSDB? Que pedaço do PMDB atrair para uma nova frente de direita? Como garantir que a metralhadora giratória do deputado Roberto Jefferson só cause estragos no PT e no governo, uma vez que isso de manchetes só darem destaque a essa parte das acusações tem limites? Como impedir que a crise da esquerda jogue água no moinho de algum Berlusconi à brasileira, ou novo Collor, com quem tenha de renegociar suas pretensões? Como conciliar a bandeira que está se firmando, de diminuir drasticamente o número de cargos de confiança, coisa que o governo Lula deveria empalmar como bandeira, quae sera tamen, ainda que tarde, com o tradicional apetite dos partidos que a representam? Como evitar que a bandeira, que também se afirma, do financiamento público de campanhas eleitorais, comprometa seus métodos tradicionais de influenciar a vida partidária? Que concessões fazer ao Condomínio da Classe Média, agitado ou deprimido pelas novas denúncias de corrupção, e comprimido entre a avidez financeira e rentista, e a pressão por dias melhores dos “de baixo”, uma vez que o currículo dos partidos que representam a Casa Grande é assustador?
O Brasil é um país peculiar, porque tem movimentos sociais organizados e muito fortes, apesar da retração que lhes é imposta em tempos de império do mercado: como impedir que eles se aglutinem e façam barreira intransponível à pretensão da Casa Grande de acaudilhar de vez o Estado pela próxima década e por todos os séculos dos séculos amém? Como afastar Lula antes da eleição, se seu prestígio junto ao povo permanecer inalterado apesar das denúncias, sem provocar uma comoção social, pondo os movimentos na rua a defender seu mandato?
Como passar à ofensiva ideológica, uma vez que tudo o que os arautos da Casa Grande na imprensa e fora dela defenderam, baseados no Consenso de Washington, deu errado no mundo inteiro e no Brasil, fazendo naufragar antes do tempo os vinte anos da prometida “era FHC”? Como rearranjar um acordo entre os interesses rentistas, industriais, comerciais, e agronegociais? Como neutralizar a bandeira da reforma agrária sem dar a impressão de que estaria fazendo isso?
Como vêem, a vida na Casa Grande, ainda que mais amena do que no resto do Brasil, também não está fácil. Uma coisa é certa: para ela, nenhuma resposta possível a estas perguntas passa pela presença de Lula no Planalto além de 2006, seja ele símbolo ou líder, ou coisa que o valha. Todas elas exigem a restauração, no paço, dos seus brasões ou varões assinalados, ao invés de alguém que ainda cheira demais a povo.
Resta saber o que a esquerda vai fazer. Se vai enfiar a cabeça no buraco ou se vai de novo olhar o horizonte e recuperar sua estrela-guia. Mas isto é assunto para outra carta, que esta já vai longa na noite que estamos atravessando.
De Flávio Aguiar para a Agência Carta Maior

28 de jun. de 2005

Confronto de Números

Comparação de 100 indicadores vê diferenças entre governos Lula e FHC
Por Maurício Dias

O governo Lula é melhor do que o governo de Fernando Henrique Cardoso? Parece que sim, para 48% da população brasileira, conforme mostrou o Ibope divulgado em 17 de junho. A série histórica da pesquisa – encomendada desde setembro de 2003 pela Confederação Nacional da Indústria – indica que esse resultado positivo não é uma situação ocasional registrada agora, quando Lula atravessa, por sinal, uma tormenta política. A vantagem do governo petista sobre o tucano tem sido freqüente. Já foi maior (55% em setembro de 2003) e menor do que agora (em junho de 2004 baixou para 42%).

Política econômica
Os juros altos prejudicam o desempenho do governo petista na cesta de índices pesquisados
Seria essa uma percepção positiva advinda de falsos milagres atribuídos aos marqueteiros? Afinal, Lula tem usado bastante a publicidade para anunciar alguns de seus feitos administrativos. Parece que não, a julgar pela comparação de 100 indicadores de desempenho governamental medidos nos dois primeiros anos dos dois governos. Nesse confronto direto – Lula vs. FHC – a vitória do petista sobre o tucano é incontestável. Assim, os números sustentam o retrato feito pelas pesquisas.

“Nos 100 indicadores de desempenho, os dois primeiros anos do governo Lula bateram os do primeiro biênio FHC em 56 deles, contra 44 médias de FHC superiores às de Lula”, afirma o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos, em texto publicado na revista Insight Inteligência, que, por mala direta, circulará a partir da terça-feira 28 para um seleto número de autoridades, políticos e intelectuais.

O objetivo de Wanderley Guilherme dos Santos é o de oferecer um cardápio capaz de atiçar um debate que vá além das suposições feitas até agora. Estabelecida a comparação entre as variações dos dois primeiros anos do governo Lula – a fase que já possui séries completas – com as variações dos dois anos do primeiro e do segundo mandato de FHC, surge o governo que apresenta os melhores resultados. A consolidação dos indicadores em três categorias – “economia”, “produção” e “social” – pode ser o começo de uma reflexão sobre “qual tem sido o melhor governo”. Não havia, até então, um conjunto de informações tão grande como o que foi reunido por ele. Os números permitirão um julgamento mais consistente dos dois governos. Um que já acabou (FHC) e outro ainda em andamento.

Para Wanderley Guilherme, o resultado tira o argumento martelado pelas vozes de oposição: “É falsa a propaganda de que a gestão do atual governo inexiste ou é inepta”, disse ele a CartaCapital.

Wanderley Guilherme não entra na avaliação das políticas executadas, que, em alguns casos, são iguais ou bastante próximas. Ele convoca os “sérios investigadores” a imaginar e a pesquisar as razões pelas quais “o desempenho do primeiro biênio do governo Luiz Inácio Lula da Silva foi largamente superior ao desempenho dos dois mandatos da era FHC nos dois biênios considerados”.

Os resultados da pesquisa Ibope guardam uma relação expressiva com os indicadores. No ranking do instituto, a sondagem de junho mostra que o governo tem maus resultados no capítulo do “combate ao desemprego”. Para o Ibope, “as menções a esse tema, que chegaram a 17% em março, a melhor posição no ranking desde o início do governo, recuaram para 13%”. Há um crescimento na desaprovação quanto ao combate ao desemprego. Ou seja, uma condenação implícita à política de juros altos, considerada pelos especialistas como o principal entrave ao “espetáculo do crescimento”.

Isso está refletido na planilha dos indicadores sociais e pesa contra Lula. A pesquisa confronta indicadores de todo tipo, desde dados de desemprego e concessão de crédito até mesmo consumo de carne. Na rubrica “desemprego aberto”, o governo de Fernando Henrique supera o de Lula nos dois biênios. FHC ganha também no consumo de carne e há um empate no indicador “Operações de crédito do sistema financeiro – Habitação”, considerada a média dos três biênios. O governo tucano foi melhor, igualmente, na manutenção do salário mínimo real.

O governo Lula tem nítida vantagem sobre o “salário real médio – indústria”, no preço do pão francês e no preço do botijão de gás. Assim como vence, na média dos biênios, em relação ao número de famílias assentadas e no custo da cesta básica. Ao final, consideradas as 16 rubricas sociais da planilha, o governo Lula supera o de FHC por 10 a 6 (quadro Melhores Indicadores por Gestão – consolidado).



Na categoria “economia” – em cima de uma política herdada de FHC –, a administração Lula é melhor na balança comercial, em bens de capital, na contribuição da formação bruta de capital fixo para as riquezas do País (o Produto Interno Bruto, PIB). O governo do PT leva vantagem sobre o do PSDB na diminuição da dívida interna e, por conseqüência, na relação da dívida líquida com o PIB. É melhor, na média, o desempenho de Lula na redução da dívida externa. Os tucanos estão melhores na arrecadação de IPI. Lula vence na diminuição dos índices de inflação.

No capítulo da “produção”, a taxa de juros de longo prazo (TJLP) favorece Fernando Henrique Cardoso. Mas a Taxa Selic favorece o petista. O governo FHC foi melhor na “produção física – bebidas” e nas vendas de máquinas agrícolas. Lula ganha na produção de caminhões e em “máquinas e equipamentos”.

No confronto dos dois primeiros anos de Lula com os dois primeiros do segundo biênio de FHC, a vantagem de Lula aumenta para 59 resultados favoráveis, em 100, contra 40 de FHC, sobrando um empate, analisa Wanderley Guilherme. Na média geral, segundo ele, o desempenho dos dois primeiros anos de Lula é superior ao dos dois mandatos de FHC em 64 dos 100 indicadores comparados.

Há duas semanas, em entrevista a CartaCapital , Wanderley Guilherme dos Santos denunciou a possibilidade de um “golpe branco”, pretendido por adversários de Lula, e que seria apoiado pelos tucanos, em particular. Hoje, o cientista político revê parte de sua posição – acha que o ímpeto golpista foi amainado –, mas não deixa de fazer blague, ao considerar o resultado comparativo dos números, a popularidade que Lula ainda mantém e a eleição presidencial de 2006: “Esses números explicam as razões do golpe”.

