Bush II
As eleições norte-americanas confirmam que a democracia – apesar de ser o menos imperfeito dos regimes políticos – não está isenta de escolhas que podem levar ao poder perigosos demagogos
Ignacio Ramonet
A reeleição, no último dia 2 de novembro, de George W. Bush para a Presidência dos Estados Unidos constitui uma afronta ao espírito da democracia norte-americana, a mais antiga do mundo e, por isso mesmo, sua referência primordial. É evidente que, tecnicamente falando, não há – desta vez – o que reclamar. Ninguém pode contestar o caráter legítimo da votação. Usando de seus direitos, os eleitores escolheram segundo seus desejos1. Nem por isso esta eleição é menos inquietante, e até chocante. Confirma que a democracia – apesar de ser o menos imperfeito dos regimes políticos – não está isenta de escolhas que podem levar ao poder perigosos demagogos.
É realmente preocupante que Bush, conhecido por seu fundamentalismo religioso, por sua mediocridade intelectual e por sua incultura, tenha sido o candidato mais votado da história eleitoral norte-americana. Principalmente por ter enganado seu povo e mentido ao Congresso para conseguir autorização de conduzir uma “guerra preventiva” (não autorizada pela ONU) e invadir o Iraque; por ter incentivado um uso desproporcional de força, provocando a morte de milhares de civis iraquianos inocentes2; por ter ignorado a “ordem executiva” de 1976 do presidente Gerald Ford (ainda em vigor e que proíbe os serviços secretos de assassinarem dirigentes políticos estrangeiros) e ordenado a execução de supostos “terroristas3”; por ter violado as Convenções de Genebra sobre o tratamento de prisioneiros de guerra; por ter permitido a prática de tortura na prisão de Abu Ghraib e em outros centros de detenção secretos; e porque ressuscitou o espírito do macartismo, que consiste em considerar culpado qualquer cidadão que possa ser suspeito de manter vínculos com uma organização inimiga.
Plebiscito da ilegalidade?
Com um quadro de honra de tal maneira sinistro, qualquer outro dirigente seria declarado pouco recomendável e banido do mundo civilizado. Não George Bush que, além do mais – e enquanto presidente da única hiperpotência mundial – ocupa o lugar central do dispositivo político internacional.
Seu segundo mandato promete dar continuidade ao anterior. E as duas primeiras nomeações de ministros confirmam que Bush interpreta sua vitória eleitoral como um plebiscito à sua política. A escolha de Alberto Gonzales para o Departamento de Justiça, por exemplo, constitui uma resposta de desprezo a todos os que criticam a tortura em prisioneiros acusados de terrorismo. Isso porque, na condição de assessor jurídico do presidente, o próprio Gonzales foi o autor dos dispositivos legais que permitiram contornar as Convenções de Genebra – qualificando de “inimigos combatentes” os prisioneiros das guerras do Afeganistão e do Iraque – e da criação da base de Gunatánamo. Contrariando a legislação norte-americana e os tratados internacionais, Gonzales não hesitou em suspender a proibição de que fossem exercidas “pressões físicas” sobre esses prisioneiros sob o pretexto de que “na condução da guerra, a autoridade do presidente é total”.
Limites do instrumento militar
Quanto à nomeação de Condoleezza Rice para o Departamento de Estado, é impossível não ver na medida uma reivindicação do unilateralismo puro e duro defendido pelos republicanos autoritários do círculo presidencial e que parecem confirmar novas ameaças contra o Irã.
No entanto, a incapacidade das forças armadas se imporem no Iraque contra os insurrectos prova os limites do instrumento militar. Constatação que também se pode fazer em Israel, no momento em que desaparece Yasser Arafat, o general Ariel Sharon, principal aliado de Bush no Oriente Médio. O primeiro-ministro israelense constata que a capacidade de sofrimento dos palestinos continua superior à capacidade de destruição de seu exército. Saberia ele compreender as conseqüências disso?
Seria Bush capaz de acabar reconhecendo que os aspectos negativos da globalização (pobres cada vez mais pobres, injustiças planetárias, rivalidades regionais, desequilíbrios climáticos etc.) podem degenerar em conflitos caso não se consiga uma mediação conjunta multilateral? Ou que uma potência não pode pretender impor a lei sozinha?
16 de dez. de 2004
20 de out. de 2004
Mídia insiste em beneficiar Serra
MÍDIA INSISTE EM BENEFICIAR SERRA, DIZ PESQUISA
A pesquisa divulgada hoje (15) pelo Observatório Brasileiro de Mídia (www.observatoriodemidia.org.br) sobre a cobertura das eleições municipais de São Paulo mostra que a grande imprensa continua favorecendo a candidatura de José Serra (PSDB). O estudo é referente às matérias publicadas entre os dia 4 e 10 de outubro e foi realizado por uma equipe de alunos de jornalismo da Escola de Comunicações e Artes da USP, sob orientação do professor José Coelho Sobrinho. Foram analisados os cinco maiores jornais paulistanos: Agora São Paulo, Diário de S.Paulo, Jornal da Tarde, Estado de S.Paulo e Folha de S.Paulo.
De acordo com o morfômetro - critério desenvolvido pelos pesquisadores da USP para aferição qualitativa das matérias sobre as eleições –, entre as matérias que citam o José Serra, 14,06% são negativas, 44,86% neutras e 41,09% positivas. Já entre as reportagens sobre a candidata Marta Suplicy (PT) 40,36% são negativas, 44,40% neutras e 15,24% positivas.
O estudo mostra que o Estado de S.Paulo publicou o maior número de matérias negativas sobre a candidata petista: 66% das citações de Marta foram negativas. No JT, o índice foi de 38% e, na Folha, 34%. O índice mais baixo se deu no Diário de São Paulo (20%).
Em relação às matérias positivas sobre Marta, o índice ficou entre 10% e 15% em todos os jornais analisados. Quanto à Serra, o índice variou de 25% (Agora) a 40% (Folha).
A Folha foi também o jornal que publicou o maior volume de matérias neutras sobre os dois candidatos: 85,13% sobre a “candidata Marta” e 69,63% a respeito de Serra.
Além das matérias sobre os dois candidatos, a pesquisa analisa também as referências diretas ou indiretas à administração da prefeita Marta. Por exemplo, a partir de uma reportagem sobre a dificuldade na reparação de buracos no asfalto do município foi gerado um registro para a Marta “prefeita”. Assim, “Marta Prefeita” obteve 60,05% de matérias negativas,contra 20,61% de neutras e 19,34% de positivas.
O morfômetro é o diferencial dos levantamentos realizados pelo Observatório Brasileiro de Mídia em relação a outros estudos semelhantes. O critério funciona da seguinte maneira: além da tradicional classificação entre as categorias positiva, neutra e negativa, o trabalho traz uma escala de valores. O recurso permite que seja atribuída uma nota de 2 a 10 a cada matéria, de acordo com sua localização na página e com os elementos gráficos, como foto e outros recursos gráficos, como trechos em destaque.
Os pesquisadores também trabalharam com números absolutos. Os resultados dentro desse critério de avaliação mostram que a “candidata Marta” somou 185 matérias negativas e a “prefeita”, 67. Enquanto a respeito de José Serra foram 55 desfavoráveis. Em relação às positivas os números foram: 67 referentes à “Marta candidata”; 22 à “Marta prefeita” e 161 a José Serra. Proporcionalmente, José Serra foi o candidato que mais se beneficiou com as matérias neutras: 185 matérias citam o candidato sem dar conotação positiva ou negativa. Enquanto “Marta candidata” obteve 210 citações neutras e “Marta prefeita”, 24.
A coordenação geral do estudo é do jornalista Carlos Carolino. Os resultados completos que mostram a cobertura de cada candidato por veículo pesquisado desde o dia 26 de setembro estão disponíveis na página do Observatório Brasileiro de Mídia: www.observatoriodemidia.org.br
A pesquisa divulgada hoje (15) pelo Observatório Brasileiro de Mídia (www.observatoriodemidia.org.br) sobre a cobertura das eleições municipais de São Paulo mostra que a grande imprensa continua favorecendo a candidatura de José Serra (PSDB). O estudo é referente às matérias publicadas entre os dia 4 e 10 de outubro e foi realizado por uma equipe de alunos de jornalismo da Escola de Comunicações e Artes da USP, sob orientação do professor José Coelho Sobrinho. Foram analisados os cinco maiores jornais paulistanos: Agora São Paulo, Diário de S.Paulo, Jornal da Tarde, Estado de S.Paulo e Folha de S.Paulo.
De acordo com o morfômetro - critério desenvolvido pelos pesquisadores da USP para aferição qualitativa das matérias sobre as eleições –, entre as matérias que citam o José Serra, 14,06% são negativas, 44,86% neutras e 41,09% positivas. Já entre as reportagens sobre a candidata Marta Suplicy (PT) 40,36% são negativas, 44,40% neutras e 15,24% positivas.
O estudo mostra que o Estado de S.Paulo publicou o maior número de matérias negativas sobre a candidata petista: 66% das citações de Marta foram negativas. No JT, o índice foi de 38% e, na Folha, 34%. O índice mais baixo se deu no Diário de São Paulo (20%).
Em relação às matérias positivas sobre Marta, o índice ficou entre 10% e 15% em todos os jornais analisados. Quanto à Serra, o índice variou de 25% (Agora) a 40% (Folha).
A Folha foi também o jornal que publicou o maior volume de matérias neutras sobre os dois candidatos: 85,13% sobre a “candidata Marta” e 69,63% a respeito de Serra.
Além das matérias sobre os dois candidatos, a pesquisa analisa também as referências diretas ou indiretas à administração da prefeita Marta. Por exemplo, a partir de uma reportagem sobre a dificuldade na reparação de buracos no asfalto do município foi gerado um registro para a Marta “prefeita”. Assim, “Marta Prefeita” obteve 60,05% de matérias negativas,contra 20,61% de neutras e 19,34% de positivas.
O morfômetro é o diferencial dos levantamentos realizados pelo Observatório Brasileiro de Mídia em relação a outros estudos semelhantes. O critério funciona da seguinte maneira: além da tradicional classificação entre as categorias positiva, neutra e negativa, o trabalho traz uma escala de valores. O recurso permite que seja atribuída uma nota de 2 a 10 a cada matéria, de acordo com sua localização na página e com os elementos gráficos, como foto e outros recursos gráficos, como trechos em destaque.
Os pesquisadores também trabalharam com números absolutos. Os resultados dentro desse critério de avaliação mostram que a “candidata Marta” somou 185 matérias negativas e a “prefeita”, 67. Enquanto a respeito de José Serra foram 55 desfavoráveis. Em relação às positivas os números foram: 67 referentes à “Marta candidata”; 22 à “Marta prefeita” e 161 a José Serra. Proporcionalmente, José Serra foi o candidato que mais se beneficiou com as matérias neutras: 185 matérias citam o candidato sem dar conotação positiva ou negativa. Enquanto “Marta candidata” obteve 210 citações neutras e “Marta prefeita”, 24.
A coordenação geral do estudo é do jornalista Carlos Carolino. Os resultados completos que mostram a cobertura de cada candidato por veículo pesquisado desde o dia 26 de setembro estão disponíveis na página do Observatório Brasileiro de Mídia: www.observatoriodemidia.org.br
13 de out. de 2004
ANCINAV e o retorno ao debate
ANCINAV e o retorno ao debate
Ivo Lucchesi(*)
Dentre o amplo espectro de angulações críticas a respeito do anteprojeto encaminhado pelo Ministério da Cultura, propondo a criação da ANCINAV, a despeito do muito que contra ou a favor tenha sido formulado, aspectos outros merecem registro, afora questões já pontuadas em artigos anteriores. Algumas das questões a envolverem a proposição da ANCINAV, ainda fora das análises figurantes em dezenas de artigos, podem ser direcionadas para dois pontos: 1) estratégia governamental; 2) redefinição da política cultural.
A estratégia governamental
Qualquer avaliação desapaixonada e, até onde possível, isenta dá conta de que duas possibilidades explicam a atuação do presente governo, desde a posse:
1) não dispunha de nenhum projeto governamental;
2) o projeto de que dispunha não era viável para execução. Apenas servia como alavanca para a vitória nas urnas. A partir daí, o desafio ficou posto. Como governar sem projeto, dando a impressão de estar transformando tudo? E mais: como dar visibilidade a esse jogo das aparências? Aí entra em cena a parceria entre mídia e governo.
Nenhuma alteração na lógica econômica foi promovida. Pelo contrário, todo o empenho esteve direcionado para a radicalização do modelo já encontrado. Quanto aos demais setores, multiplicados em ministérios e com verbas engessadas, coube implementar em todos conjunto de medidas reformistas, mantendo o noticiário com pautas recheadas. Assim vieram os projetos para a previdência, área tributária, planos assistencialistas, regulamentações para profissões (dentro do figurino está o Conselho Federal de Jornalismo), discussão sobre liberação para plantio de transgênicos, além dos inúmeros episódios em âmbito internacional e doméstico, a exemplo do pedido de expulsão do jornalista norte-americano e o novo avião presidencial.
A mídia, sob esse prisma, não tem do que se queixar: desde janeiro de 2003, há farta oferta de pautas para todos os gostos. E assim tem sido. Passadas as eleições, virão outras mais, tais como: as reformas trabalhista, judiciária e política, garantindo previamente mais um ano pautado, além de assegurar, como imagem pública, um governo que ininterruptamente "mostra serviço".
Na estratégia pensada, não podia ficar ausente justamente a área encarregada de dar visibilidade: o setor midiático. Na consecução da lógica aqui delineada, a um só tempo vieram à tona – nitidamente com propósitos radicalmente distintos – o projeto para a formação do Conselho Federal de Jornalismo, repleto de artigos que sabidamente produziriam acaloradas discussões no palco da própria mídia e, na outra ponta, num plano de bastante seriedade e com indiscutível procedimento democrático, o debate de caráter estrutural, voltado para a reconfiguração da cultura como geradora de políticas e de receitas, tópico a ser abordado a seguir.
Redefinição da política cultural
Como já foi salientado, o anteprojeto da ANCINAV, este sim, desde a sua formulação original, posto na arena pública da discussão, provocou, diferentemente de governos anteriores, o rumor necessário a uma área que, embora estrategicamente represente para qualquer nação o calçamento de sua identidade, sempre esteve à sombra de outros interesses, figurando na maioria das vezes como mero adorno no conjunto de um governo. Primeiramente, há de se relembrar que a ANCINAV está no bojo de uma discussão mais ampla que inclui, no Congresso, a tramitação do "Plano Nacional de Cultura" ao qual já, no artigo anterior ["A perversão da lógica quantitativa"], foi feita alusão.
É óbvio que, na proposição do Ministério da Cultura, há artigos geradores de intensas controvérsias, entre as quais os percentuais fixados para a taxação de recolhimentos de receitas. Ninguém será ingênuo em não perceber que os percentuais firmados atendem a duas estratégias:
1) função apelativa: produzir nos segmentos atingidos a reação necessária para o envolvimento com o tema;
2) manobra de negociação: quem pretende algum ganho não declara a priori quanto aceita. Para tanto, sempre parte de um patamar acima, a fim de chegar ao propósito real. Isto é princípio elementar que, em linguagem corrente, equivale à expressão "poder de barganha".
A grande questão, porém, reside em outras esferas: pela primeira vez, um órgão governamental gera certo desconforto em setores habituados a ditarem modelos, livres de maiores ou menores admoestações. O complexo midiático reinante no país, ao longo de décadas, se torna alvo de injunções externas que sempre estiveram sob controle absoluto de propósitos internos. Esta é a face política da questão.
Que existe profundo incômodo por parte do setor organizado da mídia audiovisual, quanto das empresas de comunicação em geral, não parece segredo. Afinal, que motivações outras moveram, por exemplo, o jornal O Globo, para, em sua edição de quarta-feira (29/9) dedicar página inteira a uma entrevista com João Eustáquio da Silveira, cientista político e Diretor da Agência Nacional do Cinema (Ancine), destacando a seguinte declaração-manchete: "Projeto está eivado de dispositivos autoritários, quando não obscuros"?
O tom panfletário da declaração não esconde, desde a retomada da democracia, o já velho expediente que é sempre invocado, quando alguma voz pretende estabelecer limites seja para o que for. O fato é recorrente em todas as situações. A impressão que fica é a de que, no Brasil, pós-ditadura, qualquer esboço de regramento significa reavivar o fantasma da repressão e da censura.
Diferentemente do teor de alguns artigos constantes na proposição do CFJ, nenhum artigo do anteprojeto da ANCINAV pode ser alvo de críticas quanto à sua possível face autoritária, exatamente em razão de o processo a constituir o anteprojeto respeitou, em todos os estágios, as regras que sustentam a prática democrática, além de tudo haver sido (e estar sendo) amplamente divulgado e debatido em inúmeros fóruns. Em nada, pois, se iguala à prática utilizada para a tramitação sinuosa do projeto relativo ao CFJ, conteúdo do qual a sociedade apenas foi informada, quando o dispositivo já estava nas mãos do presidente da República, para o devido envio ao Congresso. Pelo menos, ficou a suspeita de que tudo pudesse ter sido aprovado pelo mecanismo, não pouco freqüente, da aprovação por acordo entre lideranças, instrumento, aliás, nada democrático e que precisaria ser erradicado.
A título de ilustração quanto ao instrumento congressual citado no parágrafo anterior, cabe relatar que, há pouco tempo, deputados denunciaram que, por acordo de líderes, sem nenhuma discussão com as respectivas bancadas, seria referendado pelo governo brasileiro o "Plano Quadro", acordo internacional para fixação de políticas restritivas ao plantio de tabaco no mundo. A denúncia de alguns deputados impediu a consumação do ato, o que obrigou o envio da matéria para discussão no Congresso. Curiosamente, a mídia também sobre tal questão silenciou.
Apenas para outra ilustração, vale consignar que inúmeros pontos alinhavados pelo anteprojeto ANCINAV já eram preocupação de Pierre Bourdieu, teórico franco-argelino e falecido em janeiro de 2002 – fato que mereceu de nós um artigo – , quando, em 17/10/1999, publicou, no jornal Libération a íntegra de uma conferência por ele ministrada num evento ao qual se faziam presentes representantes das maiores corporações de mídia no mundo. Na época, o suplemento Mais! (da edição dominical da Folha de S.Paulo) publicou sob o título "Pierre Bourdieu desafia a mídia internacional".
Os 19 parágrafos da mencionada publicação fornecem um rentável mapeamento acerca dos perigos que derivam da fusão entre tecnologia, capital e mídia. A construção midiática (impressa e eletrônica) lida com substância que divulga criação artística, geração de idéias, recortes do cotidiano e entretenimento. Conseqüentemente, não pode, em nome do lucro, ignorar as duas primeiras e restringir-se às duas últimas, com o agravante de ainda, em nome de "entretenimento", expor baixarias, e conteúdos deformantes. Num dos trechos do texto citado, Bourdieu sentencia:
"Os que fazem o novo mundo da comunicação e são feitos por ele gostam de citar o problema da velocidade, do fluxo de informações e de transações que se torna cada vez mais rápido e, sem dúvida, eles têm parcialmente razão, quando pensam na circulação da informação e na rotatividade dos produtos. Dito isso, a lógica da velocidade e do lucro que se unem na busca do lucro máximo a curto prazo (com as pesquisas de audiência para a televisão, o sucesso das vendas para o livro e, evidentemente, o jornal, o número de anos para o filme) parecem-me incompatíveis com a idéia de cultura."
