Impunidade
Um dos mais irritantes aspectos da sociedade brasileira é a impunidade dos pilantras e dos ladrões de alto coturno — juízes, parlamentares, policiais, fiscais variados, empresários — que metem no bolso quantias elevadíssimas e, quando são descobertos, conseguem dar um jeito de escapar à punição. Riem dos cidadãos honestos e vão gastar o dinheiro mal havido sem serem incomodados.
O último escândalo envolve o fiscal de rendas estadual Rodrigo Silveirinha Correa, ex-subsecretário de Administração Tributária e militante seguidor do ex-governador Anthony Garotinho, de cuja equipe de transição fez parte. Segundo a Justiça da Suíça, esse servidor público e mais sete depositaram ilegalmente naquele país US$ 32 milhões, presume-se que surrupiados dos falidos cofres do Rio de Janeiro. Daria para pagar a dívida não honrada do estado com o governo federal e ainda sobraria um troco. O mais difícil de engolir é que uma soma tão impressionante possa ser desviada sem que as auditorias e os mecanismos de controle da Secretaria da Fazenda se dêem conta. Espanta ainda que ninguém tenha estranhado a ostentação de riqueza do personagem Silveirinha, que, segundo foi publicado, vive numa mansão da Barra da Tijuca avaliada em R$ 2 milhões. Fernando Lopes, secretário de Fazenda da governadora Rosinha, acha difícil a devolução do dinheiro. A Justiça da Suíça só devolve depois de o ladrão ser condenado no Brasil, o que pode levar muitos anos.
Os ricos e os poderosos sempre têm um pulo do gato para escapar. O deputado Pinheiro Landim, cujas conversas com traficantes sobre a venda de hábeas-corpus na Justiça Federal, está preparando o seu. Antes de o relatório do corregedor da Câmara ser aprovado na Comissão de Ética, recomendando sua cassação, ele renunciará ao mandato atual, que se encerra a 1 de fevereiro, extinguindo o processo. Eleito para novo mandato pelo PMDB do Ceará, assumirá novamente uma cadeira assim que a nova legislatura for empossada, a 2 de fevereiro, e o processo todo terá de começar de novo.
Confesso minha decepção com alguns aspectos desse caso da venda de hábeas-corpus para o traficante Leonardo Dias Mendonça. Credulamente acreditava que o juiz Tourinho Neto era um homem piedoso, como o ministro Marco Aurélio de Mello. Nenhum dos dois pode ver um rico na cadeia que mandam logo soltar. As gravações das conversas do traficante envolvem também o juiz Tourinho. Pelo jeito, sua piedade era generosamente remunerada.
E o desembargador Antônio Ivan Athiê, do Tribunal Regional da 2 Região, no Rio de Janeiro? Já foi investigado pelo STJ por suspeita de vender sentenças, em parceria com os desembargadores Ricardo Regueira e Francisco Pizzolante. Não lhe aconteceu nada. Entre outras coisinhas, Athiê mandou liberar US$ 1,429 milhão apreendido em dinheiro vivo no Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro. O Ministério Público desconfia que o dinheiro, que estava em poder da doleira de Belém do Pará Ourovida Benzecry, provém de lavagem de dinheiro da Sudam e do traficante Leonardo Mendonça. Em tempo: Jader Barbalho, eleito deputado federal pelo Pará, também assume o mandato dia 2 de fevereiro. Pinheiro Landim não ficará só.
Finalmente, por hoje: o juiz Cassem Mazloum, da 1 Vara Federal de São Paulo, inocentou o ex-senador Luiz Estevão e seus cúmplices do desvio de R$ 169 milhões da construção do Fórum Trabalhista de São Paulo. O meritíssimo considerou as provas contra Luiz Estevão e seus cúmplices como tendo sido obtidas de maneira ilegal. Essas provas, que se referem a movimentações financeiras nos Estados Unidos das contas de Leo Green, pseudônimo usado pelo ex-parlamentar, e de James Towers, codinome de sua mulher, foram levantadas pelo Ministério da Justiça americano e encaminhadas oficialmente ao Ministério da Justiça do Brasil, no âmbito do Multi Legal Assistence Treaty, tratado internacional para o combate às transferências de dinheiro proveniente do narcotráfico e da corrupção assinado pelo Brasil e aprovado pelo Congresso Nacional. Nesse caso, ou há corrupção ou ignorância. Prova mais oficial não há do que informações prestadas pelo Ministério da Justiça de um país a outro, em obediência a um tratado internacional.
O Ministério Público Federal recorreu da sentença, mas a apelação não foi ainda julgada. Investigar e apelar é um ofício arriscado. O procurador Mário Lúcio Avelar, que investigava os roubos na Sudam, inclusive os casos de Jader Barbalho e sua mulher, e diversos casos no Maranhão, inclusive o das 26.700 notas de R$ 50 encontradas no escritório da senadora Roseana Sarney e de seu marido, Murad, o Magnífico, foi destituído sem explicações da chefia do Ministério Público de Tocantins pelo procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro.
Não creio em bruxas, mas que existem, existem, dizem os hispânicos.
por Márcio Moreira Alves
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