Clique aqui e confira a tabela completa

23 de jun. de 2005

Dioguianas

"Não estamos perdidos, pelo contrário, venceremos se não tivermos desaprendido a aprender".
Rosa de Luxemburgo

21 de jun. de 2005

Terezas

Da série recordar é viver
FH, aqui mesmo nesta coluna, em 24 de maio de 2001, diante das denúncias e pedidos de CPI capitaneados pelo PT, acusou: “A leviandade da imprensa e o golpismo branco da oposição de estão criando um clima de fascismo e terror insuportável”.
Tereza Cruvinel (21-06-2005)

A história que se repete

Ontem, no Roda Viva, ficou patente que o intuito do Bob Jefferson é o de colar no PT (via Zé Dirceu) de que todos são políticos. Ele acha normal que um empresário que tenha fortalecido o caixa de uma campanha seja beneficiado no governo [obviamente se for o vencedor].

Se ele afirma que o Marinho agia por conta própria (uma ninharia que ele pedira), será que não podemos supor que o Marinho assim agiu porque sabia das negociatas feitas pelo presidente de seu partido? Ou seja, o Marinho sabia que a cúpula pedia dinheiro para beneficiar empresários e, então, ele fez o mesmo.

O RJ reconhece o poder da imprensa para promover linchamentos públicos. Citou a CPI do PC como exemplo. Mesmo com a presidência e relatoria na mão do governo, não conseguiram segurar as denúncias que eram levantadas pela mídia. Em suma, ele quer repetir a história. Mas a história que se repete é uma farsa.

Ele acerta quando diz que sublimou o seu mandato. Porém, quando deverá valer este ato corajoso? Ministérios à parte, qual será a compensação? O afastamento do PT do governo? A quebra do patrimônio ético do PT? A mira é bem direcionada. Se em 89 miraram o PT como criminal por estar ligado à terroristas e seqüestradores, agora tentam colar a mesma pecha de criminal, mas como corruptor. Mas a história que se repete é uma farsa.

O estrago foi feito. Hoje, nas ruas, as pessoas acham que RJ é o homem da vassoura, que com sua verborragia limpará o congresso. Dirceu está queimado como corruptor-mor. E de Lula só falam que está tristonho e desanimado. Pois é, o RJ joga com a imprensa, promove o linchamento e boa parte da mídia o apóia, se não diretamente, lhe fornecendo um bom palanque.

Porém, o Ilimar está de parabéns pelas perguntas sem respostas. O RJ não respondeu uma pergunta dele. Só gostaria de ver na CPI como serão as perguntas.

20 de jun. de 2005

Composição Parlamentar de Inquérito

A CPI dos correios irá começar, agora algumas ponderações deverão ser feitas para se tentar descobrir o que pode vir por aí.


  • Porquê deixaram o Jefferson falar tanto, quando ele devia se ater as respostas? Obviamente, o presidente da Comissão de Ética deixou;
  • O quê faz o Luiz Otávio nesta investigação?
  • Será que a Denise vai fazer o mesmo show que fez quando juíza e atrapalhou bastante o processo contra os bicheiros?
  • E Heloísa Helena vai à forra?
  • Será o Eduardo Paes o Goldman carioca?
    1. Enfim, dêem uma olhada na 'mesa'. Ou seria maca ?

      Presidente
      Delcídio Amaral – (PT / MS) (S)
      Vice-presidente
      Maguito Vilela – (PMDB / GO) (S)
      Relator
      Osmar Serraglio (PMDB-PR) (C)

      Demais integrantes:

      Câmara (C)
      ACM Neto (PFL / BA)
      Onyx Lorenzoni (PFL / RS)
      Eduardo Paes (PSDB / RJ)
      Gustavo Fruet (PSDB / PR)
      Álvaro Dias (PDT / RN)
      Nélio Dias (PP / RN)
      Nelson Meurer (PP / PR)
      Paulo Rocha (PT / PA)
      Fernando Ferro (PT / PE)
      Asdrubal Bentes (PMDB / PA)
      Fernando Diniz (PMDB / MG)
      José Múcio (PTB / PE)
      Sandro Mabel (PL / GO)
      Denise Frossard (PPS / RJ)

      Senado (S)
      César Borges (PFL / BA)
      Heráclito Fortes (PFL / PI)
      Demóstenes Torres (PFL / GO)
      Sérgio Guerra (PSDB / PE)
      Álvaro Dias (PSDB / PR)
      Heloísa Helena (PSOL / AL)
      Luiz Otávio (PMDB / PA)
      Wirlande da Luz (PMDB / RR)
      Ney Suassuna (PMDB / PB)
      Jefferson Peres (PDT / AM)
      Fernando Bezerra (PTB / RN)
      Ideli Salvati (PT / SC)
      Tião Viana (PT / AC)
      Aelton Freitas (PL / MG)

      Clique aqui para ver todas as figuras

      Dioguianas

      "A história que se repete é uma farsa"
      Karl Marx

      17 de jun. de 2005

      O fim da historia

      E lá vem as vestais
      Debord já escreveu como o espetáculo acaba com a História. Incrível, mas hoje o Merval escreveu que os partidos que incharam na gestäo tucana havia sido o PP e o PTB, esqueceu-se [comodidade talvez] que o PSDB entrou na camara como 3ª força e, logo depois, via Serjão, tornou-se a 2ª.

      A minha trincheira já estou cavando...

      Você conhece esta análise?

      As renúncias da esquerda em nome da Europa
      Não é de hoje que a utopia européia é pretexto para os socialistas franceses abrirem mão de sua plataforma política para atender aos interesses do capital
      Serge Halimi

      Transformação social ou recurso às “imposições européias”? Só uma reescrita conservadora da História levou a considerar como inédita uma questão que não o é. Mas não é recente o risco de uma coalizão entre as ambições da esquerda francesa e o ambiente internacional, que a incita a deixar de lado suas pretensões.

      O debate referente ao projeto de Constituição Européia reativou termos conhecidos. De um lado, aqueles que, preocupados em romper com a ordem liberal, perguntam: “Não é característico de qualquer empresa fixar objetivos antes de reunir todas as condições?” De outro, aqueles que não crêem mais na transformação da sociedade concluem: “E você poderá dizer tudo o que quiser aos empresários, e eu também. Eles irão sempre para onde houver a melhor produtividade, o melhor rendimento e o maior lucro”. A primeira citação provém do Projeto Socialista de 1980; a segunda teve como autor o homem que fizera desse projeto o arcabouço de seu programa presidencial. Entre as duas posições, a voluntarista e a desesperançada, treze anos se passaram – no final dos quais François Mitterrand, confrontado com a derrota eleitoral de seus amigos políticos, não podia fazer nada melhor do que teorizar sobre sua impotência.

      Em termos absolutos, a aposta de utilizar a Europa como uma alavanca para romper com a ordem existente na França não é incongruente. Segundo as palavras de Victor Hugo, se os “soberbos miseráveis” da Revolução Francesa ultrajaram outrora “o mundo ofuscado” das monarquias continentais, a França progressista, em contrapartida, soubera tirar proveito das análises do alemão Karl Marx sobre o Segundo Império, da ação do húngaro Léo Frankel, ministro do Trabalho durante a Comuna de Paris, da contribuição decisiva da Mão de Obra Imigrante (MOI) na formação dos primeiros grupos de resistência, da colaboração dos republicanos espanhóis para a ação clandestina desta última.

      Metamorfose européia
      Mas para além dessa História, falar de “solidariedades européias” serviu, em geral, para os socialistas franceses, como prelúdio – ou pretexto – para uma reviravolta conservadora1. Na década de 1930, a aliança franco-britânica levou a Frente Popular a contradizer suas ambições econômicas e a abandonar a República espanhola. No imediato pós-guerra, “a Europa” tornou-se a utopia substituta que permitiu disfarçar renúncias fundamentais, políticas e estratégicas. Mais próximo de nossa realidade, ela serviu de instrumento para a redefinição filosófica do projeto da esquerda, de “máquina para arrefecer as paixões nacionais2”. Inclusive quando os socialistas simulam entrever por trás de um “mercado em que a concorrência é livre e não falsa” a “construção de espaços de regulação que se juntam aos Estados-nações para controlar as turbulências do capital3”.

      Em geral, a evolução da esquerda governamental aderiu a de uma Comunidade Européia cada vez mais preocupada em proteger o “capital” das “turbulências” da reivindicação social. Essa dupla metamorfose, nacional e européia, enfatiza a dificuldade própria a qualquer comparação histórica: ao longo dos anos, as palavras “esquerda”, “direita”, “concorrência”, “regulação” mudaram de sentido4. No ponto de partida, o liberal tem de ser contido; no ponto de chegada, o socialismo se converteu.