Enfim, o anteprojeto, sob a liderança propositiva do MinC, permite que o paradigma cultural brasileiro seja posto na berlinda. Está na hora de pôr cartas abertas sobre a mesa. O que significa, afinal, no âmbito das emissoras de televisão, "concessão pública". A prática demonstra o contrário: elas são geridas como patrimônio empresarial.
Ivo Lucchesi(*)
Dentre o amplo espectro de angulações críticas a respeito do anteprojeto encaminhado pelo Ministério da Cultura, propondo a criação da ANCINAV, a despeito do muito que contra ou a favor tenha sido formulado, aspectos outros merecem registro, afora questões já pontuadas em artigos anteriores. Algumas das questões a envolverem a proposição da ANCINAV, ainda fora das análises figurantes em dezenas de artigos, podem ser direcionadas para dois pontos: 1) estratégia governamental; 2) redefinição da política cultural.
A estratégia governamental
Qualquer avaliação desapaixonada e, até onde possível, isenta dá conta de que duas possibilidades explicam a atuação do presente governo, desde a posse:
1) não dispunha de nenhum projeto governamental;
2) o projeto de que dispunha não era viável para execução. Apenas servia como alavanca para a vitória nas urnas. A partir daí, o desafio ficou posto. Como governar sem projeto, dando a impressão de estar transformando tudo? E mais: como dar visibilidade a esse jogo das aparências? Aí entra em cena a parceria entre mídia e governo.
Nenhuma alteração na lógica econômica foi promovida. Pelo contrário, todo o empenho esteve direcionado para a radicalização do modelo já encontrado. Quanto aos demais setores, multiplicados em ministérios e com verbas engessadas, coube implementar em todos conjunto de medidas reformistas, mantendo o noticiário com pautas recheadas. Assim vieram os projetos para a previdência, área tributária, planos assistencialistas, regulamentações para profissões (dentro do figurino está o Conselho Federal de Jornalismo), discussão sobre liberação para plantio de transgênicos, além dos inúmeros episódios em âmbito internacional e doméstico, a exemplo do pedido de expulsão do jornalista norte-americano e o novo avião presidencial.
A mídia, sob esse prisma, não tem do que se queixar: desde janeiro de 2003, há farta oferta de pautas para todos os gostos. E assim tem sido. Passadas as eleições, virão outras mais, tais como: as reformas trabalhista, judiciária e política, garantindo previamente mais um ano pautado, além de assegurar, como imagem pública, um governo que ininterruptamente "mostra serviço".
Na estratégia pensada, não podia ficar ausente justamente a área encarregada de dar visibilidade: o setor midiático. Na consecução da lógica aqui delineada, a um só tempo vieram à tona – nitidamente com propósitos radicalmente distintos – o projeto para a formação do Conselho Federal de Jornalismo, repleto de artigos que sabidamente produziriam acaloradas discussões no palco da própria mídia e, na outra ponta, num plano de bastante seriedade e com indiscutível procedimento democrático, o debate de caráter estrutural, voltado para a reconfiguração da cultura como geradora de políticas e de receitas, tópico a ser abordado a seguir.
Redefinição da política cultural
Como já foi salientado, o anteprojeto da ANCINAV, este sim, desde a sua formulação original, posto na arena pública da discussão, provocou, diferentemente de governos anteriores, o rumor necessário a uma área que, embora estrategicamente represente para qualquer nação o calçamento de sua identidade, sempre esteve à sombra de outros interesses, figurando na maioria das vezes como mero adorno no conjunto de um governo. Primeiramente, há de se relembrar que a ANCINAV está no bojo de uma discussão mais ampla que inclui, no Congresso, a tramitação do "Plano Nacional de Cultura" ao qual já, no artigo anterior ["A perversão da lógica quantitativa"], foi feita alusão.
É óbvio que, na proposição do Ministério da Cultura, há artigos geradores de intensas controvérsias, entre as quais os percentuais fixados para a taxação de recolhimentos de receitas. Ninguém será ingênuo em não perceber que os percentuais firmados atendem a duas estratégias:
1) função apelativa: produzir nos segmentos atingidos a reação necessária para o envolvimento com o tema;
2) manobra de negociação: quem pretende algum ganho não declara a priori quanto aceita. Para tanto, sempre parte de um patamar acima, a fim de chegar ao propósito real. Isto é princípio elementar que, em linguagem corrente, equivale à expressão "poder de barganha".
A grande questão, porém, reside em outras esferas: pela primeira vez, um órgão governamental gera certo desconforto em setores habituados a ditarem modelos, livres de maiores ou menores admoestações. O complexo midiático reinante no país, ao longo de décadas, se torna alvo de injunções externas que sempre estiveram sob controle absoluto de propósitos internos. Esta é a face política da questão.
Que existe profundo incômodo por parte do setor organizado da mídia audiovisual, quanto das empresas de comunicação em geral, não parece segredo. Afinal, que motivações outras moveram, por exemplo, o jornal O Globo, para, em sua edição de quarta-feira (29/9) dedicar página inteira a uma entrevista com João Eustáquio da Silveira, cientista político e Diretor da Agência Nacional do Cinema (Ancine), destacando a seguinte declaração-manchete: "Projeto está eivado de dispositivos autoritários, quando não obscuros"?
O tom panfletário da declaração não esconde, desde a retomada da democracia, o já velho expediente que é sempre invocado, quando alguma voz pretende estabelecer limites seja para o que for. O fato é recorrente em todas as situações. A impressão que fica é a de que, no Brasil, pós-ditadura, qualquer esboço de regramento significa reavivar o fantasma da repressão e da censura.
Diferentemente do teor de alguns artigos constantes na proposição do CFJ, nenhum artigo do anteprojeto da ANCINAV pode ser alvo de críticas quanto à sua possível face autoritária, exatamente em razão de o processo a constituir o anteprojeto respeitou, em todos os estágios, as regras que sustentam a prática democrática, além de tudo haver sido (e estar sendo) amplamente divulgado e debatido em inúmeros fóruns. Em nada, pois, se iguala à prática utilizada para a tramitação sinuosa do projeto relativo ao CFJ, conteúdo do qual a sociedade apenas foi informada, quando o dispositivo já estava nas mãos do presidente da República, para o devido envio ao Congresso. Pelo menos, ficou a suspeita de que tudo pudesse ter sido aprovado pelo mecanismo, não pouco freqüente, da aprovação por acordo entre lideranças, instrumento, aliás, nada democrático e que precisaria ser erradicado.
A título de ilustração quanto ao instrumento congressual citado no parágrafo anterior, cabe relatar que, há pouco tempo, deputados denunciaram que, por acordo de líderes, sem nenhuma discussão com as respectivas bancadas, seria referendado pelo governo brasileiro o "Plano Quadro", acordo internacional para fixação de políticas restritivas ao plantio de tabaco no mundo. A denúncia de alguns deputados impediu a consumação do ato, o que obrigou o envio da matéria para discussão no Congresso. Curiosamente, a mídia também sobre tal questão silenciou.
Apenas para outra ilustração, vale consignar que inúmeros pontos alinhavados pelo anteprojeto ANCINAV já eram preocupação de Pierre Bourdieu, teórico franco-argelino e falecido em janeiro de 2002 – fato que mereceu de nós um artigo – , quando, em 17/10/1999, publicou, no jornal Libération a íntegra de uma conferência por ele ministrada num evento ao qual se faziam presentes representantes das maiores corporações de mídia no mundo. Na época, o suplemento Mais! (da edição dominical da Folha de S.Paulo) publicou sob o título "Pierre Bourdieu desafia a mídia internacional".
Os 19 parágrafos da mencionada publicação fornecem um rentável mapeamento acerca dos perigos que derivam da fusão entre tecnologia, capital e mídia. A construção midiática (impressa e eletrônica) lida com substância que divulga criação artística, geração de idéias, recortes do cotidiano e entretenimento. Conseqüentemente, não pode, em nome do lucro, ignorar as duas primeiras e restringir-se às duas últimas, com o agravante de ainda, em nome de "entretenimento", expor baixarias, e conteúdos deformantes. Num dos trechos do texto citado, Bourdieu sentencia:
"Os que fazem o novo mundo da comunicação e são feitos por ele gostam de citar o problema da velocidade, do fluxo de informações e de transações que se torna cada vez mais rápido e, sem dúvida, eles têm parcialmente razão, quando pensam na circulação da informação e na rotatividade dos produtos. Dito isso, a lógica da velocidade e do lucro que se unem na busca do lucro máximo a curto prazo (com as pesquisas de audiência para a televisão, o sucesso das vendas para o livro e, evidentemente, o jornal, o número de anos para o filme) parecem-me incompatíveis com a idéia de cultura."
Enfim, o anteprojeto, sob a liderança propositiva do MinC, permite que o paradigma cultural brasileiro seja posto na berlinda. Está na hora de pôr cartas abertas sobre a mesa. O que significa, afinal, no âmbito das emissoras de televisão, "concessão pública". A prática demonstra o contrário: elas são geridas como patrimônio empresarial.
Por que a maior parte da sociedade brasileira não tem acesso a emissoras como TV Câmara e TV Senado? Será que somente assinantes têm o direito de acompanhar o desempenho de seus representantes? Se, porventura, o anteprojeto da ANCINAV não contempla essa questão, por outro lado, o debate aberto cria espaços para tal, a exemplo de outras tantas questões que não haverão de faltar, considerando o degenerado perfil cultural em vigência e que encontra, no comportamento do sistema midiático, um de seus mais fortes aliados.
(*) Ensaísta, doutor em Teoria Literária pela UFRJ, professor titular do curso de Comunicação das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), Rio de Janeiro
2 de set. de 2004
Corrupção na Flórida
Porque o sistema eleitoral da Flórida é tão corrupto?
Depois do escândalo das últimas eleições presidenciais no Estado da Flórida que levou a uma recontagem de 36 dias. O eleitor norte-americano vai descobrir que pouco foi feito para tentar impedir os 'erros' cometidos em 2000.
Desde 2002 que novos sistemas de vottação foram testados na Flórida, todos sem sucesso. Sistemas de leitura digital falharam sistematicamente nas primárias de março deste ano. E o que vai fazer o poder estadual? Impedir a recontagem das máquinas que derem problemas. Ou seja, ao invés de tentar garantir o voto a todos os cidadãos aptos à esse exercício, irão fazer o contrário. No plesbicito venezuelano de 2004 essas máquinas foram utilizadas, com êxito, e ainda davam um recibo, para uma futura recontagem. Será o medo que leva o governador da Flórida, Jeb Bush, a evitar a recontagem?
Há também o voto por correio, que até então era o mais segura pois obrigava a presença de uma testemunha, mas, recentemente o proeminente governador e irmão do presidente ianque, sancionou uma lei que dispensa este reconhecimento formal do eleitor.
A democracia norte-americana é tão magnífica que desde 1845 que os mortos da Flórida participam de votação e ajudam a eleger seus governantes. Abram os olhos, pois é este tipo de democracia que anda sendo vendido pelos jornais como o supra-sumo dos sistemas de governo.
O mais tocante é que a Flórida é um dos sete estados daquela federação que não atualiza automaticamente a lista de votantes libertados da prisão. E para conseguir o seu direito de volta, tem que ultrapassar árduos obstáculos. Como disse um funcionário do Departamento de Correção da Flórida, 'o irmão do presidente decide quem vai votar e quem não vai'. Como mais da metade da população da Flórida é de afro-americanos que, em sua maioria, votam nos democratas, já viu o que vai dar. As últimas contagens indicam que por volta de 600 mil eleitores não poderão exercer seu direito de voto em noembro próximo.
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Depois do escândalo das últimas eleições presidenciais no Estado da Flórida que levou a uma recontagem de 36 dias. O eleitor norte-americano vai descobrir que pouco foi feito para tentar impedir os 'erros' cometidos em 2000.
Desde 2002 que novos sistemas de vottação foram testados na Flórida, todos sem sucesso. Sistemas de leitura digital falharam sistematicamente nas primárias de março deste ano. E o que vai fazer o poder estadual? Impedir a recontagem das máquinas que derem problemas. Ou seja, ao invés de tentar garantir o voto a todos os cidadãos aptos à esse exercício, irão fazer o contrário. No plesbicito venezuelano de 2004 essas máquinas foram utilizadas, com êxito, e ainda davam um recibo, para uma futura recontagem. Será o medo que leva o governador da Flórida, Jeb Bush, a evitar a recontagem?
Há também o voto por correio, que até então era o mais segura pois obrigava a presença de uma testemunha, mas, recentemente o proeminente governador e irmão do presidente ianque, sancionou uma lei que dispensa este reconhecimento formal do eleitor.
A democracia norte-americana é tão magnífica que desde 1845 que os mortos da Flórida participam de votação e ajudam a eleger seus governantes. Abram os olhos, pois é este tipo de democracia que anda sendo vendido pelos jornais como o supra-sumo dos sistemas de governo.
O mais tocante é que a Flórida é um dos sete estados daquela federação que não atualiza automaticamente a lista de votantes libertados da prisão. E para conseguir o seu direito de volta, tem que ultrapassar árduos obstáculos. Como disse um funcionário do Departamento de Correção da Flórida, 'o irmão do presidente decide quem vai votar e quem não vai'. Como mais da metade da população da Flórida é de afro-americanos que, em sua maioria, votam nos democratas, já viu o que vai dar. As últimas contagens indicam que por volta de 600 mil eleitores não poderão exercer seu direito de voto em noembro próximo.
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31 de ago. de 2004
Expo Brasil-China
Expo Brasil-China
O Brasil dá um importante passo na busca por um desenvolvimento econômico global que beneficie não só um pequeno grupo de países, mas todas as nações.
Do dia 31 de agosto até 3 de setembro a China será invadida por uma missão brasileira que ocupará 11 mil metros quadrados em Pequim para mostrar tudo que o Brasil pode oferecer ao gigantesco mercado chinês. São mais de 150 companhias brasileiras, entre elas Embraer, CSN, Vale do Rio Doce e Aracruz, assim como estatais como Petrobrás e empresas do grupo Eletrobrás. Esta missão contará com centenas de empresários e executivos dos diversos setores da nossa indústria, comércio e energia.
A China é um enigma ao mundo globalizado. Sua economia é robusta e dinâmica, seu mercado interno é de mais de um bilhão de pessoas e sua política é “comunista democrática de mercado”[i]. Apesar de ter entrado na OMC em 2001, já é hoje a sexta economia mundial[ii]. Se antes se temia o despertar da China comunista, saiba que hoje ela já acordou e é uma megapotência. No futuro, se a China mantiver seu crescimento atual, ultrapassará os Estados Unidos por volta de 2041, tornando-se a principal potência econômica do mundo[iii].
A China representa hoje um dos maiores exportadores mundiais, devido ao seu vasto litoral e à criação de zonas especiais de comércio nestas áreas. Os produtos chineses são encontrados em todas as prateleiras do mundo e em 2003 o déficit comercial norte-americano com a China foi de U$ 130 bilhões. Mas, nas importações o apetite chinês também é voraz.
Em 2003, a China foi o principal importador mundial de cimento (importou 55% da produção mundial), de carvão (40%), de aço (25%), de níquel (25%) e de alumínio (14%). E foi o segundo principal importador mundial de petróleo, depois dos Estados Unidos. Essas importações maciças provocaram uma explosão de preços nos mercados mundiais. Em especial, os do petróleo.
Entre 1980 e 2003, a China deu um salto. Seu PIB subiu de 240 bilhões para 1,3 trilhão de dólares. Seu comércio externo pulou de 40 para 800 bilhões de dólares. Sua população de 1,2 bilhão de pobres passou a “enriquecer em ondas”. 500 milhões ainda são pobres, 500 milhões atingiram o nível de classe média e 250 milhões já tem poder aquisitivo de classe média alta. O plano da China: chegar em 2020 com 1,4 bilhão no piso de classe média alta (padrão belga de vida).
No campo cultural a China também é um fenômeno. Além de ser a mais velha civilização mundial, é detentora de inúmeras invenções que fazem parte do nosso cotidiano como a pólvora, o sistema decimal, a acupuntura, o ferro fundido, a bússola, o sismógrafo o papel e a tinta nanquim. No cinema a China conseguiu a façanha de ter a maior bilheteria da semana com o filme ‘Hero’ todo falado em chinês, faturando US$ 17,8 milhões nos seus três primeiros dias de exibição nos Estados Unidos.
A visão brasileira de aproximação com a China, leva em consideração todos estes fatores acima mencionados. A importância chinesa vem crescendo e o Brasil não poderia deixar de perceber. Afinal, a exportação brasileira para o país do Sol Nascente (China) é hoje, em sua maioria, de soja e ferro. E o que é que o Brasil têm a oferecer?
O Brasil tem tecnologia no campo das grandes siderurgias e de combustíveis menos poluentes (álcool); tem o maior rebanho bovino verde (imune à doença da vaca louca); tem sucesso na aviação regional com aviões de pequeno e médio porte; tem fartura de minérios para as indústrias de base. Isso são algumas das coisas que fazem arregalarem os olhos dos chineses.
[i] Definição dada por Ignácio Ramonet no editorial do Le Monde Diplomatique, Ed nº 55
[ii] Está situada entre a Grã-Bretanha e a Itália (depois de Estados Unidos, Japão, Alemanha e França) e deverá passar a integrar o G8, grupo dos países mais industrializados que, além dos já citados, inclui o Canadá e a Rússia.
[iii] Segundo a especialista Maryam Khelili, nessa data os seis países mais prósperos do mundo serão a China, os Estados Unidos, a Índia, o Japão, o Brasil e a Rússia.
O Brasil dá um importante passo na busca por um desenvolvimento econômico global que beneficie não só um pequeno grupo de países, mas todas as nações.
Do dia 31 de agosto até 3 de setembro a China será invadida por uma missão brasileira que ocupará 11 mil metros quadrados em Pequim para mostrar tudo que o Brasil pode oferecer ao gigantesco mercado chinês. São mais de 150 companhias brasileiras, entre elas Embraer, CSN, Vale do Rio Doce e Aracruz, assim como estatais como Petrobrás e empresas do grupo Eletrobrás. Esta missão contará com centenas de empresários e executivos dos diversos setores da nossa indústria, comércio e energia.
A China é um enigma ao mundo globalizado. Sua economia é robusta e dinâmica, seu mercado interno é de mais de um bilhão de pessoas e sua política é “comunista democrática de mercado”[i]. Apesar de ter entrado na OMC em 2001, já é hoje a sexta economia mundial[ii]. Se antes se temia o despertar da China comunista, saiba que hoje ela já acordou e é uma megapotência. No futuro, se a China mantiver seu crescimento atual, ultrapassará os Estados Unidos por volta de 2041, tornando-se a principal potência econômica do mundo[iii].
