13 de jun. de 2003

A tragédia da Palestina e possíveis consequências

A esperança na possibilidade de sucesso do plano de paz para a Palestina
patrocinado pelo presidente americano George W. Bush durou menos de uma semana.
A troca de atentados terroristas entre o governo de Israel e o Hamas que tem
horrorizado o mundo nos últimos três dias praticamente põe fim às
perspectivas de que o "mapa da estrada" de Bush conduza a região a
qualquer destino seguro.


Nunca é demais enfatizar a importância que aquele pequeno pedaço
de terra tem para o futuro da humanidade. Grande parte do ódio que tem
semeado algumas das piores tragédias e conflitos contemporâneos
tem sua origem na milenar disputa pelos locais sagrados cristãos e islâmicos.
É lastimável que não se tenha conseguido chegar a um entendimento
para confronto tão antigo e primário, apesar de todo o progresso
material e científico obtido pelos humanos em especial no decorrer do
século passado.


O impasse atual é ainda mais frustrante porque ele ocorre depois de
um período em que a chance de acordo definitivo para o assunto esteve
pertíssimo de acontecer, com os acordos de Oslo e Washington. Foi na
reunião entre Iasser Arafat, Ehud Barak e Bill Clinton em Camp David,
em 2000, que a paz esteve mais próxima de se concretizar. O então
premiê israelense ofereceu, sob pressão de Clinton, a criação
de um Estado palestino composto por 100% da faixa de Gaza, 95% da Cisjordânia,
a maior parte de Jerusalém, inclusive a cidade velha, o fim dos assentamentos
judeus em territórios palestinos. Só o direito de retorno de refugiados
palestinos a Israel é que não ficou acertado em Camp David. O
malogro dessa cúpula resultou na sucessão de violências
que levou Ariel Sharon ao poder e à situação atual.


A omissão do presidente Bush durante os dois anos e meio iniciais de
sua administração contribuiu muito para os problemas de agora.
Ela incentivou Sharon a agir a seu estilo, sem freios. A imobilidade de Arafat
também foi decisiva para o beco sem saída em que a questão
se encontra. Ela o enfraqueceu entre seu próprio povo e o isolou diante
da maioria da comunidade internacional.


A tardia adesão de Bush ao esforço para a busca de uma solução
ocorreu menos por convicção pacifista e mais como o pagamento
ao Reino Unido pelo seu apoio na invasão do Iraque e à França,
Alemanha e Rússia pela aprovação do projeto de reconstrução
sob a liderança americana daquele país. O engajamento dos EUA
é absolutamente vital para o êxito de qualquer negociação
no Oriente Médio. Neste momento, ela não parece ser nem entusiasmada
nem - mais importante - minimamente neutra.


Os 33 meses desta nova Intifada levaram Israel à pior recessão
econômica de sua história e jogaram 60% da população
da Autoridade Palestina para baixo da linha de pobreza. É certo que a
economia israelense e palestina é uma fração mínima
da mundial. Mas os efeitos da conflagração naquela área
têm sido desastrosos há décadas e poderáo ser calamitosos
se a guerra prosseguir e se ampliar.


A desmoralização que o governo Bush impôs à Organização
das Nações Unidas quando resolveu atacar o Iraque sem a permissão
do Conselho de Segurança retira daquela organização - e,
na prática, de qualquer outra entidade multilateral - o poder para intervir
no processo com alguma expectativa de sucesso.


Assim, está em Washington a única oportunidade viável
de paz. Àcomunidade internacional só cabe pressionar os EUA para
que haja com determinação e imparcialidade. Inclusive com o argumento
óbvio - mas infelizmente quase nunca compreendido pelos atuais governantes
americanos - de que os EUA e seus cidadãos com certeza estarão
entre as principais vítimas dos desdobramentos do fracasso da diplomacia
na Palestina.


O Brasil, que também sofrerá as sequelas do agravamento do conflito
entre israelenses e palestinos, tem autoridade moral e política para
ajudar a pressionar os EUA, já que neste país judeus e muçulmanos
têm uma antiga tradição de convivência pacífica
e cooperativa em todos os aspectos.


fonte: Valor Econômico

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