      Tomemos dois exemplos simétricos. Raymond Barre, tradutor em 1956 dos textos do economista austríaco ultraliberal Friedrich Hayek, tornou-se, onze anos depois, vice-presidente do Comissão Européia. Seu mandato em Bruxelas, que coincidia com grandes greves operárias na França (1968) e na Itália (1969), proibiu-o, no entanto, como a qualquer outro, de se inspirar nas idéias de Hayek, a menos que recorresse a uma enérgica resposta social. Mas, de forma inversa, quando a contra-revolução liberal impôs seu ritmo, o socialista Jacques Delors foi um de seus arquitetos no ministério da Fazenda francês (1981-1984) e depois na presidência da Comissão Européia (1985-1994). E iria poder se gabar de ter, em Paris, “obtido a supressão da indexação dos salários sem nenhuma greve”.

      A opção da Frente Popular
      Algumas semanas atrás, preocupado com a força do movimento de oposição ao projeto de Constituição, o historiador conservador René Rémond lamentava que “a utopia revolucionária” estivesse “matando a utopia européia5”. Provavelmente o inverso o teria incomodado menos. E foi o que ocorreu em várias ocasiões.

      Em 1936, o governo de Léon Blum6 pretendeu tirar a economia francesa de uma depressão que os socialistas analisaram em termos keynesianos: “Esta crise é provocada por uma ruptura de equilíbrio entre a produção e a capacidade aquisitiva geral”. Apoiado em uma política de retomada orçamentária, o aumento dos salários, consecutivo às grandes greves de junho de 1936, deveria, segundo eles, contribuir para o incentivo da atividade e a diminuição do desemprego. Mas o êxito de semelhante estratégia exigiria uma desvalorização imediata do franco e um controle cambial.

      A prioridade concedida à aliança britânica conduziu a Frente Popular a renunciar a isso. Um especialista influente, Emmanuel Monick7, apresentou a Léon Blum a arbitragem que lhe competia nos seguintes termos: “Das duas uma: ou o senhor instaura o controle do câmbio, impõe um dirigismo estrito e põe a França em regime autárquico – e então o senhor será obrigado a instituir um regime autoritário, que pode evoluir para o totalitarismo; ou o senhor abre as fronteiras, mantém um regime de liberdade cambial, e deve então buscar o apoio de Londres e Washington para operar um ajuste das moedas, ao mesmo tempo que uma coalizão dos regimes democráticos.” 8 Totalitarismo solitário ou democracias solidárias: tal “opção” – como aquela, idêntica, que surgiu em março de 1983 – não permite muita hesitação...

      Esta opção iria tirar a possibilidade de ação da Frente Popular. Os efeitos deflacionistas de uma moeda supervalorizada anulam o incentivo previsto com uma retomada da demanda. E quando a desvalorização ocorre apesar de tudo, é muito pouco e tarde demais: Léon Blum aceitou negociar sua taxa e as medidas que a acompanhavam com os britânicos e os norte-americanos. Apesar de uma fuga maciça de capitais, Blum renunciou também ao controle do câmbio, que, no entanto, constava do programa da esquerda. Era, segundo ele, um sistema “que, além de qualquer outra razão, o governo considera incompatível com as afinidades e as necessidades de sua política internacional”. Os conservadores britânicos obtiveram o que queriam. Iriam exigir, pouco depois, que a “coalizão dos regimes democráticos”, elogiada por Emmanuel Monick, abandonasse ao fascismo a Espanha republicana.

      Modelo francês de economia
      No imediato pós-guerra, uma “construção da Europa”, poderosamente incentivada pelos Estados Unidos, uniu os socialistas a coalizões de “terceira força” pouco empenhadas na preocupação com o progresso social. No entanto, instruída por seus dissabores anteriores, a esquerda francesa (inclusive os comunistas) criou ou corroborou, a partir de 1945, instrumentos de intervenção pública (controle da moeda, do crédito, das “altas da economias”) destinados a lhe permitirem não depender sempre da boa vontade do capital. Segundo as palavras do general De Gaulle, o contexto da época, “social ou socialista”, permitiu que essas transformações fossem “realizadas sem sobressaltos. É claro que os privilegiados as receberam melancolicamente. Alguns chegam a fazer censuras secretas que ficam para mais tarde. Mas, por enquanto, todos, avaliando a força da corrente, logo se conformaram com ela e ainda mais facilmente na medida em que temiam que coisas muito piores pudessem acontecer” 9.

      Porém, esse “mais tarde” chegaria muito depressa... A necessidade de créditos norte-americanos, vindo respaldar o “programa europeu” que os Estados Unidos apoiavam, esvaziou de suas potencialidades socialistas as transformações provenientes da Libertação. Teria, então, sido um fracasso total? Não, pois simultaneamente foi construído esse “modelo francês” de economia mista atualmente atacado pelos liberais. No entanto, se quase todos foram intervencionistas em 1944-1947, para uns, o Estado devia substituir um sistema capitalista a um só tempo ineficaz e socialmente injusto; para outros, o papel do poder público consistia em incentivar a energia do setor privado, e não em substituí-lo, por mais tempo do que o necessário.
      Simultaneamente comissário do Plano e “homem dos norte-americanos”, Jean Monnet, encarnava a segunda escola de pensamento. Longe de ter como projeto uma França socialista, o “Pai da Europa”, entrevia sobretudo uma situação em que, como nos Estados Unidos, os capitalistas estariam imbuídos do dinamismo conferido pelo espírito empreendedor. Apoiados nos créditos do Plano Marshall, o Estado e o projeto europeu deveriam, segundo ele, sacudir um patronato nacional conservador e não proceder à redistribuição do poder econômico10.

      Reviravolta liberal dos socialistas
      A análise de Monnet encontrou seguidores na esquerda reformista. É claro que o partido socialista SFIO (Seção Francesa da Internacional Operária) dava a impressão de imaginar, na época da Libertação, que “os acontecimentos iriam impor à Europa a adoção da via do socialismo”. Mas, a partir de 1950, Léon Blum admitiu que uma “intervenção ativa do Estado” poderia também, como nos Estados Unidos, regenerar utilmente o sistema vigente: “Enquanto a lei do capitalismo norte-americano é: ‘Permitir que nasçam jovens empresas’, parece que a lei do capitalismo francês é: ‘Permitir que empresas antigas não morram”. Trinta anos mais tarde, Lionel Jospin dá a impressão de repercutir essas idéias: “A França não tem uma classe de patrões à altura de sua capacidade e de suas ambições. É um dado de sua história. Enfraquecer o setor público, deixar o comando à parte mais retrógrada do patronato – que tudo embolsa, mas não solta nada – não criará confiança nem dinamismo.”

      Só progressivamente seria preciso optar entre o objetivo de uma “modernização” impulsionada pelos poderes públicos (empresas nacionalizadas, política do crédito) e o de um nivelamento por pressão da concorrência européia. Tanto uma via como a outra pareciam, na verdade, apoiar-se mutuamente até o dia em que o dogma liberal se radicalizasse. “A Europa” não continuou a obrigar a privatizar, nem a fazer pressão sobre as conquistas dos assalariados. Os Estados Unidos também não: empresas nacionalizadas (Charbonnages, SNCF, EDF) fizeram parte do número dos principais beneficiários do Plano Marshall; por preocupação em conter o comunismo no Velho Continente, Washington deplorou – vários anos depois da guerra – a lamentável sorte reservada à classe operária francesa.

      A partir de 1947, a necessidade de créditos norte-americanos, a Guerra Fria e as aventuras coloniais destruíram qualquer perspectiva de um governo de esquerda na França. A partir de então, aliada ao centro-direita, a SFIO lançou-se a um discurso “europeu”, destinado a embelezar uma política interna anti-social e uma subordinação atlântica no exterior. O final da década de 1940 prenunciava, portanto, um pouco a tendência direitista que iria ocorrer em 1983, dois anos depois da eleição de François Mitterrand para presidente. Desta vez, corroborada pelo aburguesamento de sua base social, a reviravolta liberal dos socialistas parecia consumada.

      Nova cartilha dos socialistas
      Segundo uma análise convencional, a esquerda teria, em 1981, cometido um terrível equívoco ao implementar um programa radical que ignorava a extensão da imbricação da França na economia internacional. Esse erro teria sido prontamente traduzido por uma série de crises financeiras (déficits, desvalorizações). Estas crises teriam obrigado os socialistas a voltarem o mais rápido possível para o caminho das políticas de “rigor”, adotadas por seus predecessores conservadores (Giscard d’Estaing e Barre) e por seus parceiros europeus (Helmut Kohl e Margaret Thatcher).

      Na verdade, essa reconstituição é parcialmente inexata. Pois a esquerda não esperou 1983 para compreender que a interdependência econômica poderia derrubar uma política solitária de “ruptura com o capitalismo”. Segundo ela, um país que adotasse uma política de retomada do crescimento deveria “poder tirar vantagem da necessidade de limitar um aumento sem limite [das importações] que impediria o reinício de sua expansão”.