A China representa hoje um dos maiores exportadores mundiais, devido ao seu vasto litoral e à criação de zonas especiais de comércio nestas áreas. Os produtos chineses são encontrados em todas as prateleiras do mundo e em 2003 o déficit comercial norte-americano com a China foi de U$ 130 bilhões. Mas, nas importações o apetite chinês também é voraz.
Em 2003, a China foi o principal importador mundial de cimento (importou 55% da produção mundial), de carvão (40%), de aço (25%), de níquel (25%) e de alumínio (14%). E foi o segundo principal importador mundial de petróleo, depois dos Estados Unidos. Essas importações maciças provocaram uma explosão de preços nos mercados mundiais. Em especial, os do petróleo.
Entre 1980 e 2003, a China deu um salto. Seu PIB subiu de 240 bilhões para 1,3 trilhão de dólares. Seu comércio externo pulou de 40 para 800 bilhões de dólares. Sua população de 1,2 bilhão de pobres passou a “enriquecer em ondas”. 500 milhões ainda são pobres, 500 milhões atingiram o nível de classe média e 250 milhões já tem poder aquisitivo de classe média alta. O plano da China: chegar em 2020 com 1,4 bilhão no piso de classe média alta (padrão belga de vida).
No campo cultural a China também é um fenômeno. Além de ser a mais velha civilização mundial, é detentora de inúmeras invenções que fazem parte do nosso cotidiano como a pólvora, o sistema decimal, a acupuntura, o ferro fundido, a bússola, o sismógrafo o papel e a tinta nanquim. No cinema a China conseguiu a façanha de ter a maior bilheteria da semana com o filme ‘Hero’ todo falado em chinês, faturando US$ 17,8 milhões nos seus três primeiros dias de exibição nos Estados Unidos.
A visão brasileira de aproximação com a China, leva em consideração todos estes fatores acima mencionados. A importância chinesa vem crescendo e o Brasil não poderia deixar de perceber. Afinal, a exportação brasileira para o país do Sol Nascente (China) é hoje, em sua maioria, de soja e ferro. E o que é que o Brasil têm a oferecer?
O Brasil tem tecnologia no campo das grandes siderurgias e de combustíveis menos poluentes (álcool); tem o maior rebanho bovino verde (imune à doença da vaca louca); tem sucesso na aviação regional com aviões de pequeno e médio porte; tem fartura de minérios para as indústrias de base. Isso são algumas das coisas que fazem arregalarem os olhos dos chineses.
[i] Definição dada por Ignácio Ramonet no editorial do Le Monde Diplomatique, Ed nº 55
[ii] Está situada entre a Grã-Bretanha e a Itália (depois de Estados Unidos, Japão, Alemanha e França) e deverá passar a integrar o G8, grupo dos países mais industrializados que, além dos já citados, inclui o Canadá e a Rússia.
[iii] Segundo a especialista Maryam Khelili, nessa data os seis países mais prósperos do mundo serão a China, os Estados Unidos, a Índia, o Japão, o Brasil e a Rússia.
25 de ago. de 2004
23 de ago. de 2004
O que é democracia?
O que é, afinal, a democracia?
É preciso questionar a democracia para podermos reiventá-la e não permitir que seja pervertida pelo poder econômico e financeiro que não é nem eleito pelo voto popular nem controlado pelos cidadãos
José Saramago
Leia o brilhante artigo do nobel português que desseca o conceito de democracia tão em voga de que seja a forma perfeita de sistema de governo. Devemos analisar este conceito e sua utilidade para saber se vale a pena torná-la obrigatória e universal.
17 de ago. de 2004
Anúncio na TVE pode?
Anúncio na TVE pode?
E pode anunciar na TVE?, pergunta a propaganda. E se apressa em responder: “Claro que pode. Afinal a TVE é uma emissora democrática. Aberta tanto para o público como para os anunciantes”. O anúncio é da TVE da Bahia, pertencente ao governo daquele Estado. É mais descarnado que o comportamento de outras televisões que deveriam ser públicas, mas que se distanciam cada vez mais desse objetivo, funcionando com critérios mercantis.
Nesse caso, a TVE da Bahia explicita a concepção que tem da democracia. Coerente com o caráter que a democracia assumiu no período de hegemonia neoliberal, democracia se identifica com o mercado, demonstra que é ‘democrática’, não discriminando os anunciantes. Anunciantes significa financiador, com as conseqüências correspondentes.
O que isso significa? O que significa a presença de anunciantes nos órgãos de imprensa? Significa um forte condicionamento, que materializa a contradição central da mídia privada nas sociedades capitalistas: desempenham um caráter público, mas são empresas privadas, movidas pelo lucro.
Aceitar anúncios privados parece algo óbvio, positivo. Afinal de contas, o próprio governo anuncia que vai substituir uma reforma tributária justa, que faça pagar impostos o sistema bancário, que aufere lucros gigantescos, pela tentativa de captar recursos no setor privado – através do chamado PPP – parceria público-privado – para obras de responsabilidade do Estado. O que faz aqui é introduzir a lógica privada, a expectativa de auferir de lucro na esfera estatal, que deveria se orientar pelo direito das pessoas, isento de mecanismos de mercado. Ao fazer, o governo tem que retribuir os investimentos privados com garantias e polpudos retornos, até porque compete com outras possibilidades de investimento, inclusive na Bolsa de Valores, onde os capitais não pagam impostos, conseguem maiores retornos existentes, com uma liquidez total. Só mesmo oferecendo condições ainda mais favoráveis – se é que elas existem – é que o governo poderia obter captações de recursos, o que dificilmente existirá.
Empresas de jornalismo vendem ações no mercado, acreditando que apenas aumentaria seu capital, sem contrapartidas. Essa atitude do Le Monde gerou um debate com os dirigentes do Le Mode Diplomatique, no ano passado, em que se mencionava, por exemplo, que o Financial Times havia tido um excelente desempenho no ano anterior, mas os acionistas exigiram o retorno de seus investimentos e o jornal acabou mandando embora uma quantidade de jornalistas. Denunciava-se a perda de autonomia mantida em um jornal como Le Monde Diplomatique, em que a publicidade não é maior que 5 por cento das rendas do jornal e em que ações estão repartidas entre o proprietário original, o Le Monde, os jornalistas da redação e uma associação de apoio dos leitores, de forma que o redator chefe nunca seja nomeado fora das indicações dos jornalistas e da associação dos leitores.
A experiência negativa da TV Cultura revela como, no caso das TVs estatais, sua programação passa a depender da disposição dos anunciantes, perdendo sua autonomia, porque as agências de publicidade passam a escolher os espaços para os quais serão destinados os anúncios. O ‘mercado’ passa a interferir, de forma cada vez mais forte, conforme o Estado se retira de sua responsabilidade de promover a cultura e a informação de forma democrática.
O ‘mercado’ revela assim sua face antidemocrática, dado que seus interesses estão voltados para a multiplicação das vendas e do lucro e não se orientam pela qualidade da programação. Uma mídia democrática é uma mídia pública – nem estatal, nem mercantil. Financiada pelos recursos públicos, mediante mecanismos de orçamento participativo e não submetida aos mecanismos de mercado.
Emir Sader – Caros Amigos nº 89 – pg 28
E pode anunciar na TVE?, pergunta a propaganda. E se apressa em responder: “Claro que pode. Afinal a TVE é uma emissora democrática. Aberta tanto para o público como para os anunciantes”. O anúncio é da TVE da Bahia, pertencente ao governo daquele Estado. É mais descarnado que o comportamento de outras televisões que deveriam ser públicas, mas que se distanciam cada vez mais desse objetivo, funcionando com critérios mercantis.
Nesse caso, a TVE da Bahia explicita a concepção que tem da democracia. Coerente com o caráter que a democracia assumiu no período de hegemonia neoliberal, democracia se identifica com o mercado, demonstra que é ‘democrática’, não discriminando os anunciantes. Anunciantes significa financiador, com as conseqüências correspondentes.
O que isso significa? O que significa a presença de anunciantes nos órgãos de imprensa? Significa um forte condicionamento, que materializa a contradição central da mídia privada nas sociedades capitalistas: desempenham um caráter público, mas são empresas privadas, movidas pelo lucro.
Aceitar anúncios privados parece algo óbvio, positivo. Afinal de contas, o próprio governo anuncia que vai substituir uma reforma tributária justa, que faça pagar impostos o sistema bancário, que aufere lucros gigantescos, pela tentativa de captar recursos no setor privado – através do chamado PPP – parceria público-privado – para obras de responsabilidade do Estado. O que faz aqui é introduzir a lógica privada, a expectativa de auferir de lucro na esfera estatal, que deveria se orientar pelo direito das pessoas, isento de mecanismos de mercado. Ao fazer, o governo tem que retribuir os investimentos privados com garantias e polpudos retornos, até porque compete com outras possibilidades de investimento, inclusive na Bolsa de Valores, onde os capitais não pagam impostos, conseguem maiores retornos existentes, com uma liquidez total. Só mesmo oferecendo condições ainda mais favoráveis – se é que elas existem – é que o governo poderia obter captações de recursos, o que dificilmente existirá.
Empresas de jornalismo vendem ações no mercado, acreditando que apenas aumentaria seu capital, sem contrapartidas. Essa atitude do Le Monde gerou um debate com os dirigentes do Le Mode Diplomatique, no ano passado, em que se mencionava, por exemplo, que o Financial Times havia tido um excelente desempenho no ano anterior, mas os acionistas exigiram o retorno de seus investimentos e o jornal acabou mandando embora uma quantidade de jornalistas. Denunciava-se a perda de autonomia mantida em um jornal como Le Monde Diplomatique, em que a publicidade não é maior que 5 por cento das rendas do jornal e em que ações estão repartidas entre o proprietário original, o Le Monde, os jornalistas da redação e uma associação de apoio dos leitores, de forma que o redator chefe nunca seja nomeado fora das indicações dos jornalistas e da associação dos leitores.
A experiência negativa da TV Cultura revela como, no caso das TVs estatais, sua programação passa a depender da disposição dos anunciantes, perdendo sua autonomia, porque as agências de publicidade passam a escolher os espaços para os quais serão destinados os anúncios. O ‘mercado’ passa a interferir, de forma cada vez mais forte, conforme o Estado se retira de sua responsabilidade de promover a cultura e a informação de forma democrática.
O ‘mercado’ revela assim sua face antidemocrática, dado que seus interesses estão voltados para a multiplicação das vendas e do lucro e não se orientam pela qualidade da programação. Uma mídia democrática é uma mídia pública – nem estatal, nem mercantil. Financiada pelos recursos públicos, mediante mecanismos de orçamento participativo e não submetida aos mecanismos de mercado.
Emir Sader – Caros Amigos nº 89 – pg 28
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Expo Brasil-China
Nossa grande mídia mostra porque é tendenciosa, estamos a pouco tempo de um grandíssimo evento internacional, uma Expo Brasil-China, onde vamos mostrar o que o Brasil tem a oferecer neste novo milênio ao enorme mercado consumidor chinês. E a última notícia sobre este evento é datada de 12 de julho de 2004.
Se fosse no governo FHC, seriam cadernos especiais e tudo o mais. O problema é que a ave de bicos longos e de negra plumagem ficou alvoroçada com a repercussão internacional da 'real politik' tupiniquim atual. E como a a mídia brasileira é tendenciosa, jogou este evento para escanteio. Vão falar sobre as Olimpíadas e depois vão minimizar a expo. Tudo para ver se continuam a meter o malho no governo e fazer com que não se dê tão bem nas eleições que se avizinham.
Expo Brasil-China
Entre os dias 31 de agosto a 9 de setembro de 2004 ocorre a expo Brasil-China, um evento destinado a expandir o conhecimento sobre nosso País e seus mercados, gerar oportunidades de negócios e investimentos, além de incentivar parcerias estratégicas entre Brasil e China, especialmente nos seguintes setores: agropecuário, construção civil, moveleiro, mineração, têxtil e turismo.
Entre 1980 e 2003, a China deu um salto. Seu PIB subiu de 240 bilhões para 1,3 trilhão de dólares. Seu comércio externo pulou de 40 para 800 bilhões de dólares. Sua população de 1,2 bilhão de pobres passou a “enriquecer em ondas”. 500 milhões ainda são pobres, 500 milhões atingiram o nível de classe média e 250 milhões já tem poder aquisitivo de classe média alta. O plano da China: chegar em 2020 com 1,4 bilhão no piso de classe média alta (padrão belga de vida).Desse modo, o Brasil está diante de um país cujo mercado, nos próximos 20 a 30 anos, apresentará forte demanda de produtos e capitais, e forte oferta de equipamentos, tecnologias e capitais. O comércio Brasil – China já saltou de 2 para 8 bilhões de dólares, mas ainda há um vasto campo de oportunidades para novos saltos.
Saiba mais sobre o evento
Se fosse no governo FHC, seriam cadernos especiais e tudo o mais. O problema é que a ave de bicos longos e de negra plumagem ficou alvoroçada com a repercussão internacional da 'real politik' tupiniquim atual. E como a a mídia brasileira é tendenciosa, jogou este evento para escanteio. Vão falar sobre as Olimpíadas e depois vão minimizar a expo. Tudo para ver se continuam a meter o malho no governo e fazer com que não se dê tão bem nas eleições que se avizinham.
Expo Brasil-China
Entre os dias 31 de agosto a 9 de setembro de 2004 ocorre a expo Brasil-China, um evento destinado a expandir o conhecimento sobre nosso País e seus mercados, gerar oportunidades de negócios e investimentos, além de incentivar parcerias estratégicas entre Brasil e China, especialmente nos seguintes setores: agropecuário, construção civil, moveleiro, mineração, têxtil e turismo.
Entre 1980 e 2003, a China deu um salto. Seu PIB subiu de 240 bilhões para 1,3 trilhão de dólares. Seu comércio externo pulou de 40 para 800 bilhões de dólares. Sua população de 1,2 bilhão de pobres passou a “enriquecer em ondas”. 500 milhões ainda são pobres, 500 milhões atingiram o nível de classe média e 250 milhões já tem poder aquisitivo de classe média alta. O plano da China: chegar em 2020 com 1,4 bilhão no piso de classe média alta (padrão belga de vida).Desse modo, o Brasil está diante de um país cujo mercado, nos próximos 20 a 30 anos, apresentará forte demanda de produtos e capitais, e forte oferta de equipamentos, tecnologias e capitais. O comércio Brasil – China já saltou de 2 para 8 bilhões de dólares, mas ainda há um vasto campo de oportunidades para novos saltos.
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16 de ago. de 2004
Conflito de interesses
Conflito de interesses
por Ilimar Franco - 16/08/2004
A criação dos conselhos de jornalismo, proposta pelo governo Lula e pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), está trazendo à luz o fosso que separa as atividades jornalísticas e de assessoria de imprensa. O presidente da Radiobrás, Eugênio Bucci, já havia chamado a atenção para este problema no livro “Sobre Ética e Imprensa”. Lá, Bucci afirma: “Em Portugal, que está à frente do Brasil nessa matéria, o jornalista é impedido pela Comissão da Carteira de Jornalista de exercer assessoria de imprensa e atividades publicitárias. Quando se filia a esta entidade, o profissional tem que devolver a carteira se for trabalhar como assessor de imprensa”. Mais adiante, diz sobre o Brasil: “Como os sindicatos congregam sob um mesmo código os profissionais das duas áreas tendem a ocultar os conflitos entre os dois campos”. E sugere que sejam feitos códigos de ética distintos. Os repórteres brasileiros vivem um dilema: submeter-se às regras dos assessores de imprensa ou criar entidades que defendam a sua atividade profissional.
por Ilimar Franco - 16/08/2004
A criação dos conselhos de jornalismo, proposta pelo governo Lula e pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), está trazendo à luz o fosso que separa as atividades jornalísticas e de assessoria de imprensa. O presidente da Radiobrás, Eugênio Bucci, já havia chamado a atenção para este problema no livro “Sobre Ética e Imprensa”. Lá, Bucci afirma: “Em Portugal, que está à frente do Brasil nessa matéria, o jornalista é impedido pela Comissão da Carteira de Jornalista de exercer assessoria de imprensa e atividades publicitárias. Quando se filia a esta entidade, o profissional tem que devolver a carteira se for trabalhar como assessor de imprensa”. Mais adiante, diz sobre o Brasil: “Como os sindicatos congregam sob um mesmo código os profissionais das duas áreas tendem a ocultar os conflitos entre os dois campos”. E sugere que sejam feitos códigos de ética distintos. Os repórteres brasileiros vivem um dilema: submeter-se às regras dos assessores de imprensa ou criar entidades que defendam a sua atividade profissional.
Um bom conselho
Um bom conselho
Quando o Olavo de Carvalho é contra, eu começo a pensar que algo de bom há. E quando o Ali Kamel ou a Helena Chagas corroboram com as idéias do Olavo é que tenho a certeza. O CFJ pode estar sendo mal escrito, mas que é uma boa idéia. Ah, isso é.
Quando o Olavo de Carvalho é contra, eu começo a pensar que algo de bom há. E quando o Ali Kamel ou a Helena Chagas corroboram com as idéias do Olavo é que tenho a certeza. O CFJ pode estar sendo mal escrito, mas que é uma boa idéia. Ah, isso é.
13 de ago. de 2004
CONVOCAÇÃO Conselho Federal de Jornalismo
..::.::-----CONVOCAÇÃO-----::.::..
Debate sobre o Conselho Federal de Jornalismo
Botando os pingos nos is
A mídia brasileira perdeu, nos últimos dias, uma excelente oportunidade de mostrar seu apreço pela liberdade de imprensa e de expressão. Ao noticiar o projeto de criação do Conselho Federal de Jornalismo, a maioria dos grandes jornais e revistas foi absolutamente parcial. Textos que deveriam estar nos editoriais e não no noticiário recorreram paradoxalmente ao princípio sagrado da pluralidade e da liberdade de imprensa para desprezar o contraditório e o rico debate que o projeto abre no Jornalismo brasileiro. O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro protesta contra a desonestidade intelectual que tem pautado as reportagens sobre o tema e convoca seus associados para reiniciar um grande debate sobre o Conselho Federal de Jornalismo no próximo dia 21, sábado, a partir das 10 h, na nossa sede (Rua Evaristo da Veiga, 16/17º andar).
Sem prejuízo do debate, e sem desmerecer os que já se consideram suficientemente bem informados para combater a proposta de criação do CFJ, o sindicato se sente no dever de esclarecer pontos fundamentais que a grande imprensa, em sua batalha incansável contra as medidas de regulamentação profissional, tem ocultado ou aos quais não tem dado o justo destaque.
As notícias apresentam o projeto do CFJ como uma ação do governo federal inserida em uma saga ditatorial que teria começado com a Lei da Mordaça, a qual abominamos, passado pela tentativa destrambelhada de expulsar um correspondente estrangeiro, à qual fizemos as mais duras críticas, e culminado com a reação do presidente e alguns ministros às investigações sobre o presidente do Banco Central, pelo qual não nutrimos qualquer simpatia. Ou seja, na ânsia de combater o CFJ, a imprensa exercitou sua habilidade em misturar alhos com bugalhos e jogou na conta de um suposto projeto de autoritarismo petista uma proposta que os 31 sindicatos de jornalistas filiados à Federação Nacional dos Jornalistas começaram a formular antes mesmo da Assembléia Nacional Constituinte, de 1988. Naquela ocasião, o debate começou a despontar na categoria por iniciativa dos profissionais de São Paulo no âmbito de sua entidade mais representativa, o sindicato. A discussão só ganharia vulto nacional quase uma década depois, no Congresso Nacional dos Jornalistas de 1996, em Porto Alegre.