      A concorrência e a especialização estavam condicionadas a um resultado: “A liberdade comercial não é um dogma. É um meio que se justifica na medida em que contribui para o crescimento e para mais empregos, e não, quando seu efeito é propagar alternadamente ou a um só tempo a inflação, a deflação e o desemprego11.” Finalmente, a “reconquista do mercado interno” impunha que o controle monetário fosse menor: “No âmbito europeu, o Partido Socialista não pode aprovar o salário atual, ou seja, o alinhamento das moedas mais fracas pelo marco alemão, que, esperando um novo ataque catastrófico, justifica uma austeridade reforçada”.

      A utopia de reposição
      A maioria dessas orientações comerciais e monetárias, no entanto, foram deixadas de lado por François Mitterrand no próprio dia de sua posse12. Cita-se aqui o parecer dado por Emmanuel Monick em 1936, uma vez que, segundo o próprio Jacques Delors, a opção de 1981 (confirmada dois anos mais tarde) se explicou em parte pelo desejo de não ameaçar a “correspondência necessária entre a política econômica do presidente da República e sua política externa”. Ou seja, seus “esforços para retomar a construção européia”.

      Depois de 1983, o projeto de “ruptura com o capitalismo” foi enterrado. Assim como na década de 1950, a temática “européia” serviu-lhe de utopia de reposição. No entanto, devido ao encaminhamento abertamente liberal e de livre mercado adotado pela construção comunitária, a reviravolta do “rigor” não pode somente representar o refúgio de uma estratégia socialista em posição de inferioridade. Deveria se tornar o prelúdio de sua rejeição definitiva. Muitos dos instrumentos nacionais forjados no passado pela esquerda francesa, a fim de equilibrar o poder do capital (controle democrático da política monetária, dos investimentos, papel dos serviços públicos) seriam, aliás, destruídos por ela no altar do grande mercado.

      Antecipando, desde junho de 1982, a reviravolta dos socialistas franceses, Pierre Rosanvallon apresenta as imposições daquilo que ainda era chamado de “mundialização”: “Numa economia aberta, a margem de manobra é estreita. Não se trocam apenas bens e serviços; são inevitavelmente políticas econômicas que se acaba também por ser obrigado a importar13.” Ora, para Rosanvallon e seus amigos moderados, não convinha sobretudo reduzir a restrição exercida por uma “economia aberta” sobre uma aspiração à mudança da sociedade. Era necessário, ao contrário, ratificar a estreiteza da margem de manobra dela decorrente. Ela proibiria os governantes de esquerda de “fazerem bobagens”, ou, com outras palavras, de permanecerem fiéis a um programa que procurava conter a dominação do capital. A armadilha do comércio internacional iria mesmo, esperava Rosanvallon, precipitar o “fim da exceção francesa” cuja morte ele constataria, em 1988 – um pouco prematura? –, com dois de seus amigos da Fundação Saint-Simon14.

      “Não há alternativa”
      Em setembro de 1989, Michel Rocard procederia a outros funerais. Primeiro-ministro na época, ele enterrou as esperanças de uma Europa social que seu partido acalentara por muito tempo: “Temos uma maioria de governos conservadores na Comunidade. Eles pensam que a melhor maneira de fazer expansão é deixar as pessoas ganharem dinheiro de qualquer forma, praticamente não taxar o capital e seus rendimentos15.” Sua conclusão? “As regras do jogo do capitalismo internacional sancionam toda política social audaciosa. É preciso assumir as regras desse jogo cruel para construir a Europa16.” Algumas semanas mais tarde, a queda do muro de Berlim trouxe uma justificativa retrospectiva aos dirigentes recentes da esquerda do governo. Eles poderiam, a partir de então, retomar, mas sob a forma da desolação fingida, o grito de vitória de Margaret Thatcher: “Não há outra alternativa”.

      O socialista Pascal Lamy acaba de ser designado diretor geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), ou seja, policial da ordem liberal internacional. Anteriormente ele fora conselheiro do primeiro-ministro Pierre Mauroy, depois de Jacques Delors, na Comissão Européia, e finalmente dirigira um grande banco em vias de ser privatizado. A mutação parece terminada. E, no livre comércio professado por Pascal Lamy, o internacionalismo progressista pesa menos do que o fechamento de um espaço mercantil que saberá impor à sociedade regras favoráveis aos empregadores: “Os empresários franceses são europeus, porque compreenderam que a reordenação e a ‘mercantilização’ da economia francesa foram feitas pela Europa, graças à Europa e por causa da Europa17.” Seja promessa de liberdade, de abertura, de mestiçagem, seja proclamação de impotência em transformar a ordem social, a “globalização”, a “Europa” (pouco a pouco despojada de todas as suas proteções comunitárias) construíram uma máquina de guerra que permitiu desfazer o contrato social “sem dar um tiro”, manipular o sentimento internacionalista para favorecer as solidariedades do capital, reivindicar a defesa do “encanador polonês” para impor que vença o mais barato, falar insistentemente na existência de “imposições internacionais” para ocultar que a pressão delas foi aumentada por uma vontade e por políticas18.

      Esse discurso da fatalidade fingida e essa pedagogia da submissão são uma característica permanente da História. O imprevisível sucesso do 29 de maio francês não basta para reverter a devastação social que elas impuseram ao mundo. Mas desde que uma tal vitória possa encorajar novas ofensivas, ela já abre a perspectiva de novas surpresas.
      (Trad.: Regina Salgado Campos)
      1. Ler de Anne-Cécile Robert, “La gauche dans son labyrinthe”, Le Monde diplomatique, maio de 2005.
      2. Conforme a expressão de Bernard-Henri Lévy, que aceitou fazer uma declaração ao Monde, 28 de maio de 2005.
      3. Ler, de François Hollande, “Les transformations du capitalisme”, La Revue socialiste, abril de 2005.
      4. Cf. Frédéric Lordon, “L’Europe concurrentielle, ou la haine de l’Etat”, http://econon.free.fr/Lordonhtml.html
      5. Le Monde, 6 de maio de 2005.
      6. Cf. Quand la gauche essayait, Arléa, Paris, 2000.
      7. Adido financeiro da embaixada da França em Londres, ele viria a ser dirigente do Banque de France na libertação.
      8. In Jean Lacouture, Léon Blum, ed. Le Seuil, Paris, 1977, p. 325.
      9. Ler, de Charles De Gaulle, Mémoires de guerre, le salut, ed. Plon, p. 121. Mesmo uma pequena formação centrista, a União Democrática e Socialista da Resistência (UDSR), declarava então o fim da “burguesia triunfante”, “enterrada no passado”.
      10. Cf. Quand la gauche essayait, ed. Arléa, Paris, 2000.
      11. Parti socialiste, Projet socialiste, ed. Club socialiste du livre, Paris, 1980, pp.222-224.
      12. Segundo as próprias declarações de seu primeiro-ministro na época. Ler, de Pierre Mauroy, C’est ici le chemin, ed. Flammarion, Paris, pp.17-28, e Quand la gauche essayait, op. cit.
      13. Ler, de Pierre Rosanvallon, “Le choc déflationniste et après”, Libération, 23 de junho de 1982.
      14. Ler, de Jacques Julliard, Pierre Nora e Pierre Rosanvallon, La fin de l’exception française, ed. Calmann-Lévy e Fundação Saint-Simon, Paris, 1988.
      15. Le Point, 4 de setembro de 1989.
      16. Citado por L’Humanité, 23 de outubro de 1989.
      17. Ler, de Pascal Lamy, “Le modèle français vu d’Europe”, Le Débat, Paris, n. 134, março-abril 2005.
      18. Cf. Le Grand bond en arrière: Comment l’ordre libéral s’est imposé au monde, ed. Fayard, Paris, 2004.

      Dioguianas

      Vestal
      O FH parece que engana quem ao afirmar que não quer que tudo pegue fogo. Como se não estivesse derramando a gasolina há muito...

      Impeachment No!
      A oposição não quer o impeachment pelo simples fato que se Lula sair agora quem assumirá será o Zé Alencar. Ministro da defesa, contra os banqueiros, contra os EUA e com muita disposição.

      Na torcida
      Espero que o governo e, por consequência, o PT consigam dar a volta por cima.

      Pensamento do dia
      Por mais críticas que sejam a situação e as circunstâncias, não aceite o desespero; nas ocasiões em que tudo leva ao medo, não se deve ter medo de nada; quando se está rodeado de perigos, não se deve temer perigo algum; quando já se esgotaram os recursos, deve-se contar com todos os recursos; quando se é surpreendido, deve-se surpreender o próprio inimigo. (Sun Tsé)

      16 de jun. de 2005

      Veritas

      Arquivo X do Golpe
      por Bruno de Assis Pessoa - brap@uol.com.br
      Como PSDB, Veja & CIA articulam segundo golpe de estado em sete anos. Uma história de assassinatos, corrupção, abuso de menores e roubo.

      Como ocorre ciclicamente, inicia-se a fase final de mais um golpe de Estado na América Latina, desta vez destinado a depor o presidente Luís Inácio Lula da Silva, legitimamente eleito pelo povo brasileiro. A exemplo do que ocorreu no Chile, em 1973, os neoliberais da elite pseudo-intelectual, os donos de latifúndios, os empresários da "imprensa" falida e os serviços de inteligência norte-americanos, preparam a derrubada do ex-metalúrgico Lula.

      Os métodos do golpe, entretanto, se sofisticaram. Se Allende foi assassinado por projéteis de fogo, Lula está sendo envenenado por uma bem estudada campanha de desqualificação. Curiosamente, os "crimes" que lhe são atribuídos constituem-se em práticas criadas e mantidas por seus próprios inimigos. O grupo de ataque ao governo foi apelidado de Grupo Rio. Não se trata de uma homenagem ao Estado, mas de uma referência à Rua Rio de Janeiro, em Higienópolis, residência do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. O luxuoso e requintado apartamento foi palco das primeiras reuniões que traçaram a estratégia para o golpe de Estado. Na primeira assembléia, reuniram-se 13 pessoas. Na segunda, foram 19, incluindo um norte-americano que chegou num carro do consulado dos EUA em São Paulo. Depois do encontro, vários seguiram para uma casa de prazeres eróticos na Avenida Bandeirantes, nas imediações do aeroporto de Congonhas.

      Em Português trôpego, o tal "gringo" teria falado mais sobre o presidente venezuelano Chavez do que sobre o plano para apear Lula do poder. A frase paradigmática de FHC neste dia teria sido: "É preciso paciência para desequilibrar, aos poucos; arrancar cada dedinho do pé do sátiro". Alguns bateram palmas para aplaudir a frase mal construída, mas que definia o projeto de ação do grupo, que FHC (pretendendo-se galhofeiro) preferiu chamar de "célula Sorbonne". Aliás, quando regado a bom vinho, o ex-presidente adora atribuir apelidos a seus desafetos: José Sarney é o "Morsa", Itamar é o "Costinha" e Ciro Gomes é o "Parasita".

      Decidiu-se que tanques e canhões seriam substituídos por papel impresso e telas iluminadas. Poderosos senhores da comunicação foram chamados a integrar o grupo. Nessa época, o setor já vivia uma grave crise, com empresas atoladas em dívidas com bancos, à beira da insolvência. Os que não haviam se arrumado com o novo governo tinham a chance de receber polpudas contribuições de apoiadores externos. Os aliados de primeira hora foram Roberto Civita, da Editora Abril, e a chamada banda podre da família Mesquita, os descendentes de Ruy Mesquita.

      O falido e o ladrão doméstico
      A idéia era destacar o clã Mesquita para uma luta prévia, destinada a desacreditar a prefeita Marta Suplicy. Os jornais da casa deveriam criar "pautas" para que o resto da imprensa corroesse a popularidade da prefeita. O projeto era fincar a bandeira do Grupo Rio em São Paulo a partir da eleição de José Serra. Civita teria como incumbência fomentar uma ação nacional por meio da revista Veja. Civita e FHC mantêm antiga amizade. O grupo do ex-presidente ajudou a criar o modelo de ideologia que é propagada pela revista, uma colorida e didática cartilha neoliberal. Civita é conhecido por sua língua afiada e descontrolada. Certa vez, numa reunião com executivos do grupo, chamou Pelé de "negrinho do pastoreio". Em outra ocasião, disse que a ex-ministra Erundina era "uma gabirua que fedia a merda".

      As histórias de Veja misturam roteiros de filmes sobre a Máfia com bizarrias hard-core. Durante muitos anos, o feitor de Civita em Veja foi o truculento Eduardo Oinegue Faro, uma espécie de Jason Blair brasileiro, capaz de "fazer (ou inventar) qualquer negócio", seja para vender revista ou para destruir uma personalidade pública. Exagerado em suas doses, Oinegue foi transferido para a revista Exame. Há poucos meses, o "padrinho Civita" sofreu ao saber que seu pupilo o estava roubando, exatamente conforme nos roteiros dos filmes sobre a Cosa Nostra. Oinegue Faro estava embolsando mais de um milhão de Reais em negócios inescrupulosos com um lobista. Triste fim para uma história de confiança na "famiglia".

      O jornalista que tinha um "pepino" a resolver
      O redator-chefe de Veja é outro protagonista de casos escabrosos. Depressivo crônico, tem fixação doentia pelo tema solidão. Vítima de impulsos suicidas, julga-se inferior e não devidamente reconhecido. Parte de sua conduta patológica gerou um livro interessante e revelador: o Antinarciso. Certa manhã, a secretária de Veja recebeu um telefonema insólito de Sabino, que estava num hotel fubango no centro de São Paulo. A dedicada funcionária teve de se desdobrar para encontrar um proctologista do hospital Albert Einstein. Foram três horas de angústia até que o especialista chegasse ao quarto 62. Quem quiser, pode checar. Mais uma eternidade até que o enorme pepino pudesse ser extraído do reto do jornalista.

      Assassino pago em ouro
      No caso do Grupo Estado, é de se admirar que a família tenha recorrido aos serviços de consultoria de um ex-funcionário para desenvolver seu plano de ação. O escolhido foi Antonio Marcos Pimenta Neves, ex-chefão do jornal O Estado, amante rejeitado que, em 2000, assassinou na ex-namorada, a também jornalista Sandra Gomide. Por quê? Porque Pimenta Neves sempre manteve uma relação de amizade com Fernando Henrique Cardoso. Aliás, o crime aconteceu exatamente em Ibiúna, município a 70 quilômetros de São Paulo, onde o ex-presidente tem uma de suas casas de campo.

      Violador de crianças
      Entre os articuladores políticos do golpe, a liderança da tropa de choque coube ao senador amazonense Arthur Virgílio, um homem que se confessa atraído pelo submundo. Virgílio é um alegre freqüentador de bordéis e tem queda por "carnes novas". O líder do PSDB foi o carrasco da CPI da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. Graças a sua dedicada (e desesperada) atuação, o vice-governador do Amazonas, Omar Aziz (PFL), escapou da Justiça.

      Os relatórios da comissão mostravam que Aziz era também cliente de uma rede de prostituição envolvendo adolescentes de até 16 anos. Em Manaus, o comparsa de Virgílio participava de um esquema de aliciamento de menores com a conhecida cafetina Cris. Os depoimentos da CPI traziam o depoimento de uma mãe que comprovava a exploração sexual de sua filha de 14 anos. Na época, Virgílio tentou negar que também tivesse presenteado a menina com jóias e dinheiro.

      Espancador de mulheres
      No Grupo do Rio, a alta intelectualidade está representada também por José Arthur Gianotti, uma espécie de Maquiavel tupinambá, cuja função é fornecer ao amigo FHC pílulas filosóficas que previnam contra eventuais crises de consciência. Gianotti é o homem das éticas relativas, o dourador de fins que justifiquem qualquer meio ignominioso de busca do poder. Homem de estresses e ego inflado, é daqueles que não admitem refutações, características conhecidas de seus "colegas" de Universidade de São Paulo. Anos atrás, durante um debate com a esposa, irritou-se e a espancou. A mulher acabou perdendo parcialmente a audição de um ouvido. De suas histórias escabrosas, esta é a que mais se ouve nos corredores da USP.

      O mesmo ocorreu com os casos de suborno contidos na chamada Pasta Rosa. O então Procurador-Geral, Geraldo Brindeiro, recorreu ao jeitinho brasileiro para engavetar as denúncias. Agora, o que mais espanta foi a complacência da imprensa com a compra de votos para a mudança da Constituição que permitiu a reeleição de FHC. João Maia e Ronivon Santiago, Zila Bezerra, Osmir Lima e Chicão Brígido eram apenas a ponta do iceberg de um gigantesco sistema de corrupção gerenciado pelo PSDB. Como sempre, a imprensa diminuiu a importância dos fatos, na mesma medida em que exagera qualquer irregularidade no governo Lula.


      Como comprar um jornalista a preço de banana
      Em todas essas ações, a CIA deu total apoio a seus parceiros do governo tucano (o governo do Apagão), inclusive com municiamento financeiro. Jornalistas e políticos foram comprados em verdadeiras operações de guerra, numa reedição das PP e Kukage, nas quais as ações jamais são atribuídas ao governo norte-americano, mas a outros grupos ou instituições. Muitas dessas ações são tão escancaradas que não exigem qualquer sigilo, conforme admite o ex-chefe do FBI no Brasil, Carlos Costa, em suas entrevistas a Carta Capital. As sedes do poder, em Brasília, estão grampeadas e os Estados Unidos monitoram o Brasil 24 por dia.

      Um bilhete deixado na mesa de reunião do Grupo Rio estampava uma lista de formadores de opinião que deveriam ser convencidos a receber "suporte" do grupo externo. Alguns dos 31 (sobre) nomes eram: Rodrigues, Noblat, Gancia, Carmo, Fibe, Nunes, Alencar, Casoy, Marques, Schwartsman e Cony. A base para as ações de flerte seriam fornecidas pelos senhores Mac-Laughlin , Wilkinson e Rohter.