Mesmo correndo o risco inerente a qualquer simplificação, podemos tentar resumir o pensamento dos primeiros defensores de um conselho ou uma ordem, nos moldes da Ordem dos Advogados do Brasil ou dos conselhos federais de Medicina, Engenharia e Economia. Muito antes da violenta onda de precarização do nosso mercado de trabalho, com a “brilhante” idéia das terceirizações em massa para burlar as leis trabalhistas, e dos ataques contundentes à exigência do diploma para o exercício da profissão, os precursores do Conselho, ou da Ordem dos Jornalistas do Brasil, sustentavam que os jornalistas brasileiros careciam de um instrumento eficaz para fazer frente às desregulamentações. Um instrumento que também tivesse força para defender a dignidade dos profissionais honestos contra as práticas nefastas daquela parcela irresponsável da imprensa que usa seu poder para se locupletar de favores ou achacar as vítimas das denúncias negociando silêncios e ameaçando com investigações dirigidas. Todo jornalista experiente sabe do que estamos falando.
Naquela ocasião o projeto, como agora, suscitou naturalmente reações contrárias entre os próprios sindicatos e dirigentes da Fenaj. Em qualquer debate deste gênero no mundo é natural algum nível de tensão entre as liberdades públicas e a proteção dos direitos individuais, ambos princípios universais da democracia e, no caso do Brasil, expressos na Constituição. A justificada preocupação com possíveis cerceamentos também foi levantada pelos sindicalistas em diversos debates. Mas o movimento sindical não se deixou intimidar pelos tabus, interessado que estava em prosseguir na luta contra a esculhambação dos patrões em relação à regulamentação profissional.
Não se pode esquecer que o Conselho representa um risco evidente de enfraquecimento dos sindicatos e da própria Fenaj. As profissões que conseguiram se auto-regular através de conselhos independentes não têm sindicatos tão fortes e representativos. A OAB, para ficarmos no exemplo mais conhecido, é muito mais poderosa do que qualquer sindicato de advogados. O mesmo acontece com os médicos, engenheiros, arquitetos, psicólogos etc. Foi preciso muito debate em todos os sindicatos e mais alguns congressos nacionais de jornalistas até que a categoria chegasse à conclusão de que a criação do Conselho apresentava mais vantagens para a valorização da profissão do que riscos à liberdade de imprensa ou ao próprio movimento sindical. A proposta de criação do CFJ não foi encaminhada pela Fenaj ao PT ou ao governo Lula, mas ao governo Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, em setembro de 2002. Pelo simples fato de que, pela Constituição, cabe exclusivamente ao Poder Executivo Federal a prerrogativa de propor a criação de uma autarquia. Isso não significa que a OAB ou o Conselho dos médicos seja controlado pelo governo. Muito pelo contrário. Quantas foram as ações que a OAB impetrou contra ditadores de plantão e medidas açodadas ou ilegais do governo? O incômodo dos patrões na comparação com a OAB está em outro plano. Por exemplo: alguém imagina um estagiário de Direito atuando como profissional junto aos tribunais? Ou um grande escritório de advocacia que demita os profissionais e contrate não diplomados, como acontece cada vez mais nas redações?
A idéia era exatamente a de que a regulamentação do exercício profissional ficasse a cargo de uma entidade independente dos patrões e do governo. Essa autarquia, o Conselho Federal de Jornalismo, seria muito mais independente do governo do que a instância que hoje toma decisões sobre a concessão ou não de registros profissionais, que é o Ministério do Trabalho sujeito sempre às influências das correntes político-partidárias que dominam suas seções regionais. Os sindicatos que perderam projeção política com a criação do Conselho, não têm instrumentos eficazes para barrar as práticas ilegais da grande parcela do patronato que desconsidera ao bel prazer as leis trabalhistas. Muito menos para exigir a observância de procedimentos éticos mínimos por parte dos jornalistas. Dotar a sociedade de um mecanismo de proteção da informação de qualidade que seja estabelecido por quem entende do assunto - jornalistas profissionais - nos pareceu uma iniciativa muito mais segura do que a simples omissão, o “deixar como está para ver como é que fica” ou, como alegam alguns críticos do projeto, deixar que os leitores e a “lei do mercado” punam as más publicações e os jornalistas antiéticos (ou não-jornalistas). Defender que o mercado por si só controle os excessos e a falta de honestidade na informação e no exercício profissional é quase como acreditar na lei da selva, em um liberalismo anacrônico saudoso da revolução industrial e seus desrespeitos aos trabalhadores. Na nossa opinião não há postura filosófica mas jurássica do que acreditar apenas no livre mercado para regular as relações trabalhistas.
É verdade que temos a opção de continuar convivendo apenas com o controle dos patrões, das empresas e seus interesses muitas vezes duvidosos. Muitos argumentam que os jornalistas já têm controles demais, como a própria Justiça ou o famigerado entulho autoritário da Lei de Imprensa, um mecanismo que só estimula a indústria de danos morais, que cerceia e amedronta o jornalismo investigativo. São argumentos válidos e que merecem nosso respeito. Inaceitável é desmerecer ou desqualificar a legitimidade dos que preferem ter sua atividade profissional regulada e fiscalizada não apenas pela selvageria, mas por uma categoria organizada, independente, em sua essência comprometida com a pluralidade, a liberdade e a ética.
As críticas ao projeto defendido pelos sindicatos do Brasil inteiro têm dado ênfase apenas à paranóia do cerceamento à liberdade de imprensa e quase nenhuma linha se refere à necessidade de barrar o lamaçal de negociatas e ilegalidades às quais recorrem muitos veículos sob o pretexto de driblar a crise econômica. Não é à toa que a confiança da sociedade na imprensa está abalada. Continuar encarando esse comportamento como algo natural e inerente à liberdade de imprensa equivale a justificar a atitude de um policial que se vende ao crime porque ganha salários injustos. Onde estão as análises da mídia sobre o fenômeno da corrupção na imprensa e o desrespeito à cláusula de consciência, práticas que ameaçam muito mais a credibilidade da nossa profissão e a liberdade de expressão do que um conselho profissional?
Carimbar os defensores do Conselho Federal de Jornalismo como uma espécie de nostálgicos das ditaduras, adeptos da censura, governistas inconformados com as críticas, defensores de cassações e perseguições, é um sofisma condenável pela desonestidade intelectual que embute. Os que acreditam na conveniência da criação de um conselho para substituir a lei da selva não apontam os críticos do projeto como pelegos que se alinham aos patrões contra seus próprios sindicatos, nem como corruptos ou caluniadores contumazes amedrontados pela possibilidade de ter suas atividades questionadas como em qualquer outra profissão que lida com o interesse público. Comparar o Conselho Federal de Jornalismo ao DIP de Getúlio Vargas tem sido outra figura de retórica agressiva, pueril e autoritária, pois pega carona na onda de interpretações desrespeitosas que ameaçam impor um pensamento único com a força unânime da grande imprensa. O Conselho não quer uma mídia politicamente controlada, como sugerem alguns dos que caíram de pára-quedas no debate. Mas tampouco nos conformamos com uma mídia descontroladamente entregue a achaques e ilicitudes, sem controle social e sem pluralidade.
O jornalista não se interessa por participar das instâncias coletivas de sua profissão merece todo respeito. Mesmo que as ações sindicais, com as negociações salariais e a assistência jurídica, beneficiem a todos, nenhum profissional tem obrigação de militar no sindicato ou agir pela promoção da coletividade. Mas isso não dá a ninguém o direito de desqualificar os que insistem em se dedicar às causas coletivas. Há muitas pessoas de bem que sacrificam suas vidas pessoais para exigir o cumprimento dos direitos, conquistar vitórias para a categoria e a sociedade. São pessoas bem intencionadas e não apegadas às burocracias ou a esquemas cartoriais, como querem insinuar alguns críticos do Conselho. Comparar os militantes das causas coletivas a censores ou castradores é ofensivo e pouco edificante em debates cruciais como este, para o qual convocamos não só nossos associados, mas todos os interessados.
O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro foi um dos primeiros a aderir ao movimento iniciado em São Paulo para debater a criação do Conselho Federal, mas em nenhum momento defendemos uma tramitação em regime de urgência do projeto, muito menos sua aprovação sem o esclarecimento da sociedade. Também temos restrições ao texto encaminhado pelo governo, o que não pode ser usado pelo patronato para desqualificar a idéia. Como a tramitação no Congresso só deverá acontecer em 2005, temos tempo para ampliar o debate e nos cercar de todos os cuidados necessários à proteção do sagrado direito de expressão e da liberdade de imprensa. Teremos também oportunidade de incluir entre as atribuições do Conselho instrumentos mais eficazes para coibir os proprietários dos veículos de comunicação que não se sujeitarem às leis e aos preceitos éticos.
O que não podemos é ficar paralisados diante de detalhes aos quais a grande imprensa se agarra para prejudicar o debate. As expressões contidas no projeto podem ser modificadas, nenhuma esperteza semântica pode cercear a liberdade da imprensa. O cerne da questão é outro. E nada tem a ver com a idéia de que uma porção de jornalistas com saudades da ditadura vai se reunir num conselho para ficar lendo os jornais e cassando quem defende esta ou aquela idéia. Isso é simplesmente ridículo. Talvez possamos resumir em três os grandes objetivos do Conselho, que levaram a Fenaj e os 31 sindicatos de jornalistas do Brasil a defenderem sua criação: regular o acesso à profissão de jornalista, fiscalizar o exercício profissional e zelar pelo cumprimento do código de ética. Estamos alinhados com essas três diretrizes. A hipótese de os patrões conseguirem cassar a exigência do diploma na Justiça em uma de suas incansáveis tentativas torna ainda maior a conveniência de termos um conselho para substituir a lei da selva, do patronato ou da burocracia estatal. O sindicato é favorável ao Conselho, mas como instituição radicalmente democrática é evidente que adotará a decisão dos seus associados, naturalmente depois de muitas discussões na instância adequada – não nas páginas de uma imprensa sem compromisso com a imparcialidade e a pluralidade, como ficou flagrante nas notícias sobre o encaminhamento do projeto.
Acreditamos que o bom senso prevalecerá no debate que deve ser travado entre os jornalistas e a sociedade, de preferência longe do rolo compressor de empresários amedrontados pela idéia de uma instância que ameace a continuidade de práticas danosas à qualidade da informação e, aí sim, à liberdade de imprensa.
Compareça ao debate. Sábado, dia 21 de agosto, na sede do seu sindicato, a partir das 10 h.
Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro
10 de ago. de 2004
Citar é preciso, entender não é preciso
Citar é preciso, entender não é preciso
Sérgio Rodrigues - NO MÏNIMO
Sérgio Rodrigues - NO MÏNIMO
06.08.2004 Lula não está só. A frase que ele atribuiu esta semana a Chico Buarque em mancada que já nasce clássica – “navegar é preciso, viver não é preciso” – é uma das mais repetidas do Brasil quando se trata de embelezar o discurso com uma leve fumaça de “erudição” segura e testada, do tipo que não deixa ninguém se sentindo ignorante. Talvez perca apenas para os “quinze minutos de fama” de Andy Warhol, a citação preferida de nossa imprensa cultural. Ao contrário desta, porém, tem uma história controversa e quase tão velha quanto a cultura do Ocidente. Lula está em companhia numerosa também quando erra o seu autor.
Verdade que Chico Buarque foi uma originalidade do presidente, mas é comum ouvir que a frase “navegar é preciso, viver não é preciso” saiu da caneta de Caetano Veloso, que de fato a usou no estribilho de “Os argonautas”, bela e intrigante canção de 1969: “O barco, noite no teu tão bonito/ Sorriso solto, perdido/ Horizonte, madrugada”. No entanto, se recuarmos um pouco mais no tempo, encontraremos outro poeta por trás do verso de Caetano: Fernando Pessoa, que numa nota manuscrita publicada postumamente como introdução à sua obra poética – apareceu em livro pela primeira vez em 1960 – diz: “Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa: ‘Navegar é preciso; viver não é preciso’. Quero para mim o espírito desta frase, transformada a forma para a casar com o que eu sou: Viver não é necessário; o que é necessário é criar”.
Foi até aí que chegou “O Globo” ao apontar o erro de Lula na edição de ontem, dia 5. O verso, segundo o jornal, não seria de Chico mas do homem dos heterônimos. Uma meia verdade que, além de não levar em conta que o texto do poeta português sequer foi escrito em versos, ignora que Pessoa situa explicitamente a frase no passado, embora com alguma imprecisão – quem seriam aqueles “navegadores antigos”? Seguindo um pouco mais longe nessa rota, vamos encontrar o verso que Lula atribui a Chico – e outros a Caetano ou Pessoa – cumprindo o glorioso papel de lema da Escola de Sagres, o centro intelectual de onde partiram as grandes navegações portuguesas. Fim da viagem?
Não tão depressa. Navegar ainda é preciso, e a todo pano, para chegar até a Antiguidade tardia em que Plutarco, o filósofo e historiador grego, homem do primeiro século da era cristã, escreveu suas “Vidas dos homens ilustres”. É ali, pelo menos em tese, que a frase que não é de Chico – nem de Caetano, nem de Pessoa, nem de D. Henrique – aparece por escrito pela primeira vez. Surge na boca do general grego Pompeu, o Grande, um dos biografados de Plutarco, como exortação a uma tripulação covarde que temia embarcar no navio enquanto grossa tempestade se armava no horizonte. Ou seja: também não foi Plutarco, propriamente, o criador da pérola. Caberia a Pompeu essa autoria? Talvez, mas mesmo assim resta uma dúvida razoável: e se o general, como Lula, também estivesse citando alguém?
Eis, claro, uma questão que não vai mudar os rumos da República, ainda que Lula tivesse bastante a ganhar com a leitura atenta de outro livro de Plutarco, o clássico “Da maneira de distinguir o bajulador do amigo”. Lançado no Brasil pela Martins Fontes – junto com “Como tirar proveito de seus inimigos”, que dá título ao volume – o pequeno tratado moral de Plutarco conta com capítulos sugestivos como Os riscos do amor-próprio, Perigo dos louvores que dão ao vício o nome da virtude, Devemos incluir-nos na crítica que dirigimos aos outros. Leitura altamente recomendável, como se vê – mas essa é outra história.
Por enquanto, que nos baste transformar o episódio menor num grande pretexto para refletir sobre este lema-paráfrase da nossa cultura massificada, fraturada e veloz: citar é preciso, entender não é preciso. Até o “Estado de S. Paulo”, o único dos grandes jornais a informar corretamente a seus leitores que a frase citada por Lula é de Pompeu, tropeça num dos mitos que cercam essa peça de erudição prêt-à-porter ao dizer que Fernando Pessoa explorou a ambigüidade de “preciso” em nossa língua – uma palavra que quer dizer “necessário”, mas também “exato”. Como mostra o trecho ali atrás, a ambigüidade passou longe das intenções do poeta português, embora provavelmente estivesse nos planos de Caetano.
Mesmo assim, o que a frase tem de ambíguo, a possibilidade que oferece de uma leitura alternativa e até certo ponto contrária – navegar é ciência exata, viver não é –, pode ajudar a explicar o sucesso que o “verso do Chico” faz entre nós.
Verdades e mentiras
Verdades e mentiras
O ‘grande’ Ali Kamel gasta um precioso espaço no jornal para mostrar as mentiras de Michael Moore. Ponto por ponto, resolve destruir o filme ‘Farenheit 11 de Setembro’, para mostrar aos jovens a verdade escondida sob a alucinação do cineasta norte-americano que está disposto a acabar com Bush. E Ali Kamel está disposto a apoiar Bush e sua política internacional.
Desde o início da guerra no Iraque que o Kamel resolveu ser o Nicholas Kristof brasileiro e ser o baluarte brasileiro da guerra contra o terror. Utilizando de sua origem – Kamel demonstra parentesco árabe – narrou a história da nação árabe, seu surgimento e suas divisões tribais. Depois enveredou por um caminho sem volta de apoiar a guerra e suas conseqüências.
Agora volta suas baterias contra o escandalizante documentário de Michael Moore, assim como faz os conservadores norte-americanos que impediram sua distribuição pelo grupo Disney nos EUA e boicotavam os cinemas que resolvessem exibi-lo.
O pior é que o jornalista Ali Kamel cita ter pesquisado na internet e em jornais americanos, mas não deve ter feito tão bem seus deveres de casa. Ele cita que é mentira dizer que o regime Talibã nunca teve contatos com uma empresa texana, Unocal, para a construção de um gasoduto. Porém, numa rápida pesquisa, se pode constatar que a BBC reportou planos do Afeganistão de construir um gasoduto de 2 bilhões de dólares de investimento e que a Unocal era uma das empresas consorciadas, apesar da empresa oficialmente negar. Ou seja, monsieur Moore não se baseou só no Le Monde (http://news.bbc.co.uk/1/hi/business/1984459.stm)...
O jornalista?, fala, depois, que a invasão do Afeganistão foi feita sem aval da ONU e que depois de provada a culpa do regime talibã em apoiar Bin Laden e suas loucuras, o mundo rendeu-lhe homenagens. E que fez o mesmo com o Iraque, a diferença é que não acharam provas contra Saddam de armas em massa, pois se assim o fosse, o Bush seria novamente ‘herói’. A diferença é que não acharam e Bush se torna um louco, um maníaco por ajudar seus petrolíferos e bélicos amigos.
E assim segue ao dizer que as tv’s norte-americanas não mostraram os horrores da guerra seguindo a mesma postura que as levaram a não exibir as atrocidades das duas torres. Mas ele se esquece de que as tv’s não exibiram seguindo uma postura de não abalar o prestígio das tropas, afinal desde a guerra do Vietnã que o exército americano não vê com bons olhos a liberdade da imprensa de mostrar seus erros.
Mas nem tudo é errado. Ele acerta ao dizer que o Iraque é hoje um front central da geopolítica norte-americana para o Oriente Médio. Um entreposto com enormes reservas de petróleo e água, as maiores riquezas que existem naquelas terras. A política norte-americana é nociva para o mundo. Se o mundo consumisse como os EUA, seria necessário quatro planetas para dar vazão à todo este impulso. E se quisermos entender o porquê do ódio contra os norte-americanos, temos que entender este funcionamento da máquina econômica mundial que mata de fome, de desesperança, naufragando nações, exterminando populações. Mas como vivemos tempos em que muita gente está cega e surda. Não quer ouvir nem ver a ameaça que nos cerca.
O ‘grande’ Ali Kamel gasta um precioso espaço no jornal para mostrar as mentiras de Michael Moore. Ponto por ponto, resolve destruir o filme ‘Farenheit 11 de Setembro’, para mostrar aos jovens a verdade escondida sob a alucinação do cineasta norte-americano que está disposto a acabar com Bush. E Ali Kamel está disposto a apoiar Bush e sua política internacional.
Desde o início da guerra no Iraque que o Kamel resolveu ser o Nicholas Kristof brasileiro e ser o baluarte brasileiro da guerra contra o terror. Utilizando de sua origem – Kamel demonstra parentesco árabe – narrou a história da nação árabe, seu surgimento e suas divisões tribais. Depois enveredou por um caminho sem volta de apoiar a guerra e suas conseqüências.
Agora volta suas baterias contra o escandalizante documentário de Michael Moore, assim como faz os conservadores norte-americanos que impediram sua distribuição pelo grupo Disney nos EUA e boicotavam os cinemas que resolvessem exibi-lo.
O pior é que o jornalista Ali Kamel cita ter pesquisado na internet e em jornais americanos, mas não deve ter feito tão bem seus deveres de casa. Ele cita que é mentira dizer que o regime Talibã nunca teve contatos com uma empresa texana, Unocal, para a construção de um gasoduto. Porém, numa rápida pesquisa, se pode constatar que a BBC reportou planos do Afeganistão de construir um gasoduto de 2 bilhões de dólares de investimento e que a Unocal era uma das empresas consorciadas, apesar da empresa oficialmente negar. Ou seja, monsieur Moore não se baseou só no Le Monde (http://news.bbc.co.uk/1/hi/business/1984459.stm)...
O jornalista?, fala, depois, que a invasão do Afeganistão foi feita sem aval da ONU e que depois de provada a culpa do regime talibã em apoiar Bin Laden e suas loucuras, o mundo rendeu-lhe homenagens. E que fez o mesmo com o Iraque, a diferença é que não acharam provas contra Saddam de armas em massa, pois se assim o fosse, o Bush seria novamente ‘herói’. A diferença é que não acharam e Bush se torna um louco, um maníaco por ajudar seus petrolíferos e bélicos amigos.
E assim segue ao dizer que as tv’s norte-americanas não mostraram os horrores da guerra seguindo a mesma postura que as levaram a não exibir as atrocidades das duas torres. Mas ele se esquece de que as tv’s não exibiram seguindo uma postura de não abalar o prestígio das tropas, afinal desde a guerra do Vietnã que o exército americano não vê com bons olhos a liberdade da imprensa de mostrar seus erros.
Mas nem tudo é errado. Ele acerta ao dizer que o Iraque é hoje um front central da geopolítica norte-americana para o Oriente Médio. Um entreposto com enormes reservas de petróleo e água, as maiores riquezas que existem naquelas terras. A política norte-americana é nociva para o mundo. Se o mundo consumisse como os EUA, seria necessário quatro planetas para dar vazão à todo este impulso. E se quisermos entender o porquê do ódio contra os norte-americanos, temos que entender este funcionamento da máquina econômica mundial que mata de fome, de desesperança, naufragando nações, exterminando populações. Mas como vivemos tempos em que muita gente está cega e surda. Não quer ouvir nem ver a ameaça que nos cerca.
3 de ago. de 2004
A flecha e o arco
A flecha e o arco
O Tarmal Pereira escreveu hoje que a denúncia contra o Casseb partiu de governistas, de petistas enfurecidos que querem a mudança da política econômica. Agora pergutem da ligação do Unibanco contra o Dirigente e aí você chegará ao arco da flecha disparada.
O pior é o colunista escrever que 'líderes esclarecidos do PSDB e do PFL' têm temor de utilizar fogo pesado contra a política econômica, por temer as suas consequências.
Será que em 2002 ele passeava pelo Egito e não viu o que aconteceu no Brasil?
O Tarmal Pereira escreveu hoje que a denúncia contra o Casseb partiu de governistas, de petistas enfurecidos que querem a mudança da política econômica. Agora pergutem da ligação do Unibanco contra o Dirigente e aí você chegará ao arco da flecha disparada.
O pior é o colunista escrever que 'líderes esclarecidos do PSDB e do PFL' têm temor de utilizar fogo pesado contra a política econômica, por temer as suas consequências.
Será que em 2002 ele passeava pelo Egito e não viu o que aconteceu no Brasil?
Andrea Henrique, monografia Portugal
Cara Andrea,
recebi o teu e-mail, tentei mandar-te uma resposta, mas a mensagem voltava com o desagradável título "Undelivered Mail Returned to Sender".
Peço que encaminhe-me outro e-mail para que possa te ajudar com sua pesquisa.
abs
Diogo
recebi o teu e-mail, tentei mandar-te uma resposta, mas a mensagem voltava com o desagradável título "Undelivered Mail Returned to Sender".
Peço que encaminhe-me outro e-mail para que possa te ajudar com sua pesquisa.
abs
Diogo
29 de jul. de 2004
BR-163 ou Transamazônica
BR-163 ou Transamazônica
"Os Estados Unidos e a Europa derrubaram a maioria de suas florestas nos últimos séculos. Quem são eles para dizer à Indonésia, ao Brasil e ao Congo para fazer o contrário?" indaga o editorial do The Economist.
"Mas o desflorestamento que é ideal para o Brasil provavelmente será maior que aquele que serviria para a humanidade como um todo. Assim, faz sentido encontrar maneiras de tornar a manutenção da floresta tão recompensadora ao Brasil quanto ao mundo."
"Quando os cálculos forem feitos, o mundo deve pagar a sua parte da conta".
Aqui está a matéria
"Os Estados Unidos e a Europa derrubaram a maioria de suas florestas nos últimos séculos. Quem são eles para dizer à Indonésia, ao Brasil e ao Congo para fazer o contrário?" indaga o editorial do The Economist.
"Mas o desflorestamento que é ideal para o Brasil provavelmente será maior que aquele que serviria para a humanidade como um todo. Assim, faz sentido encontrar maneiras de tornar a manutenção da floresta tão recompensadora ao Brasil quanto ao mundo."
"Quando os cálculos forem feitos, o mundo deve pagar a sua parte da conta".
OMBUDSMAN - longa travessia
por Marcelo Beraba - ombudsman* da Folha desde 5 de abril de 2004
Na semana em que todos os jornais noticiaram com destaque os resultados das pesquisas que mostram queda do desemprego, recuperação da renda e forte otimismo dos empresários com os rumos da economia brasileira, a Empresa Folha da Manhã, que edita a Folha, fez o caminho inverso e executou o corte mais forte de funcionários desde que entrou em crise, há mais de dois anos, por conta da explosão de uma dívida de R$ 290 milhões. A Folha não noticiou suas próprias demissões. Não é o primeiro corte que o jornal faz nem a única empresa de comunicação a fazê-lo. Mas esse "ajuste", para usar o termo caro às consultorias, tem características próprias que devem ser analisadas.
Antes, os números e informações de que disponho, sem confirmação oficial. Foram demitidos da empresa, ao longo da semana, cerca de 200 dos quase 1.300 funcionários, o que representa um corte de 18% das despesas com pessoal. Nas Redações da Folha, da Revista da Folha, do Folha Online, da Agência Folha, dos cadernos regionais, do Banco de Dados e do "Agora" foram 85 pessoas, sendo que 60 jornalistas. Na Redação da Folha, principal título da empresa, foram demitidos 35 jornalistas e alguns colunistas foram terceirizados. Nem todas as vagas serão fechadas: deverão ser contratados 13 novos profissionais, mas com salários muito mais baixos. Diferentemente de outros cortes, esse atingiu a elite do jornal. Foram demitidos cinco editores, um fato inédito na história da Folha se consideramos apenas cortes por razões financeiras. Entre os demitidos (agora ou no futuro próximo), estão vários jornalistas com mais de 20 anos de profissão e com especializações em áreas complexas, como ciências, saúde e economia. Os cortes extinguiram um produto, o caderno regional de Campinas, e, internamente, atingiram o Programa de Qualidade, um dos pilares, junto com o Programa de Treinamento, do esforço planejado de melhoria do jornal.
O Programa de Qualidade, implantado em 1996, era responsável pelo controle diário de erros gramaticais, de padronização e de digitação. Todos os seus funcionários foram demitidos ou transferidos, e o controle passará a ser feito de forma seletiva. O impacto das medidas é maior porque incide sobre outros cortes de despesas, pessoal e produtos feitos desde o início de 2002. "O leitor deve ficar atento, cobrando qualidade e equilíbrio".
E por que mais esses cortes, depois de tantos outros e no momento em que a economia brasileira parece sair da estagnação? A Folha não respondeu. Recebi do diretor de Redação, Otavio Frias Filho, por escrito, a seguinte declaração: "Lamentamos a perda de profissionais valiosos, muitos deles com longo histórico de dedicação ao jornal. Foram medidas duras, mas necessárias para assegurar ao jornal condições de vencer mais rapidamente essa conjuntura adversa -e de fazê-lo sem riscos para a independência editorial".
Há duas hipóteses possíveis para os cortes. A primeira, um forte ajuste interno para preparar a empresa para a entrada de um sócio estrangeiro, como acaba de ocorrer com o grupo Abril, que vendeu 13,8% de ações para fundos de investimento norte-americanos. A outra hipótese é, na verdade, a razão apresentada extra-oficialmente pela direção do jornal nas conversas com alguns demitidos e com os editores que sobraram. A empresa teria tomado essas medidas para apressar a liquidação da dívida do jornal. É importante a distinção: a dívida do grupo é de R$ 290 milhões, segundo reportagem publicada pela própria Folha em 15 de fevereiro. Mas a dívida do jornal é menor, e seria de R$ 160 milhões. O que se ouve é que a rentabilidade do jornal é alta (17%), os juros (20% da dívida ao ano) estão sendo pagos, mas o ritmo de abatimento da dívida é lento e ameaçador. O que a empresa pretende, portanto, com esses cortes, pelo que foi possível captar em diversas áreas do jornal, é melhorar seu resultado financeiro, se possível ainda neste ano, e encurtar o período chamado internamente de "travessia do deserto".
As demissões ocorreram depois de dois meses de trabalho da empresa de consultoria Integration, que tem escritórios em São Paulo e no Rio. Antes, o jornal tentou vender ativos, sem sucesso, e passou pela experiência da negociação, frustada até agora, com o BNDES. "O Estado", seu principal concorrente na praça de São Paulo, e a Abril também contrataram consultorias, mas fizeram seus ajustes em períodos mais longos, não de forma tão abrupta como faz agora a Folha. Depois dos cortes e mudanças que introduziu no ano passado, o "Estado" teve um resultado financeiro bem superior ao da Folha.
O futuro? O que vai acontecer com a Folha? Terá de continuar a produzir o jornal que promete -informativo, crítico, pluralista, apartidário, moderno, imprescindível- com menos gente e reduzido espaço editorial. O produto que tem sido feito já é irregular. O achatamento salarial que virá e a perda de jornalistas especializados e experientes terá conseqüências. O leitor deve ficar atento, cobrando qualidade e equilíbrio. Há um outro aspecto negativo nesse episódio, que é o silêncio do jornal. Por que não noticiou suas próprias demissões? O jornal, que tem a obrigação de cobrir as crises dos governos, das empresas públicas e das empresas privadas, optou por não soltar nenhum comunicado oficial, e isso é um erro. A sociedade reivindica, cada vez mais e com razão, transparência por parte dos meios de comunicação. A saúde financeira dos jornais interessa aos seus leitores porque está em jogo a independência e a credibilidade desses veículos que eles escolheram para comprar, se informar e interagir.
*O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
por Marcelo Beraba - ombudsman* da Folha desde 5 de abril de 2004
Na semana em que todos os jornais noticiaram com destaque os resultados das pesquisas que mostram queda do desemprego, recuperação da renda e forte otimismo dos empresários com os rumos da economia brasileira, a Empresa Folha da Manhã, que edita a Folha, fez o caminho inverso e executou o corte mais forte de funcionários desde que entrou em crise, há mais de dois anos, por conta da explosão de uma dívida de R$ 290 milhões. A Folha não noticiou suas próprias demissões. Não é o primeiro corte que o jornal faz nem a única empresa de comunicação a fazê-lo. Mas esse "ajuste", para usar o termo caro às consultorias, tem características próprias que devem ser analisadas.
Antes, os números e informações de que disponho, sem confirmação oficial. Foram demitidos da empresa, ao longo da semana, cerca de 200 dos quase 1.300 funcionários, o que representa um corte de 18% das despesas com pessoal. Nas Redações da Folha, da Revista da Folha, do Folha Online, da Agência Folha, dos cadernos regionais, do Banco de Dados e do "Agora" foram 85 pessoas, sendo que 60 jornalistas. Na Redação da Folha, principal título da empresa, foram demitidos 35 jornalistas e alguns colunistas foram terceirizados. Nem todas as vagas serão fechadas: deverão ser contratados 13 novos profissionais, mas com salários muito mais baixos. Diferentemente de outros cortes, esse atingiu a elite do jornal. Foram demitidos cinco editores, um fato inédito na história da Folha se consideramos apenas cortes por razões financeiras. Entre os demitidos (agora ou no futuro próximo), estão vários jornalistas com mais de 20 anos de profissão e com especializações em áreas complexas, como ciências, saúde e economia. Os cortes extinguiram um produto, o caderno regional de Campinas, e, internamente, atingiram o Programa de Qualidade, um dos pilares, junto com o Programa de Treinamento, do esforço planejado de melhoria do jornal.
O Programa de Qualidade, implantado em 1996, era responsável pelo controle diário de erros gramaticais, de padronização e de digitação. Todos os seus funcionários foram demitidos ou transferidos, e o controle passará a ser feito de forma seletiva. O impacto das medidas é maior porque incide sobre outros cortes de despesas, pessoal e produtos feitos desde o início de 2002. "O leitor deve ficar atento, cobrando qualidade e equilíbrio".
E por que mais esses cortes, depois de tantos outros e no momento em que a economia brasileira parece sair da estagnação? A Folha não respondeu. Recebi do diretor de Redação, Otavio Frias Filho, por escrito, a seguinte declaração: "Lamentamos a perda de profissionais valiosos, muitos deles com longo histórico de dedicação ao jornal. Foram medidas duras, mas necessárias para assegurar ao jornal condições de vencer mais rapidamente essa conjuntura adversa -e de fazê-lo sem riscos para a independência editorial".
Há duas hipóteses possíveis para os cortes. A primeira, um forte ajuste interno para preparar a empresa para a entrada de um sócio estrangeiro, como acaba de ocorrer com o grupo Abril, que vendeu 13,8% de ações para fundos de investimento norte-americanos. A outra hipótese é, na verdade, a razão apresentada extra-oficialmente pela direção do jornal nas conversas com alguns demitidos e com os editores que sobraram. A empresa teria tomado essas medidas para apressar a liquidação da dívida do jornal. É importante a distinção: a dívida do grupo é de R$ 290 milhões, segundo reportagem publicada pela própria Folha em 15 de fevereiro. Mas a dívida do jornal é menor, e seria de R$ 160 milhões. O que se ouve é que a rentabilidade do jornal é alta (17%), os juros (20% da dívida ao ano) estão sendo pagos, mas o ritmo de abatimento da dívida é lento e ameaçador. O que a empresa pretende, portanto, com esses cortes, pelo que foi possível captar em diversas áreas do jornal, é melhorar seu resultado financeiro, se possível ainda neste ano, e encurtar o período chamado internamente de "travessia do deserto".
As demissões ocorreram depois de dois meses de trabalho da empresa de consultoria Integration, que tem escritórios em São Paulo e no Rio. Antes, o jornal tentou vender ativos, sem sucesso, e passou pela experiência da negociação, frustada até agora, com o BNDES. "O Estado", seu principal concorrente na praça de São Paulo, e a Abril também contrataram consultorias, mas fizeram seus ajustes em períodos mais longos, não de forma tão abrupta como faz agora a Folha. Depois dos cortes e mudanças que introduziu no ano passado, o "Estado" teve um resultado financeiro bem superior ao da Folha.
O futuro? O que vai acontecer com a Folha? Terá de continuar a produzir o jornal que promete -informativo, crítico, pluralista, apartidário, moderno, imprescindível- com menos gente e reduzido espaço editorial. O produto que tem sido feito já é irregular. O achatamento salarial que virá e a perda de jornalistas especializados e experientes terá conseqüências. O leitor deve ficar atento, cobrando qualidade e equilíbrio. Há um outro aspecto negativo nesse episódio, que é o silêncio do jornal. Por que não noticiou suas próprias demissões? O jornal, que tem a obrigação de cobrir as crises dos governos, das empresas públicas e das empresas privadas, optou por não soltar nenhum comunicado oficial, e isso é um erro. A sociedade reivindica, cada vez mais e com razão, transparência por parte dos meios de comunicação. A saúde financeira dos jornais interessa aos seus leitores porque está em jogo a independência e a credibilidade desses veículos que eles escolheram para comprar, se informar e interagir.
*O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
13 de jul. de 2004
8 de jul. de 2004
Che Guevara
Che
Che fala sobre a situação em Congo em 1965, onde pára-quedistas franceses atacaram Stanleyville, para derrubar o presidente socialista Lumumba e sobre a crueldade do imperialismo
[1.0 MB - 1:35 minuto]
"Tomaron por asalto la ciudad de Stanleyville, masacraron una cantidad grande de ciudadanos y, como acto último, después de haberlos ultimado bajo la estatua del prócer Lumumba, volaron la estatua del ex-presidente del Congo. Eso nos indica a nosotros dos cosas. Primero, la bestialidad imperialista... bestialidad que no tiene una frontera determinada ni pertenece a un país determinado. Bestias fueron las hordas hitleristas, como bestias son los norteamericanos hoy, como bestias son los paracaidistas belgas, como bestias fueron los imperialistas franceses en Argelia. Porque es la naturaleza del imperialismo la que bestializa a os hombres, la que los convierte en fieras sedientas de sangre que están dispuestas a degollar, asesinar, a destruir hasta la última imagen de un revolucionario, de un partidario de un régimen que haya caído bajo su bota o que luche por su libertad."
Clique aqui para escutar
Tradução do texto? Clique aqui
Fonte: http://www.comunismo.com.br/
Che fala sobre a situação em Congo em 1965, onde pára-quedistas franceses atacaram Stanleyville, para derrubar o presidente socialista Lumumba e sobre a crueldade do imperialismo
[1.0 MB - 1:35 minuto]
"Tomaron por asalto la ciudad de Stanleyville, masacraron una cantidad grande de ciudadanos y, como acto último, después de haberlos ultimado bajo la estatua del prócer Lumumba, volaron la estatua del ex-presidente del Congo. Eso nos indica a nosotros dos cosas. Primero, la bestialidad imperialista... bestialidad que no tiene una frontera determinada ni pertenece a un país determinado. Bestias fueron las hordas hitleristas, como bestias son los norteamericanos hoy, como bestias son los paracaidistas belgas, como bestias fueron los imperialistas franceses en Argelia. Porque es la naturaleza del imperialismo la que bestializa a os hombres, la que los convierte en fieras sedientas de sangre que están dispuestas a degollar, asesinar, a destruir hasta la última imagen de un revolucionario, de un partidario de un régimen que haya caído bajo su bota o que luche por su libertad."
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Fonte: http://www.comunismo.com.br/
2 de jul. de 2004
Well, well
Será que muda?