      A farsa de Maurício Marinho
      Nem o mais ingênuo dos corruptos recebe pagamentos em sua sala de trabalho, em bolos semelhantes àqueles manuseados por donos de postos de gasolina. Maurício Marinho, que é esperto demais, vendeu-se como ator e não como facilitador. Afinal, a "bola" é pequena demais para quem corre tanto risco.

      Depois que a poeira baixar, MM certamente vai desfrutar de seu verdadeiro butim. Quem vê a fita com atenção, percebe que os atores estão mal treinados.


      Assassinato de Luis Eduardo Magalhães: o primeiro golpe de Estado do Grupo Rio – 1998
      O Grupo Rio não estava oficialmente constituído naquela época, mas seu núcleo duro já existia. À época, estava morrendo o velho "Serjão", gerente de todo o sistema de corrupção e coleta de propinas do PSDB. Simultaneamente, uma nova estrela despontava no firmamento político: Luís Eduardo Magalhães. Segundo os analistas do governo, LEM tendia a se tornar um candidato imbatível nas eleições presidenciais. Além disso, o deputado confessara a amigos que no momento certo desbarataria a quadrilha que disseminava a corrupção por Brasília.

      Morto "Serjão", temeu-se que LEM desencadeasse uma pronta ação de limpeza no legislativo. Nesse momento, a articulação entre o governo e seus parceiros externos mostrou-se eficaz. A "inoculação" teria ocorrido, morbidamente, durante os serviços fúnebres do corruptor-mor. Os requintes da operação incluíram a prescrição de uma dose que permitisse a morte num 21 de Abril. A sofisticação simbólica tinha um motivo: uma assinatura sinistra. O serviço de assassinato encomendado a Newton Cruz por Maluf, em 1985, fora repassado a outro grupo. Tancredo Neves, assassinado, viria a morrer também num 21 de abril.

      Opinião
      "No governo tucano, a denúncia do mensalão não teria provocado grandes marés". O fantasma dos militares não existe, mas nas últimas colunas que escreve para o jornal Valor Econômico, publicadas às quintas-feiras, ele farejou um "golpe branco" contra Lula no movimento da oposição e, principalmente, do PSDB. Pró-reitor da Universidade Candido Mendes, Wanderley Guilherme dos Santos chegou a ironizar os tucanos, resgatando a imagem de Carlos Lacerda, um político que andava sempre com uma proposta de golpe na cabeça: "O lacerdismo mudou-se para São Paulo", escreveu, após pensar sobre a frase do ex-presidente Fernando Henrique de que havia uma "crise institucional" no País.

      Nesta entrevista a CartaCapital, ele explica a crise pela missão político-eleitoral dos tucanos de algemar o governo para enfraquecer a candidatura Lula em 2006. Diz que, para alcançar esse objetivo, o PSDB chegou a pensar em um "golpe branco", o impeachment, a partir das denúncias de corrupção. Mas recuou. Acredita que o partido não promoverá a iniciativa, mas, se ela surgir, apoiará. Ou seja, se o cavalo passar arriado, o ex-presidente Fernando Henrique montaria. CartaCapital: Há uma crise política grave neste momento? Wanderley Guilherme dos Santos: A palavra crise entrou no vocabulário diário da política desde janeiro de 2003. Falou-se de crise todos os dias. Agora, sim, há uma crise política. É uma crise importante. Mas é uma crise normal em sistemas democráticos funcionando, operando. Quer dizer, democracia com uma oposição musculosa como não havia, por exemplo, no governo Fernando Henrique. (leia o post abaixo com a entrevista completa de Wanderley Guilherme dos Santos)

      14 de jun. de 2005

      Golpe Branco de Bico Comprido

      FHC APOIARIA “GOLPE BRANCO”
      "No governo tucano, a denúncia do mensalão não teria provocado grandes marés"
      Para Wanderley Guilherme dos Santos, o PSDB não quer o impeachment de Lula, mas não recuará se houver essa possibilidade
      Por Maurício Dias


      O cientista político Wanderley Guilherme dos Santos é um dos mais renomados e respeitados acadêmicos do País. Na extensa lista de trabalhos publicados por ele, um, especialmente, virou referência bibliográfica. No calor das lutas políticas do início dos anos 60, ele escreveu um livro – Quem Vai Dar o Golpe no Brasil – que prenunciou a derrubada do presidente Goulart em 1964. Ele farejou o golpe militar.

      O fantasma dos militares não existe, mas nas últimas colunas que escreve para o jornal Valor Econômico, publicadas às quintas-feiras, ele farejou um “golpe branco” contra Lula no movimento da oposição e, principalmente, do PSDB. Pró-reitor da Universidade Candido Mendes, Wanderley Guilherme dos Santos chegou a ironizar os tucanos, resgatando a imagem de Carlos Lacerda, um político que andava sempre com uma proposta de golpe na cabeça: “O lacerdismo mudou-se para São Paulo”, escreveu, após pensar sobre a frase do ex-presidente Fernando Henrique de que havia uma “crise institucional” no País.

      Nesta entrevista a CartaCapital, ele explica a crise pela missão político-eleitoral dos tucanos de algemar o governo para enfraquecer a candidatura Lula em 2006. Diz que, para alcançar esse objetivo, o PSDB chegou a pensar em um “golpe branco”, o impeachment, a partir das denúncias de corrupção. Mas recuou. Acredita que o partido não promoverá a iniciativa, mas, se ela surgir, apoiará. Ou seja, se o cavalo passar arriado, o ex-presidente Fernando Henrique montaria.
      CartaCapital: Há uma crise política grave neste momento? Wanderley Guilherme dos Santos: A palavra crise entrou no vocabulário diário da política desde janeiro de 2003. Falou-se de crise todos os dias. Agora, sim, há uma crise política. É uma crise importante. Mas é uma crise normal em sistemas democráticos funcionando, operando. Quer dizer, democracia com uma oposição musculosa como não havia, por exemplo, no governo Fernando Henrique.

      CC: Oposição mais forte...
      WGS: Agora tem. Não tinha imprensa contra, agora tem. Vivemos um período democraticamente muito mais vivo do que no governo passado. A oposição agora é uma oposição forte. Tem capacidade de agitar e criar problemas e de interferir na agenda política. Por conseqüência, a maioria da imprensa está com a oposição.

      CC: O PT, na oposição, não tinha essa força?
      WGS: De maneira nenhuma. O PT mobilizava, no máximo, 140 deputados durante todo o período. Se o PT tivesse o poder oposicionista que tem hoje a oposição a Lula, o então presidente Fernando Henrique Cardoso não teria aprovado 21 emendas constitucionais.

      CC: O senhor quer dizer que a imprensa não oferecia aos petistas a receptividade que oferece agora à oposição tucano-pefelista?
      WGS: Não havia essa simpatia. Isso dá uma outra moldura ao conflito, à disputa democrática. Ela fica mais elétrica e torna maior a possibilidade de se ter crises políticas. Existe uma crise importante agora.

      CC: E qual a razão dela?
      WGS: Ela não tem uma única causa. Não se trata apenas da causa dos interessados mais evidentes que são os próprios políticos. Aqueles que, num contexto de crítica, têm aumentado o seu poder de barganha, o peso ponderado deles dentro das negociações. Para os políticos de oposição esse é um momento muito importante. Interessa a eles que a crise seja caracterizada como tal: uma crise. Ou seja, o governo está em débito em relação a uma agenda de questões e de perguntas. Por outro lado, é verdade também que se essa denúncia do mensalão tivesse sido feita durante o governo Fernando Henrique não teria provocado grandes marés...

      CC: Por quê?
      WGS: Primeiro, porque é uma denúncia genérica. Há pagamentos mensais feitos pelo tesoureiro do partido do governo etc. etc. Isso se disse à vontade do Sérgio Motta em situação muito mais complicada, que foi o processo de aprovação da reeleição. E não aconteceu nada porque a oposição não tinha capacidade de fazer acontecer, não tinha grandes políticos querendo fazer acontecer e não tinha a imprensa querendo fazer acontecer. E, assim, não aconteceu. E isso envolvia uma figura chamada Sérgio Motta. O deputado Roberto Jefferson tem um currículo que, por si só, não transfere credibilidade e peso às declarações. Sobretudo em declarações dessa generalidade. Dessa forma, é claro que a questão não está nem no conteúdo da declaração nem em quem declarou. Mesmo que seja verdade, embora não seja fato provado ainda, não foi isso que moveu os interessados. Foi outra coisa.