Em recente pesquisa, o Wall Street Journal/NBC constatou que a maioria dos americanos acredita que a guerra contra o Iraque só fez aumentar o perigo de um ataque terrorista nos EUA e no mundo. 47% acredita que piorou, 13% que melhorou e 38% acredita que não faz diferença. Bob Herbert pega fundo neste artigo sobre a guerra e suas consequências aos cidadãos estadunidenses. Ah, não sabes quem é Bob Herbert? Clique aqui então.
No artigo do Paul Krugman podemos ter uma idéia do que muda no cenário dos EUA: o filme de Michael Moore. Aquele documentário 'Fahrenheit 9/11', onde o cineasta amealhou o Cannes e estoura as bilheterias dos Estados Unidos, contando ao operários, proletários, os do andar de baixo da sociedade, a conta que estão pagando pela política insana de Bush e seus falcões. Completa Krugman, o filme é tendencioso, mas essencialmente conta a verdade de líderes que exploram a tragédia nacional para proveitos políticos próprios e os americanos comuns é que pagam o pato. Ah, também não sabes quem é Paul Krugman? Clique aqui, então
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Agora, esta história de líderes que exploram a tragédia nacional para proveitos políticos próprios e os comuns é que pagam o pato, parece comum, não é?
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29 de jun. de 2004
O avanço da destruição do Estado
O avanço da destruição do Estado
Num caminho sem volta, as reformas liberais constroem, passo a passo, um novo mundo da concorrência, com um Estado raquítico e desprovido de políticas sociais
Serge Halimi*
Todos os sistemas públicos ruiriam de uma vez por todas. Segundo um estudo recente feito pela agência de avaliação de risco Standard and Poors, o endividamento irá representar, até 2050, mais de 200% do Produto Nacional Bruto (PNB) da Alemanha, da França, de Portugal, da Grécia, da Polônia e da República Tcheca (os tetos fixados pelo pacto de estabilidade europeu são da ordem de 60%...) e mais de 700% do PNB do Japão. A explicação dada pela Cassandra da avaliação de risco é a seguinte: as aposentadorias seriam demasiado generosas, os índices de reprodução, demasiado baixos, e os velhos, em número muito alto e muito velhos. Portanto, um futuro radioso: “Quase todos os países passarão por uma desintegração fiscal nos próximos 25 anos1.”
Imediatamente, alguns liberais alemães tiram a máscara: “Mostrar o que poderia vir a ocorrer caso a política não seja alterada não só é legítimo, como também necessário”. Na opinião deles, imaginar cenários catastróficos até poderia constituir “o método correto” para divulgar reformas dolorosas2. Dá até para desconfiar que foi esse “método correto” que inspirou Philippe Douste-Blazy quando ele anunciou seu plano em relação ao auxílio-doença: “Com 23 mil euros de déficit por minuto, jamais o conseguiremos. (...) Estamos falidos. Se nada for feito, o sistema de previdência social deixa de existir3.”
É claro que alguma coisa será feita... O Instituto Montaigne, dirigido por Claude Bébéar, presidente do conselho fiscal de uma das maiores empresas de seguros privados do mundo, a Axa, já propôs algumas pistas. Como, por exemplo, um “Plano de Saúde Solidária” que, “para responsabilizar os doentes e, se necessário, acertar as despesas”, excluiria “alguns acidentes de trânsito e práticas esportivas que dependem de um seguro individual” e integraria “mecanismos de uma parcela anual, no âmbito da família, com possibilidades de isenção dessas parcelas se os protocolos de prevenção tiverem sido respeitados4”. Nos Estados Unidos, paraíso da medicina com que sonha Bébéar, o seguro-doença vem se esfarrapando gradativamente, o que é imputado aos trabalhadores – sob o pretexto, dos empresários, de que a proteção da saúde de seus empregados se tornou demasiado cara e acaba incentivando a mudança de local da empresa.
Caminho sem volta
Em 1944, o economista austríaco Friedrich Hayek manifestava seu receio com uma espiral coletivista, “a rota da servidão”, que resultaria no sacrifício da responsabilidade individual no altar da previdência social. Se atualmente existe uma espiral, é a do mercado. O efeito-dominó mudou de sentido.
Qual foi a técnica que permitiu que fosse imposta a concorrência, e até a privatização, de empresas públicas que, muitas vezes, eram mais valorizadas que as outras, que fosse aceito o fechamento definitivo de um grande número de agências de correio e de estações ferroviárias, que se voltasse a questionar a saúde e o ensino gratuitos, que os serviços públicos se transformassem num arquipélago de agências concorrentes e ameaçadas? E tudo isso, quase sem “debate”. Para conseguir fazê-lo, bastou construir um corredor de “reformas”, dentro do qual uma porta se tranca desde que se tenha passado por ela, conduzindo a outra, que se abre quando alguém se aproxima. Depois, é como diz a letra da canção: “Logo não haverá gasolina para poder voltar em sentido contrário e, portanto, temos que ir em frente.”
A fatalidade do “não há alternativas” cumpre seu papel; a vontade torna-se ainda mais desarmada, já que lhe retiraram suas armas e praticam a tática da terra queimada sem parar. O destino só será conhecido no fim da estrada. No final, constata-se que se trata de um projeto revolucionário, de um grande salto para trás, mas cujo movimento de conjunto se produziu por um encadeamento de etapas intermediárias. Abrem-se as fronteiras porque ninguém é protecionista, privatiza-se porque as fronteiras foram abertas, sacrificam-se os empregos e os serviços públicos porque eles foram privatizados. O “livre câmbio”, o “tamanho crítico”, as “alianças”, a “concorrência” e a “criação de valor” são parte das peças de um jogo de montar, do qual os arquitetos já imaginaram com antecedência o castelo que irão construir.
O império do mercado
O roteiro liberal só jura fidelidade ao “pragmatismo” e à “voz do bom senso”. Para compensar os déficits orçamentários, é necessário privatizar. Para vender as empresas públicas por bom preço, é necessário atrair os investidores estrangeiros. Para atrair os investidores estrangeiros, é necessário reduzir os salários e os “encargos”. Em seguida, os direitos sociais dos trabalhadores se tornam demasiado generosos no novo mundo da concorrência que foi criado. A explosão do desemprego e do trabalho precário – mas também a queda de sindicalização que, em parte, é decorrente disso – permitem calar os protestos (“corporativistas”) de quem dispõe de um emprego e de uma boa proteção social. Quando se calarem, irão demonstrar seu “senso de responsabilidade”, pois é inaceitável que persistam ouvindo por muito tempo as provocações de desempregados que ganham quase tanto quanto eles para não fazer coisa alguma. Portanto, é necessário apertar os controles que os envolvem5. Sem esquecer, de passagem, de reduzir seus subsídios-desemprego, sintomáticos de uma cultura “assistencialista” e de dependência. O tão carinhoso Ernest-Antoine Seillière, presidente do Movimento das Empresas da França (Medef, o sindicato patronal), explicou claramente: “Não se podem travar os combates dos dias de hoje concentrando o olhar na enfermaria6.”
Como já se viu, os liberais não estão assim tão desinteressados pela saúde coletiva. Nesse setor, assim como na educação, a “progressão lógica” de um sistema público e gratuito para com uma indústria amplamente privada e financiada por seguradoras e empréstimos bancários começa por invocar o sistema centralizado, que não funciona, que é burocrático, falido, injusto. É necessário descentralizar o edifício – em nome da “proximidade” –, repassar às administrações regionais a “responsabilidade” por seus orçamentos, criar um mercado da educação e da saúde para que sejam fixados preços que permitam controlar e orientar a gestão. Em seguida, será necessário fechar hospitais (ou escolas, ou agências de correio) que se descobriu não serem rentáveis, ou estabelecer “parcerias” com empresas locais, ou voltar a saúde e educação gratuitos, ou delegar ao setor privado – ou à “sociedade civil” – uma parcela crescente das tarefas de educação e saúde, que a partir de então se decompõem em partículas cada vez menores.
Estado mínimo
Na verdade, explicaram que seria preferível conservar apenas o núcleo central do negócio, que não seria necessário que fossem os empregados que cuidassem da vigilância, da limpeza, da restauração, ou que fizessem fotocópias, elaborassem e interpretassem questionários, administrassem um estacionamento de automóveis, ou as despesas com pessoal, verificassem os alojamentos militares ou formassem pilotos de helicóptero. Terminadas essas avaliações constantes e essas delegações sucessivas – assim como os obstáculos à tesouraria – é possível livrar-se de atividades que, antes, eram organizadas pelo Estado. “Qualquer missão que possa ser exercida pelo setor privado, deve ser privatizada”, anunciou Jean-Pierre Raffarin, cujo secretário para a Reforma do Estado, por seu lado, explicara: “Nossa estratégia é a de reorientar o Estado para suas missões fundamentais e conceder ao setor privado todas as outras, principalmente as logísticas7.” No Iraque, o exército norte-americano terceirizou tarefas vinculadas ao comando da guerra e à obtenção (um pouco enérgica) de “informações”. O Ministério da Defesa francês prevê “terceirizar os alojamentos da polícia”, o que poderia significar uma arrecadação de 500 milhões de euros8 (cerca de 1,9 bilhão de reais).
Quando era ministro das Finanças, Francis Mer recorreu a escritórios privados de consultoria (Mercer Delta, Cap, Gemini...) para refletir sobre a melhor forma de suprimir o emprego de 30 mil servidores públicos. Os que escapam à degola, se sentem em liberdade condicional: assim que possível, seus direitos poderão ser questionados, tais como a estabilidade no emprego, e seus contratos poderão vir a ser contratos por prazo determinado, primeiramente vinculados ao direito público e depois, ao privado. Christian Blanc, deputado pela UDF, já se declarou favorável à extinção, na França, do estatuto do funcionário público, existente desde 1945. “A oportunidade de reduzir os efetivos é histórica e seria lamentável não aproveitá-la”, diz a revista L’Expansion. “A ordem dada por Jean-Pierre Raffarin a todos os ministros é estrita: preencher apenas uma em cada duas vagas por aposentadoria. Um objetivo ambicioso que, se for cumprido, permitirá reduzir em 30 mil o número de funcionários públicos, teoricamente em oito anos, e economizar, segundo o senador Philippe Marini, da UMP, 12 bilhões de euros (45 bilhões de reais) até 20129.” Desta maneira, passa-se a idéia de que o funcionário público representa unicamente um peso para o contribuinte; em momento algum se menciona a enfermeira que cuida do paciente, o bombeiro que socorre uma vítima, um professor que dá instrução às crianças, um fiscal do trabalho que protege o trabalhador do arbítrio patronal. É apenas um custo.
O "problema" do servidor
Na Suíça, “para ser mais competitivo e mudar de cultura”, a agência federal de emprego apropriou-se, segundo sua própria terminologia, “dos instrumentos do setor privado”: a estabilidade do funcionário público, por exemplo, foi abolida em novembro de 2000. Na Itália, foi uma coalizão de esquerda que generalizou uma prática semelhante: autonomia de gestão dos diretores administrativos, individualização das tarefas, retribuição de acordo com o desempenho. Atualmente, “apenas 15% dos empregos públicos permanecem no âmbito do Estado (magistrados, advogados e procuradores do Estado, militares, policiais, diplomatas e professores universitários), enquanto os restantes passarão a ter contratos privados, em menos de dois anos, ainda que continuem sendo pagos pelo Estado. Os executivos estão particularmente preocupados10”. Na Nova Zelândia, o número de funcionários públicos passou de 71 mil, em 1988, para 32.900, em 1996. Estes trabalham mais, com menos recursos; sua carga horária aumentou e a estabilidade foi eliminada.
Uma vez que esteja raquítico e metamorfoseado, o Estado se torna cada vez menos capaz de vir a barrar algum dia a expansão da lei do mercado. A administração vai se fragmentando constantemente, sua especificidade vai sumindo. Eventualmente, a não estabilidade do trabalho público chega a dar idéias aos patrões. Quando se surpreende com o fato de que reclamem contra a instituição de um “Contrato de missão Duração Determinada - CDD” de longa duração, Seillière explica: “E o setor privado não teria direito ao que o funcionalismo público põe em prática diariamente? No exército, existem contratos de quatro ou de seis anos; os empregos para jovens eram de cinco anos; dentro do próprio Estado, os servidores são contratados por prazos limitados. Mas quando se trata do setor privado, levantam-se todos os conservadorismos, todos os imobilismos11.” Há vinte anos, a direita francesa preferia resmungar diante do papel de “vitrine social” desempenhado por um setor público que, na época, era menos ávido por trabalho provisório e por encargos sociais mais leves. “Sua impunidade financeira”, explicava Albin Chalandon, ex-diretor-presidente da Elf, “cria um sentimento de segurança do qual o pessoal se aproveita para trabalhar menos, proliferar (sic) e obter, através de sindicatos fortes, vantagens que se tornam privilégios12.”
Sindicatos frágeis
Isto porque, para os liberais, a privatização – total, ou parcelada – também representa a vantagem de diminuir o poder de resistência dos sindicatos, o que permite abrir caminho para as “reformas” que virão em seguida. Na França, a participação das empresas públicas no emprego assalariado já foi reduzida pela metade, entre 1985 e 2000, representando atualmente apenas 5,3% do total13. E também aí, como em outros setores, se prossegue no mesmo sentido. Ora, a reivindicação social apoiou-se, muitas vezes, nas empresas públicas, com maior índice de sindicalização do que as outras e cujas grandes greves deram o ritmo à história contemporânea do país (Charbonnages, em 1963, Régie Renault, em 1968, ferrovias, em 1995). No outono do ano passado, quando a Assembléia Nacional aceitou que o capital majoritário da France Télécom passasse para o controle privado, o deputado Jean Dionis du Séjour, da UDF, membro da comissão dos serviços públicos de correios e telecomunicações, explicou, de passagem: “O texto prevê a normalização das instâncias representativas dos empregados. Ou seja: os sindicatos que participavam do conselho de administração da France Télécom não mais o farão14.” Quase a metade dos 110 mil empregados da EDF (estatal da eletricidade) é sindicalizada (leia, nesta edição, o artigo de Ernest Antoine); nos Estados Unidos, 12,9% dos servidores públicos são filiados à AFL-CIO, proporção que cai para 8,2% no setor privado. Na realidade, as causas e as conseqüências são, muitas vezes, vinculadas ao encadeamento do projeto liberal: o enfraquecimento das organizações operárias incentiva a imposição da flexibilidade do emprego, a qual, por sua vez, prejudica a sindicalização. Até se constrói o desencanto e a derrota. “Se quisermos alimentar a mínima esperança por um retorno a uma economia de liberdade, a questão da restrição da força sindical é uma das mais importantes”, prevenia Friedrich Hayek15.
Uma firma privada se encarrega da administração, outra, da informática, e uma terceira, da comunicação da empresa. Multiplicando os empregadores e o regime de trabalho, mina-se a solidariedade entre os profissionais e as profissões. O avanço é feito generalizando o sistema de gratificações por mérito, ou seja, individualizando as remunerações. O que foi privatizado permanecerá privado, o que continua público tende a ser privatizado da próxima vez, por ocasião de alguma nova campanha político-jornalística de pânico, vinculada ao “buraco da previdência social” ou à “falência” de uma estatal.
A lógica do lucro de impõe
Progressivamente, a lógica do lucro invade o setor público, cuja principal missão era a de atender às necessidades coletivas16. Avaliação, reestruturação, delegação de missão: as empreiteiras terceirizadas que são convocadas representam, muitas vezes, uma maior concorrência, já que seus empregados não têm o benefício do status “privilegiado” dos funcionários públicos, nem os inconvenientes causados pelos sindicatos. No final da estrada, desde que as empresas e os serviços públicos tenham perdido sua especificidade (tarefas, empregados) e lhes tenha sido ordenado que, antes de tudo, produzam lucro, está aberta a via para sua liquidação. E se, um dia, alguém achar que o nome da empresa, demasiado francês – Air France, EDF, France Télécom etc. –, indispõe os investidores estrangeiros, nada impede que ele seja mudado, um pouco da mesma maneira com que se apagam os vestígios de uma juventude dissoluta.
São coisas do passado. Os correios, a eletricidade, a educação ou a saúde não eram unidades de produção que buscassem realizar mais lucros que seus concorrentes. Não tinham concorrentes. Fossem eles estatais ou serviços públicos, sua missão consistia em encaminhar a correspondência, em fornecer energia elétrica, em garantir a educação e a saúde da população. Sem esquecer as pessoas mais isoladas, menos rentáveis. Essas coisas não se computavam em calculadoras. O mercado ocupava um perímetro demarcado, no interior de uma economia mista. As pessoas sabiam que nem para tudo ele servia. Pouco se preocupava com a igualdade de acesso à educação ou à saúde. Ou a implantar a infra-estrutura do país. Ou a investir em atividades vitais cujas esperanças de rentabilidade vão além do horizonte temporal dos mercados financeiros. Ou em avaliar o custo, para a coletividade, de decisões individuais exclusivamente lucrativas do ponto de vista das empresas que as tomam. Portanto, quando se inclui no preço do envio por caminhão o risco de um acidente na estrada e da poluição, o transporte rodoviário deixa de ser menos caro que o frete ferroviário e o déficit deste último (429 milhões de euros, ou 1,6 bilhão de reais, segundo a estatal ferroviária) parece menos temerário. Se existe uma “concorrência” entre a ferrovia e a rodovia, interessa à sociedade, de fato, subvencionar o frete por trem e imputar aos caminhões – que produzem gases responsáveis pelo efeito-estufa – uma parte da responsabilidade pelos efeitos do fenômeno da canícula, inclusive suas vítimas17.
Moinhos de propaganda
A “sociedade”. Uma palavra que desagradava a Margaret Thatcher. Os liberais preferem conhecer apenas indivíduos. É daí que decorre sua visão de propriedade pública. “Quando o mundo inteiro possui alguma coisa, ninguém o possui e ninguém se interessa em mantê-lo em bom estado ou em melhorá-lo”, explicava Milton Friedman em 1990. “É por isso que os imóveis soviéticos – e as moradias populares nos Estados Unidos – parecem ruínas apenas um ou dois anos após terem sido construídos18.” No entanto, talvez a lógica parecesse menos inevitável a Friedman se ele tivesse viajado de trem à Grã-Bretanha depois que esse serviço foi confiado à iniciativa privada. Mas o liberalismo teria, provavelmente, perdido um de seus advogados mais intransigentes num acidente ferroviário.
“O sistema público só irá recuar quando se vir encurralado entre déficits que se tornam insuportáveis e recursos em vias de retração19.” Enunciadas há vinte anos por Alain Minc, a confissão e a receita decorrem de um plágio. Na realidade, Ronald Reagan já reduzira os impostos diretos para criar enormes déficits, nos Estados Unidos, os quais serviram depois de pretexto para o desmantelamento do Estado social. Simultaneamente, ele passou (o “novo federalismo”) a delegar às autoridades locais serviços e administrações públicas, mas sem lhes dar os meios para que funcionassem. Cabia a elas arrecadar ou cortar. Bush e Raffarin nada inventaram. No entanto, os liberais gritaram mais alto para acelerar o ritmo. Seus moinhos de propaganda (tanto os meios de comunicação, quanto os “especialistas”) se encarregam de divulgar seus objetivos.
O ensino superior gratuito, por sua vez, está definitivamente acuado no corredor das reformas devido à insuficiência de verbas públicas. Anualmente, e por estudante, elas passaram, na Grã-Bretanha, de cerca de 8 mil libras (45 mil reais), em 1990, para cerca de 5 mil libras (28,5 mil reais) dez anos depois20. Anthony Blair prefere obrigar os usuários a pagar. As matrículas na universidade, por exemplo, acabam de ser triplicadas; podem chegar a 3 mil libras por ano (17 mil reais). “No mundo inteiro”, comemora a Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico (OCDE), “o ensino superior é submetido a pressões favoráveis a uma mudança. (...) Nesse ambiente mais complexo, atualmente já não é oportuno que o poder público administre diretamente o setor, pois os mecanismos do mercado são muitas vezes mais eficientes do que os administradores para regular a oferta e a demanda dos diversos tipos de formação oferecidos a uma variedade de clientes21.” Seria possível imaginar outra resposta. Na França, por exemplo, se os governos de Jospin e Raffarin não tivessem baixado o Imposto de Renda, o país poderia ter multiplicado por dois o orçamento para o ensino superior22.
O povo de fora
A engrenagem da liberalização se esforça para resultar de uma sucessão de opções políticas, e não de um acúmulo de intempéries, mas as decisões mais vitais raramente são ratificadas pelo voto popular. Quase todas as grandes privatizações realizadas na Grã-Bretanha provocaram uma hostilidade antecipada por parte da maioria da população. Questionados sobre a venda das florestas públicas de seu país, 79% dos neozelandeses se declararam contrários à medida; somente 4% aprovaram. O programa ultraliberal defendido por Alain Madelin por ocasião da eleição presidencial francesa de 2002 contou com apenas 3,91% de votos. No entanto, a maioria das indústrias e dos serviços públicos na Grã-Bretanha foi privatizada. E quando se concluir o segundo mandato de Jacques Chirac, será o programa de Madelin o que melhor foi cumprido – e não as promessas presidenciais em relação ao combate contra a “insegurança” ou ao desaparecimento progressivo da “fratura social”.
Se os países europeus ratificarem um projeto de Constituição que proclame que um dos objetivos da União Européia é o “de oferecer a seus cidadãos um mercado único em que a concorrência é livre, e não falsificada” e, em seguida, aceitarem um Acordo Geral sobre o Comércio dos Serviços (AGCS) liberalizando a saúde, a educação e a cultura, todo o resto será, em termos relativos, secundário. E Fulano poderá facilmente abater Sicrano por ocasião das eleições. Em todo caso, algo indica que o sobressalto não será obra do Comissariado Geral. Na realidade, seu titular, Alain Etchegoyen, acaba de escolher para assessor científico o Senior Vice President Stratégie (será inglês ou francês?) da empresa Manpower Incorporated. Uma nota distribuída à imprensa, datada de 3 de maio de 2004, explica: “Esta nomeação de um homem de empresa permitirá que o Plano se diversifique e seja mais rico em suas abordagens ao mercado de emprego e do trabalho, eixo prioritário definido pelo Primeiro-Ministro.” Como a Manpower é uma das maiores empresas de trabalho temporário do mundo, é fácil prever que “abordagem do mercado de trabalho” será adotada pelo novo assessor científico encarregado de defender os bens públicos.
(Trad.: Jô Amado)
* Editor-assistente do Monde diplomatique.
1 - Ler, de Päivi Munter e Norma Cohen, “Debt crisis threatens ‘fiscal Armageddon’”, Financial Times, 1º de abril de 2004.
2 - Ler, de Bertrand Benoit, “Politician tells it like it is to convince German state’s public of need for reform”, Financial Times, 6 de abril de 2004.
3 - Noticiário das 20 horas da emissora TF-1, 2 de maio de 2004.
4 - Correspondance économique, 14 de abril de 2004.
5 - Na Grã-Bretanha, os “clientes” que buscam emprego devem relatar semanalmente a seu “conselheiro” suas iniciativas para encontrar trabalho. “Se um desempregado inglês não aceitar o cargo que lhe é proposto em sua área de competência, suspendemos imediatamente seu auxílio-desemprego”, explica a diretora de um job centre. O mesmo ocorre na Dinamarca.
6 - Entrevista com Ernest-Antoine Seillières, France 2, 22 de janeiro de 1998.
7 = Ler “Fonctionnaires: ce qui les attend”, L’Expansion, abril de 2004.
8 - Para a informação, Le Figaro, 4 de maio de 2004.
9 - L’Expansion, abril de 2004.
10 - Ler, de Cécile Cornudet, “Réforme de l’Etat: les ‘recettes’ étrangères”, Les Echos, 24 de setembro de 2003.
11 - Ler a entrevista “Ernest-Antoine Seillière: la société est enfin prête à se réformer”, Les Echos, 20 de janeiro de 2004.
12 - Ler a entrevista com Albin Chalandon “Dénationaliser: pourquoi?”, Le Monde, 11 de julho de 1984.
13 - Les Echos, 21 de novembro de 2000.
14 - Le Figaro, 20 de outubro de 2003.
15 - Ler, de Friedrich Hayek, Le Grand bond en arrière, ed. Fayard, Paris, 2004.
16 - Ler a pesquisa de Gilles Balbastre “A La Poste aussi, les agents doivent penser em termes de marché”, Le Monde diplomatique, outubro de 2002.
17 - Ler, de Serge Latouche, “Moins loin, moins vite”, La Décroissance nº 21, maio de 2004.
18 - Ler, de Milton e Rose Friedman, Free to Choose, ed. Harcourt, Orlando, Flórida, Estados Unidos. É em nome desse mesmo raciocínio que alguns liberais, como Pascal Salin, no caso da França, recomendam a privatização das manadas de elefantes africanos, para protegê-los dos caçadores.
19 - L’Expansion, 2 de novembro de 1984.
20 - “Drowning spires”, The Economist, 29 de novembro de 2003.
21 - OCDE, Analyse des politiques d’éducation, 2003, p. 66.
22 - Segundo Louis Maurin, “La grande misère des facs”, Alternatives Economiques, janeiro de 2004.
Num caminho sem volta, as reformas liberais constroem, passo a passo, um novo mundo da concorrência, com um Estado raquítico e desprovido de políticas sociais
Serge Halimi*
Todos os sistemas públicos ruiriam de uma vez por todas. Segundo um estudo recente feito pela agência de avaliação de risco Standard and Poors, o endividamento irá representar, até 2050, mais de 200% do Produto Nacional Bruto (PNB) da Alemanha, da França, de Portugal, da Grécia, da Polônia e da República Tcheca (os tetos fixados pelo pacto de estabilidade europeu são da ordem de 60%...) e mais de 700% do PNB do Japão. A explicação dada pela Cassandra da avaliação de risco é a seguinte: as aposentadorias seriam demasiado generosas, os índices de reprodução, demasiado baixos, e os velhos, em número muito alto e muito velhos. Portanto, um futuro radioso: “Quase todos os países passarão por uma desintegração fiscal nos próximos 25 anos1.”
Imediatamente, alguns liberais alemães tiram a máscara: “Mostrar o que poderia vir a ocorrer caso a política não seja alterada não só é legítimo, como também necessário”. Na opinião deles, imaginar cenários catastróficos até poderia constituir “o método correto” para divulgar reformas dolorosas2. Dá até para desconfiar que foi esse “método correto” que inspirou Philippe Douste-Blazy quando ele anunciou seu plano em relação ao auxílio-doença: “Com 23 mil euros de déficit por minuto, jamais o conseguiremos. (...) Estamos falidos. Se nada for feito, o sistema de previdência social deixa de existir3.”
É claro que alguma coisa será feita... O Instituto Montaigne, dirigido por Claude Bébéar, presidente do conselho fiscal de uma das maiores empresas de seguros privados do mundo, a Axa, já propôs algumas pistas. Como, por exemplo, um “Plano de Saúde Solidária” que, “para responsabilizar os doentes e, se necessário, acertar as despesas”, excluiria “alguns acidentes de trânsito e práticas esportivas que dependem de um seguro individual” e integraria “mecanismos de uma parcela anual, no âmbito da família, com possibilidades de isenção dessas parcelas se os protocolos de prevenção tiverem sido respeitados4”. Nos Estados Unidos, paraíso da medicina com que sonha Bébéar, o seguro-doença vem se esfarrapando gradativamente, o que é imputado aos trabalhadores – sob o pretexto, dos empresários, de que a proteção da saúde de seus empregados se tornou demasiado cara e acaba incentivando a mudança de local da empresa.
Caminho sem volta
Em 1944, o economista austríaco Friedrich Hayek manifestava seu receio com uma espiral coletivista, “a rota da servidão”, que resultaria no sacrifício da responsabilidade individual no altar da previdência social. Se atualmente existe uma espiral, é a do mercado. O efeito-dominó mudou de sentido.
Qual foi a técnica que permitiu que fosse imposta a concorrência, e até a privatização, de empresas públicas que, muitas vezes, eram mais valorizadas que as outras, que fosse aceito o fechamento definitivo de um grande número de agências de correio e de estações ferroviárias, que se voltasse a questionar a saúde e o ensino gratuitos, que os serviços públicos se transformassem num arquipélago de agências concorrentes e ameaçadas? E tudo isso, quase sem “debate”. Para conseguir fazê-lo, bastou construir um corredor de “reformas”, dentro do qual uma porta se tranca desde que se tenha passado por ela, conduzindo a outra, que se abre quando alguém se aproxima. Depois, é como diz a letra da canção: “Logo não haverá gasolina para poder voltar em sentido contrário e, portanto, temos que ir em frente.”
A fatalidade do “não há alternativas” cumpre seu papel; a vontade torna-se ainda mais desarmada, já que lhe retiraram suas armas e praticam a tática da terra queimada sem parar. O destino só será conhecido no fim da estrada. No final, constata-se que se trata de um projeto revolucionário, de um grande salto para trás, mas cujo movimento de conjunto se produziu por um encadeamento de etapas intermediárias. Abrem-se as fronteiras porque ninguém é protecionista, privatiza-se porque as fronteiras foram abertas, sacrificam-se os empregos e os serviços públicos porque eles foram privatizados. O “livre câmbio”, o “tamanho crítico”, as “alianças”, a “concorrência” e a “criação de valor” são parte das peças de um jogo de montar, do qual os arquitetos já imaginaram com antecedência o castelo que irão construir.
O império do mercado
O roteiro liberal só jura fidelidade ao “pragmatismo” e à “voz do bom senso”. Para compensar os déficits orçamentários, é necessário privatizar. Para vender as empresas públicas por bom preço, é necessário atrair os investidores estrangeiros. Para atrair os investidores estrangeiros, é necessário reduzir os salários e os “encargos”. Em seguida, os direitos sociais dos trabalhadores se tornam demasiado generosos no novo mundo da concorrência que foi criado. A explosão do desemprego e do trabalho precário – mas também a queda de sindicalização que, em parte, é decorrente disso – permitem calar os protestos (“corporativistas”) de quem dispõe de um emprego e de uma boa proteção social. Quando se calarem, irão demonstrar seu “senso de responsabilidade”, pois é inaceitável que persistam ouvindo por muito tempo as provocações de desempregados que ganham quase tanto quanto eles para não fazer coisa alguma. Portanto, é necessário apertar os controles que os envolvem5. Sem esquecer, de passagem, de reduzir seus subsídios-desemprego, sintomáticos de uma cultura “assistencialista” e de dependência. O tão carinhoso Ernest-Antoine Seillière, presidente do Movimento das Empresas da França (Medef, o sindicato patronal), explicou claramente: “Não se podem travar os combates dos dias de hoje concentrando o olhar na enfermaria6.”
Como já se viu, os liberais não estão assim tão desinteressados pela saúde coletiva. Nesse setor, assim como na educação, a “progressão lógica” de um sistema público e gratuito para com uma indústria amplamente privada e financiada por seguradoras e empréstimos bancários começa por invocar o sistema centralizado, que não funciona, que é burocrático, falido, injusto. É necessário descentralizar o edifício – em nome da “proximidade” –, repassar às administrações regionais a “responsabilidade” por seus orçamentos, criar um mercado da educação e da saúde para que sejam fixados preços que permitam controlar e orientar a gestão. Em seguida, será necessário fechar hospitais (ou escolas, ou agências de correio) que se descobriu não serem rentáveis, ou estabelecer “parcerias” com empresas locais, ou voltar a saúde e educação gratuitos, ou delegar ao setor privado – ou à “sociedade civil” – uma parcela crescente das tarefas de educação e saúde, que a partir de então se decompõem em partículas cada vez menores.
Estado mínimo
Na verdade, explicaram que seria preferível conservar apenas o núcleo central do negócio, que não seria necessário que fossem os empregados que cuidassem da vigilância, da limpeza, da restauração, ou que fizessem fotocópias, elaborassem e interpretassem questionários, administrassem um estacionamento de automóveis, ou as despesas com pessoal, verificassem os alojamentos militares ou formassem pilotos de helicóptero. Terminadas essas avaliações constantes e essas delegações sucessivas – assim como os obstáculos à tesouraria – é possível livrar-se de atividades que, antes, eram organizadas pelo Estado. “Qualquer missão que possa ser exercida pelo setor privado, deve ser privatizada”, anunciou Jean-Pierre Raffarin, cujo secretário para a Reforma do Estado, por seu lado, explicara: “Nossa estratégia é a de reorientar o Estado para suas missões fundamentais e conceder ao setor privado todas as outras, principalmente as logísticas7.” No Iraque, o exército norte-americano terceirizou tarefas vinculadas ao comando da guerra e à obtenção (um pouco enérgica) de “informações”. O Ministério da Defesa francês prevê “terceirizar os alojamentos da polícia”, o que poderia significar uma arrecadação de 500 milhões de euros8 (cerca de 1,9 bilhão de reais).
Quando era ministro das Finanças, Francis Mer recorreu a escritórios privados de consultoria (Mercer Delta, Cap, Gemini...) para refletir sobre a melhor forma de suprimir o emprego de 30 mil servidores públicos. Os que escapam à degola, se sentem em liberdade condicional: assim que possível, seus direitos poderão ser questionados, tais como a estabilidade no emprego, e seus contratos poderão vir a ser contratos por prazo determinado, primeiramente vinculados ao direito público e depois, ao privado. Christian Blanc, deputado pela UDF, já se declarou favorável à extinção, na França, do estatuto do funcionário público, existente desde 1945. “A oportunidade de reduzir os efetivos é histórica e seria lamentável não aproveitá-la”, diz a revista L’Expansion. “A ordem dada por Jean-Pierre Raffarin a todos os ministros é estrita: preencher apenas uma em cada duas vagas por aposentadoria. Um objetivo ambicioso que, se for cumprido, permitirá reduzir em 30 mil o número de funcionários públicos, teoricamente em oito anos, e economizar, segundo o senador Philippe Marini, da UMP, 12 bilhões de euros (45 bilhões de reais) até 20129.” Desta maneira, passa-se a idéia de que o funcionário público representa unicamente um peso para o contribuinte; em momento algum se menciona a enfermeira que cuida do paciente, o bombeiro que socorre uma vítima, um professor que dá instrução às crianças, um fiscal do trabalho que protege o trabalhador do arbítrio patronal. É apenas um custo.
O "problema" do servidor
Na Suíça, “para ser mais competitivo e mudar de cultura”, a agência federal de emprego apropriou-se, segundo sua própria terminologia, “dos instrumentos do setor privado”: a estabilidade do funcionário público, por exemplo, foi abolida em novembro de 2000. Na Itália, foi uma coalizão de esquerda que generalizou uma prática semelhante: autonomia de gestão dos diretores administrativos, individualização das tarefas, retribuição de acordo com o desempenho. Atualmente, “apenas 15% dos empregos públicos permanecem no âmbito do Estado (magistrados, advogados e procuradores do Estado, militares, policiais, diplomatas e professores universitários), enquanto os restantes passarão a ter contratos privados, em menos de dois anos, ainda que continuem sendo pagos pelo Estado. Os executivos estão particularmente preocupados10”. Na Nova Zelândia, o número de funcionários públicos passou de 71 mil, em 1988, para 32.900, em 1996. Estes trabalham mais, com menos recursos; sua carga horária aumentou e a estabilidade foi eliminada.
Uma vez que esteja raquítico e metamorfoseado, o Estado se torna cada vez menos capaz de vir a barrar algum dia a expansão da lei do mercado. A administração vai se fragmentando constantemente, sua especificidade vai sumindo. Eventualmente, a não estabilidade do trabalho público chega a dar idéias aos patrões. Quando se surpreende com o fato de que reclamem contra a instituição de um “Contrato de missão Duração Determinada - CDD” de longa duração, Seillière explica: “E o setor privado não teria direito ao que o funcionalismo público põe em prática diariamente? No exército, existem contratos de quatro ou de seis anos; os empregos para jovens eram de cinco anos; dentro do próprio Estado, os servidores são contratados por prazos limitados. Mas quando se trata do setor privado, levantam-se todos os conservadorismos, todos os imobilismos11.” Há vinte anos, a direita francesa preferia resmungar diante do papel de “vitrine social” desempenhado por um setor público que, na época, era menos ávido por trabalho provisório e por encargos sociais mais leves. “Sua impunidade financeira”, explicava Albin Chalandon, ex-diretor-presidente da Elf, “cria um sentimento de segurança do qual o pessoal se aproveita para trabalhar menos, proliferar (sic) e obter, através de sindicatos fortes, vantagens que se tornam privilégios12.”
Sindicatos frágeis
Isto porque, para os liberais, a privatização – total, ou parcelada – também representa a vantagem de diminuir o poder de resistência dos sindicatos, o que permite abrir caminho para as “reformas” que virão em seguida. Na França, a participação das empresas públicas no emprego assalariado já foi reduzida pela metade, entre 1985 e 2000, representando atualmente apenas 5,3% do total13. E também aí, como em outros setores, se prossegue no mesmo sentido. Ora, a reivindicação social apoiou-se, muitas vezes, nas empresas públicas, com maior índice de sindicalização do que as outras e cujas grandes greves deram o ritmo à história contemporânea do país (Charbonnages, em 1963, Régie Renault, em 1968, ferrovias, em 1995). No outono do ano passado, quando a Assembléia Nacional aceitou que o capital majoritário da France Télécom passasse para o controle privado, o deputado Jean Dionis du Séjour, da UDF, membro da comissão dos serviços públicos de correios e telecomunicações, explicou, de passagem: “O texto prevê a normalização das instâncias representativas dos empregados. Ou seja: os sindicatos que participavam do conselho de administração da France Télécom não mais o farão14.” Quase a metade dos 110 mil empregados da EDF (estatal da eletricidade) é sindicalizada (leia, nesta edição, o artigo de Ernest Antoine); nos Estados Unidos, 12,9% dos servidores públicos são filiados à AFL-CIO, proporção que cai para 8,2% no setor privado. Na realidade, as causas e as conseqüências são, muitas vezes, vinculadas ao encadeamento do projeto liberal: o enfraquecimento das organizações operárias incentiva a imposição da flexibilidade do emprego, a qual, por sua vez, prejudica a sindicalização. Até se constrói o desencanto e a derrota. “Se quisermos alimentar a mínima esperança por um retorno a uma economia de liberdade, a questão da restrição da força sindical é uma das mais importantes”, prevenia Friedrich Hayek15.