      CC: Ou seja, embora a denúncia tenha sido genérica e falte ao denunciante a necessária credibilidade, logo criou-se um terremoto...
      WGS: Portanto, há outras linhas de causalidade além do interesse do deputado Jefferson de se defender e de envolver outras pessoas. Outra causa da crise me parece ser o temor que o PSDB tem de Anthony Garotinho. O pavor do PSDB é que o segundo turno seja com o Garotinho e não com o candidato do PSDB. A transformação da ética na política como divisor de águas, entre maioria e minoria no País, se bem-sucedido, derrota Garotinho. Entretanto, se não for, o eventual decréscimo eleitoral da situação cai no colo de Garotinho. Independentemente de Garotinho, há interesse de o PSDB macular a imagem do Lula. Desde janeiro de 2003 temos tido sucessivas rodadas de denúncias nos jornais acompanhadas de uma pesquisa...

      CC: Uma tentativa de linchamento político?
      WGS: Não, não chega a isso. São manobras identificáveis. Há sempre um caso: Waldomiro Diniz, a eleição para a presidência da Câmara, o cadastramento no Fome Zero. As pesquisas feitas na seqüência indicavam que, no entanto, a imagem do presidente não era afetada. Isso tem sido desesperador para a grande imprensa...

      CC: Qual o interesse dela?
      WGS: A democracia em países em desenvolvimento só fica efetivamente consolidada quando dispensar a imprensa, quando o que a imprensa quiser for irrelevante para a estabilidade do governo. A imprensa é um ator importante no que diz respeito à estabilidade do governo em países em desenvolvimento, como o Brasil.

      CC: O senhor se refere à capacidade de formar marolas?
      WGS: Marolas, não. Grandes furacões. A grande imprensa levou Getúlio ao suicídio com base em nada; quase impediu Juscelino de tomar posse, com base em nada; levou Jânio à renúncia, aproveitando-se da maluquice dele, com base em nada; a tentativa de impedir a posse de Goulart com base em nada. A grande imprensa em países em desenvolvimento é a grande porca das instituições, a grande emporcalhada.

      CC: A imprensa é assim ou ela está assim?
      WGS: A imprensa não é assim. Ela é assim num certo período dos países. Ela foi assim nos EUA, na Inglaterra, e não é mais. Isso não quer dizer que não haja a imprensa porca e, sim, que a grande imprensa deixou de ser porca. Não é o caso do Brasil. Isso é importante ficar registrado, porque na medida em que passa o tempo a gente esquece. Quando aconteceu em 1954 a gente deixou passar, assim como deixou passar em 1961. Então, não pode deixar passar, não. A imprensa levou Getúlio Vargas ao suicídio com inverdades e com fatos falsos, construídos. E promoveu um golpe de Estado em 1964. Não há como negar isso. Essa é uma outra linha de causalidade. Há dois anos e meio a imprensa tentava botar Lula debaixo de sua pauta. Conseguiu agora.

      CC: Não é o papel da imprensa tomar conta, fiscalizar?
      WGS: É. Tomar conta, sim. Desestabilizar, não. A estabilidade não pode depender de militar, nem da Igreja, nem da imprensa.

      CC: As Forças Armadas...
      WGS: Duvido que elas voltem a ter a importância que tiveram. Quando se pegava um tenente roubando e gritava “ladrão”, ele dizia: “Está ofendendo as Forças Armadas”. E os generais concordavam. Hoje acontece com jornalista. O jornalista faz uma barbaridade e alguém diz: “Ele fez uma infâmia”. Os grandes jornais alertam: “A liberdade de imprensa está sob ameaça”. É a maior corporação existente hoje no País com um poder infernal.

      CC: Essas linhas de causalidade explicam a crise?
      WGS: Elas não são responsáveis pelo que acabou sendo a crise. A dimensão da crise não estava na cabeça de ninguém. Assim como ninguém sabe o que vai acontecer. Foi por isso que começaram a puxar os freios.

      CC: O comportamento da oposição ficou na linha demarcatória das ações políticas? Alguém, em sua opinião, cruzou a linha?
      WGS: Depende do que se chama de cruzar a linha. Quando se começa a dizer, como foi dito, que há iminência de crise institucional está cruzando a linha...

      CC: Quem disse isso foi o ex-presidente Fernando Henrique.
      WGS: Vamos reler o último parágrafo do artigo de 5 de julho passado, que ele escreveu em O Globo: “Se nada for feito, caberá a quem venha a ser o candidato do PSDB nas próximas eleições apresentar ao eleitorado um programa muito claro com reformas eleitorais, partidárias e da máquina pública. Caberá anunciar de antemão a disposição, se eleito, de recorrer aos mecanismos de consulta à população para validar essas reformas e mesmo, se entender necessário, solicitar ao Congresso uma lei delegada para fazê-las”. Se anunciada por Lula, a proposta seria tomada como fato determinante para criar uma CPI. Ameaça de chavismo.

      CC: Por que o PSDB teria chegado a esse ponto?
      WGS: Pelo pavor do sucesso do governo Lula. O PSDB sabe que com mais dois anos de governo, como vinha até agora, ele levaria uma surra em 2006.

      CC: Interessa a eles chegar ao impeachment?
      WGS: Não acredito que eles queiram promover o impedimento de Lula. Mas, se houver a possibilidade, não recuarão. Se a chance aparecer, os tucanos vão apoiar esse golpe branco, porque o governo está sendo bem-sucedido. Se fosse um governo inepto, como se apregoa, o PSDB deixaria Lula em paz e o derrotaria facilmente no ano que vem.

      CC: Mas o PSDB não inventou o episódio...
      WGS: Caiu na mão do partido esse episódio de corrupção nos Correios.

      CC: Declarações como a do governador Aécio Neves – de que Lula não é Collor – seriam uma pitada de bom senso?
      WGS: É difícil querer dizer que não está interessado no mesmo movimento que levou ao impedimento de Collor, porque o governo Lula é diferente sem, ao mesmo tempo, chamar a atenção para o fato de que podem ser iguais. Quem foi que disse que era igual? A comparação pode estar na cabeça do formulador da frase.

      CC: Frase sibilina.
      WGS: Muito sibilina. O PSDB, sobretudo o tucanato paulista, está numa posição de oposição provocadora. Não diria mais que está na posição golpista que já teve e pode voltar a ela.

      CC: Estaria havendo transferência de um confronto paulista para o plano nacional?
      WGS: Uma parte do imbróglio, do lado tucano, tem a ver com a disputa interna – quem vai ser o candidato – que implica, entre outras coisas, bloquear Aécio Neves e Jereissati. Isso obriga, também, a fazer campanha contra o PT paulista. O PT nacional é o PT paulista levando para o plano federal desavenças locais, de São Paulo.

      CC: Isso tem reflexos no governo Lula?
      WGS: É uma parte da desarticulação do governo que vem se revelando de uma incompetência na política cotidiana, que não é incompetência normal do PT. Isso só pode ser explicado porque estão fazendo política de São Paulo no Planalto. Não há uma defesa organizada, concatenada em torno das realizações do governo Lula e é por isso que boa parte delas ninguém sabe. Há uma busca desesperada de consenso no governo que parece o processo decisório do PT.

      CC: A quem caberia arbitrar para acelerar as decisões?
      WGS: Estamos falando da falta de um articulador. No caso, falta o presidente Lula. Ele está exercendo mal o seu papel de presidente. Ele tem o mandato. Não pode levar esse tempo que levou para aparecer com um discurso pífio. Foi o pior discurso político que vi o Lula fazer.

      CC: O que houve de tão grave na sua opinião?
      WGS: Ele concedeu tudo à oposição. Jogou fora o discurso de posse que foi magistral. Ele disse, ao assumir, que o combate à fome e à miséria seriam a meta ordenadora do governo. Ao discursar no fórum global anticorrupção, ele disse que os países emergentes continuariam pobres enquanto não acabassem com a corrupção. Além de oportunismo, isso é uma tolice. Objetivamente, o presidente disse o seguinte: enquanto for pobre haverá corrupção. Ele concedeu o discurso à pauta da oposição. E falou que a corrupção só acabaria com uma reforma política. Ou seja, Fernando Henrique pautou o discurso de Lula.

      29 de abr. de 2005

      Um alemão conservador

      UM ALEMÃO CONSERVADOR

      JOSÉ LUÍS FIORI


      “ O cristão, o apóstolo, foram criados para crescer. Devem viver animados por uma santa inquietação de divulgar a todos o dom da fé...devem sair e pregar a palavra do Senhor, porque isto ajuda a gerar frutos, frutos permanente. Só dessa maneira a terra se tornará de vale de lágrimas em jardim de Jesus”

      Joseph Ratzinger, homilia “pro-eligendo papa”, FSP, 20/04/2005



      Primeiro, foi a derrota de John Kerry, nos Estados Unidos, e agora, a vitória de Joseph Ratzinger, no Vaticano, dois revezes contundentes para os liberais de todo o mundo. Muitos supunham que depois do primeiro governo Bush, e do longo papado conservador de João Paulo II, seria hora dos liberais voltarem ao poder, segundo uma regra de alternância que muitos analistas consideram indispensável ao equilíbrio dos sistemas, como na fantasia dos economistas. Mas o que aconteceu foi exatamente o contrário, e no caso do Vaticano, o novo papa alemão tem um perfil ainda mais radical e intolerante do que seu antecessor.

      Não é fácil de explicar a vitória de Ratzinger, mesmo quando se saiba do poder que detinha dentro do colégio eleitoral que foi nomeado - quase todo - pelo seu antecessor. De um ponto de vista menos institucional ou eclesiástico, entretanto, uma primeira pista para explicar esta continuidade conservadora pode ser encontrada na própria fragilidade intelectual dos seus adversários. Basta ler com atenção as suas respectivas agendas e propostas para perceber que os liberais alinhados em torno do Cardeal Carlo Maria Martini, assim como os que apoiaram a candidatura de John Kerry, não foram capazes de oferecer uma alternativa concreta à agenda conservadora mundial destes últimos 30 anos. Como se os liberais também tivessem sido atingidos pela epidemia ou anemia que dizimou o pensamento social-democrata, na década de 1990.

      Da perspectiva desta hegemonia conservadora das últimas décadas, a escolha de Ratzinger aparece como um ponto apenas dentro de uma trajetória política e ideológica de mais longo prazo, que chega até os “neoconservadores” do governo Bush, mas que começa em Roma, exatamente na hora em que o Vaticano surpreendeu o mundo católico – em 1978 - ao transformar um cardeal obscuro, proveniente de uma das comunidades católicas mais reacionárias e piegas da Europa, no Papa João Paulo II. Sua eleição foi o verdadeiro ponto de partida ideológico deste longo período conservador que se prolonga até hoje, começando na forma de uma resposta aos movimentos emancipatórios dos anos 60 e à grande crise econômica da década de 70. Para ser fiel as datas, Karol Wotjyla foi eleito em 1978, Margareth Thatcher , em 1979, Ronald Reagan, em 1980 e Helmut Khol, em 1983. Suas eleições não fizeram parte de uma mesma estratégia, nem obedeceram a uma cadeia coordenada de comando ou decisão. Mas todos eram profundamente conservadores, e suas idéias e ações convergiram em torno de uma mesma estratégia anti-comunista, criando-se uma força política e ideológica coesa que derrubou o mundo socialista, atravessou os anos 90 e chegou até os nossos dias cada vez mais conservadora, autoritária e expansiva. Já se estudou e falou muito das transformações econômicas, financeira e geopolíticas que começaram com a crise mundial dos anos 70, em particular das reformas e políticas neo-liberais, mas talvez não se tenha dado a devida atenção à dimensão cultural e religiosa desta expansão vitoriosa dos conservadores, pelo menos até o momento em que o fundamentalismo religioso se transformou no grande cabo eleitoral da reeleição de George Bush, em 2004.

      É reconhecido o papel de João Paulo II na luta e na desmontagem do mundo comunista, sobretudo na região da Europa central. Alguém já disse que se não fosse por Wotjyla, não teria havido o sindicato Solidariedade, e se não fosse por causa da existência do Solidariedade, não teria havia eleições na Polônia, e se não fosse pelas eleições polonesas não teriam existido as “revoluções de veludo”, que devolveram a Europa central ao “ocidente cristão”. Mas depois disto, se discutiu pouco a importância do conservadorismo moral de João Paulo II, e da intolerância teológica de sua Cúria Romana, na recomposição das energias expansivas do conservadorismo ocidental, que hoje alimenta o discurso e pratica messiânica do governo norte-americano de George Bush. Neste sentido, é interessante agregar a este quadro alguns outros acontecimentos que ocorreram de forma independente, naquele mesmo momento da “virada à direita” do “mundo ocidental”, entre 1978 e 1983. Acontecimentos que apontavam, entretanto, na mesma direção da intolerância religiosa e da escalada militar. Basta relembrar, a revolução xiita, no Irã, em 1979; a invasão do Irã pelas tropas sunitas de Saddam Hussein, em 1980, apoiadas e sustentadas pelas armas químicas e biológicas dos Estados Unidos e de vários países europeus; o aparecimento dos talibãs no Afeganistão, e, finalmente, em 1982, a “invasão preventiva” do Líbano pelas tropas de Ariel Sharon, que culminou com o célebre massacre dos palestinos, nos campos de refugiados de Sabra e Shatila. Quatro acontecimentos militares de forte conotação religiosa que se transformaram em peças do tabuleiro onde foi se armando, aos poucos, mais do que uma restauração conservadora, uma verdadeira “escalada aos extremos” teológicos – e as vezes militares - das religiões ocidentais que C.J.Jung e A.Toynbee chamaram de “extrovertidas”, ou seja, com vocação apostólica e conquistadora, ao contrário das religiões orientais que seriam essencialmente “introvertidas” e não expansivas.

      Desta mesma perspectiva, a escolha de um papa alemão e conservador também tem um outro significado complementar: assim como Wotjyla foi escolhido pelos olhos estratégicos do Vaticano e das demais potências ocidentais com vistas a conquista do mundo comunista, Ratzinger foi eleito para unificar e recristianizar a “velha Europa”, segundo a proposta de João Paulo II, apresentada em Santiago de Compostela, na Espanha, em 1982. Este objetivo central explica seu apelo imediato ao diálogo entre as religiões cristãs e os judeus, e ao esquecimento do seu texto Dominus Iesus, publicado em 2000, defendendo a superioridade e inevitabilidade do catolicismo como caminho da salvação. Este mesmo projeto explica sua resistência explicita à incorporação da Turquia à União Européia. As críticas de Ratzinger ao relativismo, ao individualismo, ao consumismo e ao agnosticismo, feitas na sua homilia “pro-eligiendo”, que foi uma espécie de carta de princípios e programa eleitoral publicado na véspera da reunião do colégio de cardeais, foi uma crítica direta ao “amolecimento espiritual” da Europa, afogada num hedonismo laico, egoísta e desfibrado. Em Ratzinger, está sempre implícita a visão de uma União Européia que engordou excessivamente e perdeu sua capacidade de decisão e ação coletiva, gerida por partidos e lideranças políticas liberais e social-democratas sem idéias claras, sem energia e sem capacidade de liderança mundial. Como um velho alemão, conservador e teólogo, Ratzinger acredita na necessidade de voltar às raízes últimas da unidade e da força européia, o Santo Graal onde se escondem as primeiras verdades do cristianismo, imbatíveis e inegociáveis. Nesse sentido, Ratzinger defende para a Europa como para toda a Igreja Católica – mesmo que seja em sentido metafórico - um período de volta aos monastérios, onde seus povos e seus líderes recuperem a força espiritual capaz de recolocar a Europa na liderança mundial, por cima do fundamentalismo protestante dos norte-americanos. Sua meta é de longo prazo, e não se restringe apenas ao projeto de democratização ou conversão do “Grande Oriente Médio” dos neo-conservadores de Washington. Na verdade, seus olhos catequéticos ou conquistadores estão postos num horizonte mais longínquo, no imenso pedaço do mundo eurasiano onde o Papa João Paulo II não colocou os pés e onde as religiões “introvertidas” são hegemônicas, mas não tem pretensões expansivas.

      É verdade que a história não se repete, mas ela pode ser lida como uma parábola, pelos contemporâneos de todas as épocas. Nesse sentido, pode estar no inconsciente deste projeto de reunificação e recristianização européia, o primeiro grande movimento de expansão dos poderes territoriais europeus, ibéricos, associados com a Igreja Católica. Um caso exemplar de centralização do poder territorial combinado com a ordenação autoritária dos costumes e a renovação do espírito e da disciplina cristã através da Inquisição, seguidos imediatamente pela “explosão expansiva” dos descobrimentos que deram origem ao primeiro grande império europeu, mundial e cristão de Carlos V e Felipe II, onde “o sol nunca se punha”. Esta poderia ser a grande cartada ou esperança de Bento XVI, a última tentativa de dar uma vitalidade civilizatória e cristã, à nova União Européia. Mas se a história serve como parábola, não se pode esquecer que foi neste mesmo período de glória cristã e espanhola, que Lutero, Calvino e Henrique VIII cindiram a Igreja Católica criando as primeiras igrejas cristãs e nacionais, que nunca mais se submeteram a Roma, mesmo depois do Concilio de Trento (1545-1563) e do movimento repressivo da contra-reforma do século XVI e XVII. Além disto, foram este novos países protestantes que acabaram sucedendo a Espanha na dominação européia do mundo. Muito antes que os Estados Unidos assumissem este mesmo papel, agora sob o impulso de sua “revolução neo-conservadora” que já é de fato a herdeira – ainda que ilegítima - do fundamentalismo teológico e moral de Wotjyla e Ratzinger. Neste sentido é sempre bom lembrar que por mais que a Igreja abomine a guerra, não existe nenhum possibilidade de existência de um projeto expansionista e intolerante que não acabe em guerra contra os hereges, sejam eles quem forem, mesmo quando se fale muito em diálogo, em geral deixando para os outros a responsabilidade de fazer a guerra.