Uma firma privada se encarrega da administração, outra, da informática, e uma terceira, da comunicação da empresa. Multiplicando os empregadores e o regime de trabalho, mina-se a solidariedade entre os profissionais e as profissões. O avanço é feito generalizando o sistema de gratificações por mérito, ou seja, individualizando as remunerações. O que foi privatizado permanecerá privado, o que continua público tende a ser privatizado da próxima vez, por ocasião de alguma nova campanha político-jornalística de pânico, vinculada ao “buraco da previdência social” ou à “falência” de uma estatal.
A lógica do lucro de impõe
Progressivamente, a lógica do lucro invade o setor público, cuja principal missão era a de atender às necessidades coletivas16. Avaliação, reestruturação, delegação de missão: as empreiteiras terceirizadas que são convocadas representam, muitas vezes, uma maior concorrência, já que seus empregados não têm o benefício do status “privilegiado” dos funcionários públicos, nem os inconvenientes causados pelos sindicatos. No final da estrada, desde que as empresas e os serviços públicos tenham perdido sua especificidade (tarefas, empregados) e lhes tenha sido ordenado que, antes de tudo, produzam lucro, está aberta a via para sua liquidação. E se, um dia, alguém achar que o nome da empresa, demasiado francês – Air France, EDF, France Télécom etc. –, indispõe os investidores estrangeiros, nada impede que ele seja mudado, um pouco da mesma maneira com que se apagam os vestígios de uma juventude dissoluta.
São coisas do passado. Os correios, a eletricidade, a educação ou a saúde não eram unidades de produção que buscassem realizar mais lucros que seus concorrentes. Não tinham concorrentes. Fossem eles estatais ou serviços públicos, sua missão consistia em encaminhar a correspondência, em fornecer energia elétrica, em garantir a educação e a saúde da população. Sem esquecer as pessoas mais isoladas, menos rentáveis. Essas coisas não se computavam em calculadoras. O mercado ocupava um perímetro demarcado, no interior de uma economia mista. As pessoas sabiam que nem para tudo ele servia. Pouco se preocupava com a igualdade de acesso à educação ou à saúde. Ou a implantar a infra-estrutura do país. Ou a investir em atividades vitais cujas esperanças de rentabilidade vão além do horizonte temporal dos mercados financeiros. Ou em avaliar o custo, para a coletividade, de decisões individuais exclusivamente lucrativas do ponto de vista das empresas que as tomam. Portanto, quando se inclui no preço do envio por caminhão o risco de um acidente na estrada e da poluição, o transporte rodoviário deixa de ser menos caro que o frete ferroviário e o déficit deste último (429 milhões de euros, ou 1,6 bilhão de reais, segundo a estatal ferroviária) parece menos temerário. Se existe uma “concorrência” entre a ferrovia e a rodovia, interessa à sociedade, de fato, subvencionar o frete por trem e imputar aos caminhões – que produzem gases responsáveis pelo efeito-estufa – uma parte da responsabilidade pelos efeitos do fenômeno da canícula, inclusive suas vítimas17.
Moinhos de propaganda
A “sociedade”. Uma palavra que desagradava a Margaret Thatcher. Os liberais preferem conhecer apenas indivíduos. É daí que decorre sua visão de propriedade pública. “Quando o mundo inteiro possui alguma coisa, ninguém o possui e ninguém se interessa em mantê-lo em bom estado ou em melhorá-lo”, explicava Milton Friedman em 1990. “É por isso que os imóveis soviéticos – e as moradias populares nos Estados Unidos – parecem ruínas apenas um ou dois anos após terem sido construídos18.” No entanto, talvez a lógica parecesse menos inevitável a Friedman se ele tivesse viajado de trem à Grã-Bretanha depois que esse serviço foi confiado à iniciativa privada. Mas o liberalismo teria, provavelmente, perdido um de seus advogados mais intransigentes num acidente ferroviário.
“O sistema público só irá recuar quando se vir encurralado entre déficits que se tornam insuportáveis e recursos em vias de retração19.” Enunciadas há vinte anos por Alain Minc, a confissão e a receita decorrem de um plágio. Na realidade, Ronald Reagan já reduzira os impostos diretos para criar enormes déficits, nos Estados Unidos, os quais serviram depois de pretexto para o desmantelamento do Estado social. Simultaneamente, ele passou (o “novo federalismo”) a delegar às autoridades locais serviços e administrações públicas, mas sem lhes dar os meios para que funcionassem. Cabia a elas arrecadar ou cortar. Bush e Raffarin nada inventaram. No entanto, os liberais gritaram mais alto para acelerar o ritmo. Seus moinhos de propaganda (tanto os meios de comunicação, quanto os “especialistas”) se encarregam de divulgar seus objetivos.
O ensino superior gratuito, por sua vez, está definitivamente acuado no corredor das reformas devido à insuficiência de verbas públicas. Anualmente, e por estudante, elas passaram, na Grã-Bretanha, de cerca de 8 mil libras (45 mil reais), em 1990, para cerca de 5 mil libras (28,5 mil reais) dez anos depois20. Anthony Blair prefere obrigar os usuários a pagar. As matrículas na universidade, por exemplo, acabam de ser triplicadas; podem chegar a 3 mil libras por ano (17 mil reais). “No mundo inteiro”, comemora a Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico (OCDE), “o ensino superior é submetido a pressões favoráveis a uma mudança. (...) Nesse ambiente mais complexo, atualmente já não é oportuno que o poder público administre diretamente o setor, pois os mecanismos do mercado são muitas vezes mais eficientes do que os administradores para regular a oferta e a demanda dos diversos tipos de formação oferecidos a uma variedade de clientes21.” Seria possível imaginar outra resposta. Na França, por exemplo, se os governos de Jospin e Raffarin não tivessem baixado o Imposto de Renda, o país poderia ter multiplicado por dois o orçamento para o ensino superior22.
O povo de fora
A engrenagem da liberalização se esforça para resultar de uma sucessão de opções políticas, e não de um acúmulo de intempéries, mas as decisões mais vitais raramente são ratificadas pelo voto popular. Quase todas as grandes privatizações realizadas na Grã-Bretanha provocaram uma hostilidade antecipada por parte da maioria da população. Questionados sobre a venda das florestas públicas de seu país, 79% dos neozelandeses se declararam contrários à medida; somente 4% aprovaram. O programa ultraliberal defendido por Alain Madelin por ocasião da eleição presidencial francesa de 2002 contou com apenas 3,91% de votos. No entanto, a maioria das indústrias e dos serviços públicos na Grã-Bretanha foi privatizada. E quando se concluir o segundo mandato de Jacques Chirac, será o programa de Madelin o que melhor foi cumprido – e não as promessas presidenciais em relação ao combate contra a “insegurança” ou ao desaparecimento progressivo da “fratura social”.
Se os países europeus ratificarem um projeto de Constituição que proclame que um dos objetivos da União Européia é o “de oferecer a seus cidadãos um mercado único em que a concorrência é livre, e não falsificada” e, em seguida, aceitarem um Acordo Geral sobre o Comércio dos Serviços (AGCS) liberalizando a saúde, a educação e a cultura, todo o resto será, em termos relativos, secundário. E Fulano poderá facilmente abater Sicrano por ocasião das eleições. Em todo caso, algo indica que o sobressalto não será obra do Comissariado Geral. Na realidade, seu titular, Alain Etchegoyen, acaba de escolher para assessor científico o Senior Vice President Stratégie (será inglês ou francês?) da empresa Manpower Incorporated. Uma nota distribuída à imprensa, datada de 3 de maio de 2004, explica: “Esta nomeação de um homem de empresa permitirá que o Plano se diversifique e seja mais rico em suas abordagens ao mercado de emprego e do trabalho, eixo prioritário definido pelo Primeiro-Ministro.” Como a Manpower é uma das maiores empresas de trabalho temporário do mundo, é fácil prever que “abordagem do mercado de trabalho” será adotada pelo novo assessor científico encarregado de defender os bens públicos.
(Trad.: Jô Amado)
* Editor-assistente do Monde diplomatique.
1 - Ler, de Päivi Munter e Norma Cohen, “Debt crisis threatens ‘fiscal Armageddon’”, Financial Times, 1º de abril de 2004.
2 - Ler, de Bertrand Benoit, “Politician tells it like it is to convince German state’s public of need for reform”, Financial Times, 6 de abril de 2004.
3 - Noticiário das 20 horas da emissora TF-1, 2 de maio de 2004.
4 - Correspondance économique, 14 de abril de 2004.
5 - Na Grã-Bretanha, os “clientes” que buscam emprego devem relatar semanalmente a seu “conselheiro” suas iniciativas para encontrar trabalho. “Se um desempregado inglês não aceitar o cargo que lhe é proposto em sua área de competência, suspendemos imediatamente seu auxílio-desemprego”, explica a diretora de um job centre. O mesmo ocorre na Dinamarca.
6 - Entrevista com Ernest-Antoine Seillières, France 2, 22 de janeiro de 1998.
7 = Ler “Fonctionnaires: ce qui les attend”, L’Expansion, abril de 2004.
8 - Para a informação, Le Figaro, 4 de maio de 2004.
9 - L’Expansion, abril de 2004.
10 - Ler, de Cécile Cornudet, “Réforme de l’Etat: les ‘recettes’ étrangères”, Les Echos, 24 de setembro de 2003.
11 - Ler a entrevista “Ernest-Antoine Seillière: la société est enfin prête à se réformer”, Les Echos, 20 de janeiro de 2004.
12 - Ler a entrevista com Albin Chalandon “Dénationaliser: pourquoi?”, Le Monde, 11 de julho de 1984.
13 - Les Echos, 21 de novembro de 2000.
14 - Le Figaro, 20 de outubro de 2003.
15 - Ler, de Friedrich Hayek, Le Grand bond en arrière, ed. Fayard, Paris, 2004.
16 - Ler a pesquisa de Gilles Balbastre “A La Poste aussi, les agents doivent penser em termes de marché”, Le Monde diplomatique, outubro de 2002.
17 - Ler, de Serge Latouche, “Moins loin, moins vite”, La Décroissance nº 21, maio de 2004.
18 - Ler, de Milton e Rose Friedman, Free to Choose, ed. Harcourt, Orlando, Flórida, Estados Unidos. É em nome desse mesmo raciocínio que alguns liberais, como Pascal Salin, no caso da França, recomendam a privatização das manadas de elefantes africanos, para protegê-los dos caçadores.
19 - L’Expansion, 2 de novembro de 1984.
20 - “Drowning spires”, The Economist, 29 de novembro de 2003.
21 - OCDE, Analyse des politiques d’éducation, 2003, p. 66.
22 - Segundo Louis Maurin, “La grande misère des facs”, Alternatives Economiques, janeiro de 2004.
18 de jun. de 2004
Câncer na IBM
IBM uma empresa além da suspeita
Nature 429, 687 (17 June 2004); doi:10.1038/429687a
Scientists cry foul as Elsevier axes paper on cancer mortality
MEREDITH WADMAN
[WASHINGTON] Contributors to a medical journal are refusing to publish in an upcoming issue on health in the semiconductor industry unless a controversial paper, axed by the publisher, is included.
The paper in question discusses rates of cancer mortality among former employees of computer manufacturer IBM. But Elsevier, the publisher of Clinics in Occupational and Environmental Medicine, announced last week that it would not publish the paper on the grounds that it was not a review article.
"It was determined that it was original research and the format of it wasn't appropriate for Clinics, which is a review journal," says Eric Merkel-Sobotta, a spokesman for the Amsterdam-based publisher.
But the guest editor of the upcoming issue, and many of its contributing authors, say that this is not the real reason for the paper's removal. They allege, instead, that Elsevier is bowing to pressure from IBM not to publish it. Elsevier denies that pressure from IBM had any bearing on its decision.
The paper presents an analysis of mortality records for 32,000 IBM employees over 32 years. These records were originally submitted to lawyers by IBM last year during a court case in Santa Clara County, California, in which the company was sued by two former employees who alleged that their health had been affected by their jobs. Richard Clapp, an epidemiologist at Boston University, Massachusetts, and one of the paper's two authors, was an expert witness for the complainants and analysed the data supplied by IBM on their behalf.
Nature has obtained a copy of the study, which Clapp co-authored with Rebecca Johnson, an epidemiologist who runs Epicenter, a consulting firm in Circle Pines, Minnesota. It reports significantly more deaths from several kinds of cancer in IBM employees than would be expected from data for the general population, and higher-still cancer death-rates for workers who spent at least a month at IBM chip-manufacturing plants.
"If the material is worthy, and the editor is satisfied the piece meets the journal's scientific standards, the publisher's interference smacks of censorship," says Clinics contributor Daniel Teitelbaum, a medical toxicologist at the Colorado School of Mines in Golden. "This is precisely the problem presented by Elsevier's refusal to publish the Clapp–Johnson paper."
Standing firm
Joseph LaDou, the guest editor of the Clinics issue on the electronics and semiconductor industries, which is scheduled for publication in November, adds: "We are standing together with Clapp and Johnson. We will publish when they publish, wherever that may be." LaDou, who is director of the International Center for Occupational Medicine at the University of California, San Francisco, says that the paper had passed muster with four peer-reviewers drawn from among the issue's contributors.
He adds that on 6 June, the day that Elsevier informed him that the Clapp–Johnson paper would not be published, he called on the journal's contributors to consider withholding their pieces from publication. By 9 June, seven of the nine contributors had agreed to withhold their papers. As of 14 June, LaDou had not heard back from the other two. But Elsevier remains unmoved. "Boycotts are neither constructive nor effective," says Merkel-Sobotta.
Lawyers for IBM argue that the data used in the paper fall under a protective court order that prohibits their use for anything other than the Santa Clara lawsuit. "Dr Clapp cannot arrogate to himself judgements about what court orders have to be obeyed and what ones don't," says Robert Weber, a Cleveland-based attorney who represented IBM in the lawsuit.
LaDou had also agreed to be an expert witness in the lawsuit, although the plaintiffs' lawyers did not call on him. The suit was decided in favour of IBM by a jury in February. The judge did not allow the data, and the conclusions drawn from them by Clapp and Johnson, to be presented to the jury, writing that they do "not and cannot demonstrate that there is any connection between the results of the study and exposure to chemicals at IBM". Some 200 similar lawsuits against the company are still in process.
But Clapp says that the broad pattern demonstrated by the huge database is important. He referred questions on the court order to his attorney, Indira Talwani. She says that IBM failed to mark as 'confidential' the deposition containing the study and Clapp's lengthy discussion of it with IBM lawyers. As a result, the plaintiffs' lawyers sent it to The New York Times, which published details of it last September. In addition, she says, any citizen may access the deposition containing the study at the Santa Clara County ourthouse. "The stuff is in the public domain now, because IBM didn't take the right steps," she says.
Clapp initially withdrew the paper from Clinics in March, after being warned by an IBM lawyer not to publish it, Talwani says. But he resubmitted it after taking legal advice and concluding that IBM no longer had the legal right to kept the study private.
Nature 429, 687 (17 June 2004); doi:10.1038/429687a
Scientists cry foul as Elsevier axes paper on cancer mortality
MEREDITH WADMAN
[WASHINGTON] Contributors to a medical journal are refusing to publish in an upcoming issue on health in the semiconductor industry unless a controversial paper, axed by the publisher, is included.
The paper in question discusses rates of cancer mortality among former employees of computer manufacturer IBM. But Elsevier, the publisher of Clinics in Occupational and Environmental Medicine, announced last week that it would not publish the paper on the grounds that it was not a review article.
"It was determined that it was original research and the format of it wasn't appropriate for Clinics, which is a review journal," says Eric Merkel-Sobotta, a spokesman for the Amsterdam-based publisher.
But the guest editor of the upcoming issue, and many of its contributing authors, say that this is not the real reason for the paper's removal. They allege, instead, that Elsevier is bowing to pressure from IBM not to publish it. Elsevier denies that pressure from IBM had any bearing on its decision.
The paper presents an analysis of mortality records for 32,000 IBM employees over 32 years. These records were originally submitted to lawyers by IBM last year during a court case in Santa Clara County, California, in which the company was sued by two former employees who alleged that their health had been affected by their jobs. Richard Clapp, an epidemiologist at Boston University, Massachusetts, and one of the paper's two authors, was an expert witness for the complainants and analysed the data supplied by IBM on their behalf.
Nature has obtained a copy of the study, which Clapp co-authored with Rebecca Johnson, an epidemiologist who runs Epicenter, a consulting firm in Circle Pines, Minnesota. It reports significantly more deaths from several kinds of cancer in IBM employees than would be expected from data for the general population, and higher-still cancer death-rates for workers who spent at least a month at IBM chip-manufacturing plants.
"If the material is worthy, and the editor is satisfied the piece meets the journal's scientific standards, the publisher's interference smacks of censorship," says Clinics contributor Daniel Teitelbaum, a medical toxicologist at the Colorado School of Mines in Golden. "This is precisely the problem presented by Elsevier's refusal to publish the Clapp–Johnson paper."
Standing firm
Joseph LaDou, the guest editor of the Clinics issue on the electronics and semiconductor industries, which is scheduled for publication in November, adds: "We are standing together with Clapp and Johnson. We will publish when they publish, wherever that may be." LaDou, who is director of the International Center for Occupational Medicine at the University of California, San Francisco, says that the paper had passed muster with four peer-reviewers drawn from among the issue's contributors.
He adds that on 6 June, the day that Elsevier informed him that the Clapp–Johnson paper would not be published, he called on the journal's contributors to consider withholding their pieces from publication. By 9 June, seven of the nine contributors had agreed to withhold their papers. As of 14 June, LaDou had not heard back from the other two. But Elsevier remains unmoved. "Boycotts are neither constructive nor effective," says Merkel-Sobotta.
Lawyers for IBM argue that the data used in the paper fall under a protective court order that prohibits their use for anything other than the Santa Clara lawsuit. "Dr Clapp cannot arrogate to himself judgements about what court orders have to be obeyed and what ones don't," says Robert Weber, a Cleveland-based attorney who represented IBM in the lawsuit.
LaDou had also agreed to be an expert witness in the lawsuit, although the plaintiffs' lawyers did not call on him. The suit was decided in favour of IBM by a jury in February. The judge did not allow the data, and the conclusions drawn from them by Clapp and Johnson, to be presented to the jury, writing that they do "not and cannot demonstrate that there is any connection between the results of the study and exposure to chemicals at IBM". Some 200 similar lawsuits against the company are still in process.
But Clapp says that the broad pattern demonstrated by the huge database is important. He referred questions on the court order to his attorney, Indira Talwani. She says that IBM failed to mark as 'confidential' the deposition containing the study and Clapp's lengthy discussion of it with IBM lawyers. As a result, the plaintiffs' lawyers sent it to The New York Times, which published details of it last September. In addition, she says, any citizen may access the deposition containing the study at the Santa Clara County ourthouse. "The stuff is in the public domain now, because IBM didn't take the right steps," she says.
Clapp initially withdrew the paper from Clinics in March, after being warned by an IBM lawyer not to publish it, Talwani says. But he resubmitted it after taking legal advice and concluding that IBM no longer had the legal right to kept the study private.
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